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Vista aérea tomada em 25 de março de 2018 com um drone mostra o incêndio do centro comercial em Kemerovo. Um total de 64 pessoas, muitas delas crianças, morreram no incêndio que assolou um movimentado shopping center em uma cidade industrial da Sibéria | STRAFP
Vista aérea tomada em 25 de março de 2018 com um drone mostra o incêndio do centro comercial em Kemerovo. Um total de 64 pessoas, muitas delas crianças, morreram no incêndio que assolou um movimentado shopping center em uma cidade industrial da Sibéria| Foto: STRAFP

Pelo menos 64 pessoas, muitas delas crianças, faleceram na cidade siberiana de Kemerovo quando um incêndio crescente se espalhou por um shopping onde as saídas de incêndio estavam bloqueadas, de acordo com depoimentos de oficiais na última segunda-feira (26). 

Uma turma escolar de crianças aparentemente morreu no incêndio, algumas com a chance de fazer chamadas telefônicas inúteis e desesperadas para os pais ou parentes antes de sucumbir à fumaça e às chamas. 

As redes sociais russas ficaram tomadas por luto e indignação pela resposta lenta. As chamas desastrosas se juntam a uma longa lista de acidentes, incêndios e desmoronamentos na Rússia marcados por aparente negligência prévia e resposta inapta ou insuficiente dos serviços de emergência. 

“Nós estamos queimando, talvez isso seja um adeus”, postou em uma rede social uma menina de 13 anos chamada Maria, de acordo com a emissora russa Rossiya-24. Essa foi uma das cerca de 30 despedidas postadas por crianças que não entrarão novamente nas redes sociais. 

“Não há listas precisas, mas os pais estão mantendo a esperança de que os nomes dos seus filhos sejam mudados da lista de mortos para a lista de desaparecidos”, disse o repórter da emissora. 

Trampolim

O incêndio começou na tarde de domingo (25), o primeiro dia de um recesso escolar de uma semana. Uma turma de uma escola na pequena cidade de Treschevsky havia ido para Kemerovo para assistir a um filme no shopping Winter Cherry, tomar sorvete e pular em um trampolim. Nesta segunda-feira (26), os pais dos estudantes visitaram hospitais com a esperança de encontrar os filhos. O diretor da escola, Pavel Orynsky, chorou quando descreveu os estudantes na frente das câmeras. 

Uma mulher chamada Yevgenia disse ao jornal Komsomolskaya Pravda que sua sobrinha, Vika, ligou para ela às 4:11, logo após o incêndio começar, de dentro do cinema onde muitas das crianças de Treschevsky ficaram presas. 

“Ela me disse que tudo estava em chamas, todas as portas estavam bloqueadas”, disse Yevgenia, lutando contra as lágrimas. Vika disse a Yevgenia pelo telefone que não conseguia respirar. “Eu falei para ela: Vika, tire todas as suas roupas, coloque-as sobre o seu nariz e respire através delas.” 

“Por favor, diga à mãe que eu a amo”, respondeu Vika. “Por favor, diga a todos eu os amo.” 

Essa foi a última vez que Yevgenia teve notícias da sobrinha. 

Demora e regulamentos

Nos espaços da imprensa russa, ganhou plataforma a revolta contra os serviços de emergência pelo modo como lidaram com o desastre. Uma entrevista com Alexander Lillevyali publicada pela Meduza, um veículo independente, contou as tentativas de um pai em salvar as filhas do cinema em chamas enquanto o resgate se reunia e tinha dificuldade para chegar a um plano de ação. 

“Eles demoraram três minutos – três minutos! – para colocar as máscaras”, disse Lillevyali, também com lágrimas nos olhos. Os bombeiros primeiramente o seguiram até a escada que leva ao teatro, mas foram redirecionados por um homem que os contou sobre outro incêndio. Ele então implorou que eles lhe dessem uma máscara para que ele pudesse retornar ao teatro e salvar as garotas sozinho. 

“Eles me disseram: não pode. Tudo tem que estar de acordo com as regulamentações”, contou Lillevyali. “Minhas filhas foram deixadas para queimar por causa de malditas regulamentações.” 

Cerca de 40 pessoas foram tratadas no local, e pelo menos 10 outras foram hospitalizadas, de acordo com o Ministério da Saúde da Rússia. Oficiais dos serviços de emergência disseram que a contagem final de mortos é 64, mas a mídia local relatou que dezenas de pessoas podem estar desaparecidas. Alguns corpos precisarão de exame de DNA para serem identificados, segundo oficiais. 

Mulher chora enquanto as pessoas colocam flores em homenagem às vítimas do incêndio no shopping center em Kemerovo em 26 de março de 2018. Pelo menos 53 corpos foram recuperados de um incêndio que varreu um movimentado centro comercial na cidade industrial da SibériaSTRAFP

Investigação

Horas após abrir uma investigação sobre a causa do incêndio, a porta-voz do Comitê Investigativo, Svetlana Petrenko, disse que as autoridades estão investigando uma série de “violações sérias” dos códigos de segurança contra incêndios. Petrenko disse que as saídas de incêndio estavam bloqueadas, e um segurança privado desligou o alarme de incêndio após receber notificação do incêndio. 

Kemerovo está a cerca de três mil quilômetros de Moscou. Nas redes sociais, amigos e familiares compartilharam fotos de crianças que estariam no shopping quando o incêndio começou. Outros vídeos mostram homens tentando arrombar uma porta trancada em uma escada para escapar das chamas invasoras. 

Uma das vitimas hospitalizadas foi um menino de 11 anos que pulou de uma janela no quarto andar para escapar das chamas. As autoridades descreveram na segunda-feira que ele estava em estado grave e emocionalmente traumatizado. 

“Ele perdeu os pais e a irmã mais nova nessa tragédia”, disse a Ministra da Saúde, Verokina Skvortsova, que acrescentou que ele teve várias fraturas e está respirando com auxílio de aparelhos. 

O jornal Kommersant relatou que 288 bombeiros chegaram com 62 caminhões para combater o incêndio, que demorou 19 horas para se extinguir e cobriu uma área de 1,5 quilômetros quadrados. O teto acima da área queimada caiu e pelo menos 59 pessoas – 41 crianças – foram registradas como desaparecias pelo jornal RBC. 

Cerca de 12 crianças desaparecidas estavam em um dos três cinemas do shopping, que o resgate ainda não conseguiu acessar devido às altas temperaturas e à instabilidade do prédio, de acordo com Vladimir Chernov, vice-governador de Kemerovo. O cinema está localizado próximo a uma área de recreação infantil, onde acredita-se que o incêndio teria começado. 

Bombeiros russos caminham perto de um centro comercial de vários andares em Kemerovo, em 26 de março de 2018. STRAFP

Causas

A causa do incêndio ainda não foi determinada pelas autoridades, mas o incêndio ressaltou um registro terrível de segurança contra incêndios na Rússia nos últimos anos. 

Quatro pessoas foram detidas para interrogatório, incluindo um inquilino da área do shopping em que se acredita que o incêndio tenha começado, além do chefe da empresa de gestão do shopping. 

Chernov disse que a situação de segurança contra incêndios no shopping Winter Cherry lembra a de outros shoppings da região, onde as autoridades agora conduzirão avaliações de segurança. 

O líder do Ministério de Situações Emergenciais da Rússia, Vladimir Puchkov, disse que os socorristas tiveram dificuldades para conter e extinguir o incêndio quando partes da edificação começaram a desestabilizar. Ele descreveu nuvens espessas de fumaça e visibilidade limitada enquanto a temperatura no shopping chegou a 700° C, de acordo com o jornal RBC. 

Alarmes inoperantes

Chernov disse que a teoria por trás da causa do incêndio é que uma criança pode ter colocado fogo com um isqueiro em uma bola de espuma na área de recreação. Outra teoria divulgada pela imprensa russa sugere que uma fiança elétrica defeituosa pode ter começado o incêndio. Há relatos de que os alarmes de incêndio do edifício não foram acionados, deixando as pessoas no cinema inicialmente sem saber sobre a situação. 

O fogo permaneceu por horas até os bombeiros conseguirem chegar ao quarto andar do shopping. Além do cinema e da área infantil, aquele andar tinha um mini zoológico. Todos os animais morreram. 

O incêndio em Kemerovo foi o último de uma série de grandes desastres de incêndios na Rússia nos últimos anos. Em 2003, um incêndio no alojamento estudantil em uma universidade em Moscou deixou 44 mortos e 156 feridos. Em um incêndio em uma casa de repouso em Krasnodar em 2007, 63 pessoas morreram, e um incêndio em uma boate em Perm em 2009 matou 153 pessoas. Em 2015, um incêndio em um shopping em Kazan deixou 19 mortos e 61 feridos.

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