Meditando sobre o caminho que a ciência havia tomado na primeira metade do século 20, o filósofo alemão Edmund Husserl emitiu um juízo que à época poderia soar um tanto catastrofista. Após passar pela guerra mais sangrenta de todas, a Primeira Guerra Mundial, ele pôde dizer: "Na miséria de nossa vida (...), esta ciência não tem nada a nos dizer. Ela exclui em princípio aqueles problemas, os mais candentes para o homem". Sua crítica levantava-se contra um tipo de ciência positivista, demasiado técnica, que prometia muito mais do que era capaz de cumprir. A paz desejada, o progresso sonhado, a justiça esperada talvez não fosse um corolário necessário do avanço científico.
O tempo passou, o mundo mudou significativamente, mas a intuição de Husserl não foi contraditada. Ainda que os enormes avanços científicos revelem ao homem um mundo escondido sob milímetros quadrados, ainda que a tecnologia nos ensine cada vez mais sobre cada vez menos, o problema que é o homem continua por se resolver. Perguntas sobre a felicidade humana, sobre sua realização como indivíduo, sobre sua natureza e finalidade, essas questões maximamente humanas ainda aguardam respostas satisfatórias. E a fome continua a esmurrar às portas do século 21: fome de comida, de fato, mas também fome de verdade, fome de justiça, fome de beleza, fome de amor!
Husserl nos alerta sobre o equívoco escondido na tentativa de dar remédio tecnocrático a mazelas humanísticas. Infelizmente temos de constatar que não aprendemos muito com nossos próprios erros. Um mundo melhor um Brasil melhor! não surgirá de uma fábrica de chipsets ou de uma lavoura de soja; muito menos da decisão transitada em julgado de um tribunal, ou do superávit primário. O projeto de um país mais justo, belo, verdadeiro e bom necessita contemplar uma renovação humanística de seus membros, precisa começar a partir de dentro.
Não há alternativa a isso! Ou se começa realmente a investir em um país de futuro, sem arremedos populistas, sem migalhas assistencialistas, ou o Brasil continuará agrilhoado a um destino liliputiano. Desde a Grécia Antiga já se sabe que a alma de uma nação melhor passa necessariamente por leis justas, decerto, mas um ordenamento jurídico honesto nasce do exercício pessoal de virtudes humanas verdadeiras. O inverso é hipocrisia e legalismo.
Robson de Oliveira, professor de Filosofia da PUC-RJ e da Anhanguera-Niterói, é diretor do Centro Dom Vital.
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