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Dias atrás, fui chamado para ajudar a solucionar sérios problemas relacionados ao uso de drogas, em uma escola municipal da periferia de Curitiba. Sentamos eu, a diretora da escola, a chefe do núcleo de Educação da regional da prefeitura, professores, um psicólogo da minha equipe e outros profissionais envolvidos no debate. Dentre as principais questões levantadas pelos colegas, destacavam-se os relatos de ameaças de morte feitas por alunos aos professores, agressões, intoxicações, tráfico de drogas, evasão de alunos e problemas relacionados aos familiares.

O que nos diz o senso comum em uma situação como essa? Qual foi a primeira reivindicação entoada unanimemente pelos admiráveis educadores, que atuam em situações críticas em uma das mais dignificantes profissões? "Precisamos de mais policiamento".

Respondi, de imediato, que não. Precisamos, isso sim, aumentar a oferta de atividades culturais. Precisamos ampliar as alternativas esportivas e profissionalizantes. Precisamos oferecer acesso à internet, à leitura e ao lazer. Como iremos esperar que jovens não usem drogas em uma comunidade onde não existe absolutamente mais nada a fazer? Como iremos propor um diálogo em uma região onde não existe outro ponto de encontro a não ser o bar da esquina?

Passamos, então, a pensar em um plano conjunto que pudesse melhorar o quadro daquela microrrealidade social. Afirmei que, sozinha, a prefeitura não resolveria o problema e que seria preciso mobilizar toda a comunidade em torno da escola. Seria preciso convocar a associação de moradores, o Conselho de Segurança, o Conselho Tutelar, os proprietários de bares e comerciantes da região, a Polícia Militar, a Guarda Municipal e os organismos públicos envolvidos para, juntos, desenvolvermos um plano de ação para a escola municipal.

Antes dessa reunião, procurei conhecer um pouco mais profundamente a realidade que procurávamos modificar, e foi aí que eu me surpreendi. Nesta comunidade escolar, que envolve aproximadamente 2 mil alunos, apenas 10% apresentavam problemas relacionados ao uso de drogas. A grande maioria não se envolvia com o tráfico, tampouco com o uso de drogas. Encontrei ali jovens que haviam sido premiados em competições de Ciências e Matemática! Professores afirmaram que na sala de troféus não havia mais espaço para armazenar as premiações e, no entanto, nunca tiveram a oportunidade de realizar uma solenidade para condecorar os talentosos jovens que se destacavam, porque estavam, na maior parte do tempo, registrando as ocorrências na delegacia, preocupados com os 10% de alunos problemáticos.

Resolvi escrever sobre essa recente experiência concreta porque ela ilustra muito bem o que acontece hoje na sociedade como um todo.

Primeiramente, reproduzimos uma cultura de que os problemas associados ao uso de drogas serão resolvidos com policiamento, com repressão. Depois, alimentamos uma cultura do medo e do terror, que oprime e ofusca os cidadãos, disseminando notícias de tragédias, assassinatos, prisões e desgraças alheias. Qual o sentido de continuarmos publicando apreensões de toneladas de drogas e prisões de megatraficantes?

Estaremos no caminho do bem quando o jornal mais lido e o noticiário mais popular forem aqueles que veicularem notícias positivas, bons exemplos que certamente existem aos montes, e os conhecidos periódicos de horrores forem fadados ao anonimato por falta de audiência.

Diogo Busse, advogado e mestre em Direito das Relações Sociais pela UFPR, é diretor de política sobre drogas da Prefeitura de Curitiba e presidente do Conselho Municipal de Políticas Sobre Drogas (Comped).

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