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A compreensão das eleições na Argentina depende necessariamente de uma análise do kirchnerismo e do modelo de Estado implementado nos 12 anos pelos K, como são conhecidos Néstor e Cristina Kirchner.

O kirchnerismo resgatou a Argentina de uma profunda e catastrófica crise em 2003, reorientando o Estado na defesa corajosa da soberania econômica e enfrentando os fundos abutres para responder a uma necessária inclusão social. Adotou medidas redistributivas que resultaram na redução da pobreza e do desemprego, coordenando uma política de direitos humanos referencial em temas como casamento igualitário, identidade e violência de gênero, memória, verdade e justiça. Ademais, o kirchnerismo regulamentou de forma destemida o Quarto Poder, com uma Lei de Meios declarada constitucional pela Suprema Corte.

O fim da diplomacia do conflito

Mauricio Macri, segundo as pesquisas feitas até o momento, é considerado o favorito na eleição presidencial argentina. É a primeira vez que o país chega a um segundo turno para definir quem será seu presidente. As eleições ocorrem no dia 22 e a “Era K” parece estar com os dias contados no país.

Leia o artigo de Maristela Basso, professora da USP.

Scioli aparece como a única opção possível para aqueles que defendem um Estado minimamente social

O candidato governista Daniel Scioli, da Frente para la Victoria, é o único que tem se proposto a avançar na agenda kirchnerista, embora tenha levantado suspeita dos setores progressistas. Apoiado por Cristina, como parte da estratégia política para seu regresso à Casa Rosada na próxima campanha presidencial, é considerado um candidato de centro-esquerda, mas que se diferencia pouco do candidato neoliberal Mauricio Macri. Recentemente, Scioli elogiou o próprio Carlos Menem, com quem havia feito aliança para tornar-se deputado em 1997. O senador e ex-presidente declarou que, entre os candidatos, Scioli é o que melhor representa suas ideias. É igualmente apoiado por Domingo Cavallo, o ministro da Economia de Menem que levou o país a bancarrota.

Daniel Scioli fez uma administração questionável em oito anos de mandato na província de Buenos Aires, não reduzindo os bolsões de miséria na maior região da Argentina e recebendo acusações sobre violações de direitos humanos no sistema carcerário, o que o levou a sofrer uma derrota eleitoral inesperada no primeiro turno. No entanto, em seus discursos, tem se mostrado leal ao continuísmo do modelo kirchnerista. Há grande esperança e pouca certeza de que Scioli avance na justiça social, consolidando as conquistas que permitiram minimizar a desigualdade no país vizinho, reparando os erros do kircherismo. Há ainda desafios decorrentes da crise econômica mundial, do desgaste de Cristina e de uma oposição que saiu fortalecida do primeiro turno.

No segundo turno, Scioli aparece como a única opção possível para aqueles que defendem um Estado minimamente social, pois não há qualquer resquício de dúvida do estrondoso retrocesso que significará uma vitória do opositor Mauricio Macri para o conjunto da população.

O candidato de direita do partido Cambiemos é empresário bilionário, que governará para os interesses do capital, resgatando as políticas de ajuste neoliberal da década de 90 e que resultaram no empobrecimento da população argentina e na crise política, financeira e econômica que foi enfrentada por Néstor Kirchner.

Neste cenário, resta aos argentinos progressistas votar em Scioli sí o sí para que não ganhe Macri, esperando que não se repita o ocorrido no Brasil, em que a vitória por una cabeza deflagrou a insistente postura antidemocrática da oposição, bem como uma série infindável de equívocos e de promessas de campanha não cumpridas pelo governo.

Gisele Ricobom é professora do curso de Relações Internacionais e Integração e do mestrado em Integração Contemporânea da América Latina da Unila.
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