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Cartão postal mostra soldados americanos em trincheira na França, em 1918. | /BigStock
Cartão postal mostra soldados americanos em trincheira na França, em 1918.| Foto: /BigStock

Nesta quinta-feira (06) completaram-se cem anos desde que os Estados Unidos decidiram participar da Primeira Guerra Mundial. É óbvio que muita coisa mudou desde então. E muitas dessas mudanças ocorreram justo porque os EUA entraram na briga.

Temos sete itens aqui nesta lista de exemplos dessas mudanças – sem contar o simples fato de que a entrada dos EUA no lado dos Aliados serviu para salvar o exército francês, que se via diante de um motim, e desarmar a ofensiva desesperada dos alemães de 1918.

1. Woodrow Wilson e o internacionalismo liberal dos EUA

Após vencer a reeleição com a promessa de que o país ficaria de fora da guerra, Wilson entrou com sua infantaria (conhecida como os “doughboys”), efetivamente inaugurando um novo capítulo na política internacional norte-americana que, com algumas variações, perdura até hoje. É claro que a Liga das Nações foi ignorada pelo Senado e acabou sendo uma organização impotente e incapaz de impedir a Segunda Guerra Mundial. No entanto, ficaram bem arraigadas a ideia da segurança coletiva e a noção de que os assuntos da Europa eram capazes de representar uma ameaça para os EUA também – o que levou diretamente à criação das Nações Unidas com o final da Segunda Guerra.

2. A Alemanha da década de 1930

A insistência de Wilson em pôr fim ao militarismo prusso teve como consequência o fato de que acabou sendo o governo socialista alemão – e não a ditadura militar – que ficou associado ao armistício, o que não ajudou exatamente a reputação dos moderados de Weimar e ainda colaborou para alimentar o sentimento de traição que fervilhou por anos na Alemanha. Isso, aliado ao fato de que a França e o Reino Unido insistiam para que a Alemanha pagasse caro pela guerra, ajudou a garantir que a Grande Guerra no fim não fosse, de fato, a guerra para acabar com todas as guerras.

3. Todos aqueles “pequenos países”

Se tinha uma coisa que Wilson adorava era a autodeterminação nacional, tanto que fez dela um dos seus Quatorze Pontos, nos seus planos para a paz. Por isso, a entrada dos EUA na Primeira Guerra pode também ser vista como o último prego no caixão dos impérios continentais da Europa. Império Austro-húngaro? Adeus! Auf wiedersehen! Isso transformou o mapa da Europa e criou uma colcha de retalhos de países menores, criados com base em nacionalidade étnica, a partir das ruínas de Habsburgo, como a Áustria, a Hungria, a Checoslováquia (a autodeterminação também preparou a cena para a animosidade entre os EUA e os impérios coloniais da Europa, o que teve consequências como o fiasco da Inglaterra com o Canal de Suez décadas mais tarde).

4. A importância do petróleo

Lorde Curzon, dias após o Armistício, notou que “os Aliados velejaram para a vitória numa enxurrada de petróleo”. O petróleo era, em sua maior parte, de origem norte-americana – assim como os caminhões que deram aos exércitos Aliados uma vantagem sobre os seus rivais dos Impérios Centrais que dependiam de ferrovias e infantaria pedestre (essa mesma vantagem motorizada viria a compensar na Segunda Guerra Mundial e ajudar a alimentar a marcha do Exército Vermelho rumo ao leste). A preocupação norte-americana em garantir um fornecimento constante de petróleo para si e para seus aliados foi um dos temas principais da guerra – e um tema que continua até hoje, com a patrulha da Quinta Frota no Golfo Pérsico.

5. Os EUA começaram a sua caça aos espiões

Dois meses após a entrada dos EUA na guerra, o Congresso aprovou a Lei de Espionagem, criminalizando formalmente a espionagem, a divulgação de informações de segurança nacional e a sabotagem dos esforços bélicos dos EUA em nome de uma potência estrangeira. No ano seguinte, o Congresso fechou ainda mais o cerco contra a espionagem com a Lei de Sedição, que determinou castigos severos para uma ampla gama de atividades subversivas, desde atos de espionagem à interferência em assuntos bélicos, e até mesmo insultos ao governo ou exército dos EUA eram passíveis de punições. O Congresso anulou a Lei de Sedição em 1921, mas o governo federal manteve a Lei de Espionagem, que foi manejada como um martelo para perseguir os socialistas, os ativistas antiguerra e, mais tarde, os “suspeitos de comunismo” durante a época do medo do “Perigo Vermelho”, na Guerra Fria. Essa lei continua em voga até hoje (e chegou até mesmo a dar as caras de novo neste ano mesmo, quando alguns especialistas na Constituição deram o aviso de que o presidente Donald Trump poderia, em tese, submeter jornalistas e funcionários do governo que vazassem informações a processos criminais sob essa lei).

6. A Primeira Guerra antecipou os embates entre os EUA e os soviéticos durante a Guerra Fria

Enquanto os EUA ainda estavam encerrando a Primeira Guerra, Wilson decidiu que as tropas dos EUA precisavam intervir em outra parte da Europa também: na Rússia. Enquanto a guerra estourava no front ocidental, Wilson enviou dois contingentes, com um total de 13.000 soldados, para o norte da Rússia a fim de fortalecer os imperialistas do “Exército Branco” em combate contra os revolucionários soviéticos. Foi a primeira e única vez que tropas norte-americanas pisaram em solo russo. Durante os 19 meses passados sob o clima árduo do norte da Rússia, cerca de 420 soldados norte-americanos morreram. É um capítulo muitas vezes esquecido da história dos EUA, mas que as forças comunistas que saíram vitoriosas não esqueceram. E isso não ajudou as relações entre os EUA e a Rússia Soviética a começarem com o pé direito, o que antecipou o impasse entre as duas potências que definiu a ordem mundial pós-Segunda Guerra.

7. O começo da supremacia naval global dos EUA

Washington ainda observava tudo à distância enquanto os “castelos de aço” da Inglaterra e da Alemanha se digladiavam em grandes batalhas navais, como a de Jutlândia. Mas Wilson sabia que o poder naval era crucial para a segurança dos EUA. A lei naval de 1916 e a entrada dos EUA no combate aos navios do tipo Unterseeboot alemães forneceram as bases para estabelecer a supremacia naval imbatível dos EUA que o mundo ainda vê até hoje (quando Wilson foi avisado, em 1916, que a construção de uma marinha poderosa poderia irritar uma potência marítima como a Inglaterra, ele teria respondido, “Vamos construir uma marinha maior que a dela e fazer como quisermos!” E foi isso que eles fizeram).

*Tamkin e Gramer escrevem para a seção de política externa.

Tradução de Adriano Scandolara

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