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Mohamed Alsawafiri sabe que seu programa, que desafia a política de Gaza, é arriscado. Mas explica: “Se tivermos medo, não poderemos fazer nada” | Nassar,Wissam/for The New York Times
Mohamed Alsawafiri sabe que seu programa, que desafia a política de Gaza, é arriscado. Mas explica: “Se tivermos medo, não poderemos fazer nada”| Foto: Nassar,Wissam/for The New York Times

Homens e mulheres seguram suas malas no porto, esperando por um barco. Desconfiado, Tarek, vendedor de chá de 13 anos, vaga por ali e pergunta: “Eles estão partindo mesmo?” Ele nunca havia visto ninguém deixar Gaza antes, explica.

Os passageiros são atores em uma nova série satírica e fingem esperar o barco chamado “Mish-mish”, ou “abricós” em árabe. É uma referência a um ditado palestino que diz “amanhã com os abricós”, o que, basicamente, significa nunca.

É também um soco no governo do Hamas em Gaza, que prometeu construir um novo porto para viagens marítimas, mas não cumpriu. E ainda ressalta as restrições aos palestinos em Gaza.

“Entendeu? O barco nunca vai chegar!”, explica Akram Al-Sourani, 33, o roteirista, com uma estrondosa risada. Tarek não entendeu.

Introduzir a sátira aos moradores de Gaza é um dos desafios que esperam pelo show, “The News Program” (“Programa de Notícias”, em tradução livre), inspirado em um comediante que usou o “The Daily Show with Jon Stewart” como modelo de seu próprio programa de televisão no Egito.

Mas um dos maiores desafios que o programa vai enfrentar é a reação do governo do Hamas. Embora os produtores prometam que vão espetar todos os oficiais igualmente, o show é feito em Gaza, onde os oficiais do Hamas fecharam o cerco contra a mídia.

“Pensamos centenas de vezes sobre o que vai acontecer se fizermos isso”, conta Mohamed Alsawafiri, de 31 anos, o apresentador que, na vida real, faz trabalhos humanitários e é pai de três meninas. “Se tivermos medo, não poderemos fazer nada.”

Os criadores do show pretendem produzir episódios semanais de 15 minutos, que serão apresentados no YouTube.

“Queremos aumentar a consciência dos palestinos por meio da sátira”, explica Sourani. “O riso deve vir com um suspiro de dor.”

Outro segmento dá um golpe na Organização para a Libertação da Palestina, que já foi revolucionária e hoje é constituída de homens mais velhos que representam pequenos partidos e são liderados por Mahmoud Abbas, que fez 80 anos este ano.

Enquanto Alsawafiri falava da OLP, uma fotografia genérica de homens idosos apareceu rapidamente. Ele fingiu estar em pânico por causa do erro — como poderia não reconhecer seus amados líderes? “Tira isso daí”, sussurrou. “Você quer acabar com a gente!”

Várias centenas de moradores de Gaza apareceram para a apresentação do primeiro programa em dez de junho na ACM da Cidade de Gaza. Eles torceram e deram risada. “Estamos cansados de guerras e políticos”, afirma a jovem Suha Ahmad.

Alsawafiri buscava uma maneira de canalizar seu crescente ressentimento com os líderes palestinos, em parte por causa do destino de seu irmão, cujas pernas foram cortadas em uma explosão durante uma invasão de Israel em 2006.

Mustafa al-Sawwaf, do Ministério da Cultura de Gaza, diz que o Hamas não vai fazer objeções ao show se ele não for ofensivo. “A sátira não deve exceder seus limites”, avisa.

“Algumas pessoas sentaram conosco e disseram, ‘Deixem mais leve’”, conta Alsawafiri. “Mas não funcionamos assim.”

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