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A eleição de Tancredo Neves, em janeiro de 1985, marcando o início do que se chamou de “Nova República”, completou 30 anos. E esses 30 anos constituem o mais longo período de democracia no nosso castigado país. Não fossem esses 30 anos e ainda seríamos o país no qual a fome era parte constante e humilhante da paisagem; o país no qual generais sem votos desfilavam seus poderes arrancados à força, fazendo poses de “autoridades” amparadas em atos arbitrários; o país no qual o Judiciário, silenciado, passava recibo de “tudo bem” às maiores maracutaias feitas por baixo dos panos e nas barbas dos incautos apalermados pelo medo e pela ignorância: o país no qual a imprensa era cerceada, emasculada, enxovalhada sem dó nem piedade, proibindo-se que se informasse até mesmo surtos de meningite ou secas prolongadas, para evitar manchar a imagem impoluta dos governos dos generais.

O passado que contraria e busca abafar o propósito democrático claramente estabelecido em nossa Constituição deve ser combatido por todos

Não à polícia do pensamento

Crianças de 7 anos de idade recebendo lições sobre masturbação. Nas aulas de História, adolescentes aprendendo sobre as virtudes dos mais sanguinários e torpes regimes políticos do mundo. Exemplos hipotéticos? Infelizmente, não. Esse é o retrato do cotidiano de milhões de alunos em escolas, públicas e privadas, de todo o Brasil.

Leia o artigo de Frederico Junkert, representante do movimento Escola sem Partido no Paraná.

Tudo isso não é uma opinião. Não é doutrinação. Não é ideologia. São fatos. Fatos de um país recente e amargurado com a lembrança do autoritarismo cuja herança ainda inunda todas as retinas, na desigualdade social ainda infamante, na violência policial abjeta, na falta de cultura cívica de uma população que foi amordaçada por décadas e que esqueceu ou não aprendeu a cuidar democraticamente do espaço público. E tudo isso precisa ser pensado, refletido, narrado, discutido, transformado. Nossa democracia é um projeto em primeira fase de execução, com muito para se fazer – e já com tantas correções de rumo necessárias e urgentes – e um objetivo claro e evidente: mais democracia!

Por isso a política, essa ciência de fundamental importância, essa prática de imprescindível exercício, deve se espalhar por todos os rincões públicos da República e, em particular, pelas escolas. Professores de todas as disciplinas têm o dever de apresentar, discutir, refletir diariamente as questões urgentes da nossa democracia em construção com os que aqui chegam, futuros operadores do Estado brasileiro, estudantes, brasileiros, cidadãos da pátria em transformação. E essa discussão deve ter como propósito a execução do que determina a nossa Constituição cidadã, isto é, o que prevê o artigo 3.º e que diz:

“Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:

I – construir uma sociedade livre, justa e solidária;

II – garantir o desenvolvimento nacional;

III – erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais;

IV – promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.”

Em cada sala de aula, essas palavras devem ser evocadas, repetidas, transformadas em práticas e discussões sobre novas práticas. E o passado – e tudo o que permanece dele no presente – que contraria e busca abafar esse propósito democrático claramente estabelecido em nossa Constituição deve ser combatido por todos, sem distinção de idade, etnia ou credo religioso.

E isso não é uma opinião. Isso não é doutrinação. Isso não é ideologia. Isso é o que manda a Constituição da República Federativa do Brasil. Isso é o que determina o Estado Democrático de Direito. Esse é o dever de todos. Esse é o esforço fundamental para construir o futuro que podemos e merecemos alcançar: o de um país socialmente justo, livre, pacífico e plural.

O resto é embuste pernicioso.

Daniel Medeiros, doutor em Educação Histórica pela UFPR, é professor de História no Curso Positivo.
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