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Quem optou por tornar-se um homem ou mulher que crê, e escolheu crer ao modo de cristão, sempre ouviu sobre a infinita misericórdia de Deus, sobre sua amorosa disposição de perdoar sempre. E seu Filho, Jesus Cristo, ensinou exatamente isso (cf. Mt 18,22). Surgem, então, certas perplexidades ante a uma frase ouvida no Evangelho deste domingo: “Na verdade Eu vos digo: tudo será perdoado aos filhos dos homens, os pecados e todas as blasfêmias que tiverem proferido. Aquele que blasfemar contra o Espírito Santo, jamais será perdoado...” (Mc 3,29).

O perdão não será concedido a quem se recusar a recebê-lo

A pergunta imediata é pelo sentido de uma expressão tão severa. Do que fala Jesus ao referir-se a “pecado contra o Espírito Santo”? Tomada a afirmação no seu quadro imediato, isto é, sem o contexto, parece haver algum limite à misericórdia de Deus. Felizmente não é assim. É preciso observar o antes e o depois destas frases. Jesus praticara uma série de atos prodigiosos de caráter libertador. As reações foram muitas e maravilhosas. Mas os adversários diziam que seus feitos eram movidos por potências diabólicas (Mc 3,22). Em outras palavras, o bem que Jesus fazia a todos era atribuído a forças demoníacas. Ao bem davam o nome de mal. A tal atitude se aplica a severa fraseologia de Jesus, isto é, aquele que blasfemar contra o Espírito Santo, jamais será perdoado... Ao final, o evangelista ainda explica: “É porque eles diziam: “Ele está possuído por um espírito impuro” (Mc 3,30).

Em primeiro lugar, Jesus anuncia a universalidade do perdão. Não há distinção de sujeitos, de classe ou de número de ofensas. Pode-se observar isso pelo futuro: “Tudo será perdoado...”, unido à certeza: “Na verdade Eu vos digo”. Ou seja, todos podemos confiar que sempre poderemos encontrar a Deus em atitudes reconciliadoras. Ninguém estará perdido diante d’Ele.

Mas há um tipo de ofensa para a qual não há possibilidade de perdão: a blasfêmia contra o Espírito Santo. Jesus agia movido pelo Espírito de Deus, ou seja, Ele atuava por amor. Era bom porque amava. Mas seus adversários o qualificaram de “espírito impuro”, que suscitava o ódio. Os inimigos do Senhor não se portavam apenas com atos ocasionais, ligados a circunstâncias passageiras. Tratava-se, muito mais, de uma disposição interior em rejeitar a pessoa mesma de Jesus. Enquanto rejeitavam a bondade do Senhor, repulsavam também o modo preferido de Deus mostrar sua benevolência, isto é, perdoando.

Enquanto se negavam a reconhecer a evidência, eles mesmos se excluíam do perdão oferecido com gratuidade amorosa de Deus. Era uma opção obstinada contra as escolhas de Deus. Os interesses dos inimigos de Jesus eram inconfessáveis, que tentavam de algum modo tornar ineficaz a misericórdia divina. Enquanto houver má-fé não haverá aceitação da paz reconciliadora.

O que é, pois, o imperdoável diante de Deus? Vale recordar que Jesus, estando já crucificado, instantes antes de sua morte, ainda orou pelos seus assassinos: “Pai perdoa-lhes...” (Lc 23,34). Permanece imperdoável diante de Deus aquela atitude de recusar sua bondade. Em outras palavras, o perdão não será concedido a quem se recusar a recebê-lo. O Ano da Misericórdia, proclamado pelo papa Francisco, é um tempo propício para deixar-nos alcançar pelo perdão do alto. Quem já se sentiu perdoado por Deus compreende o que o evangelista pretendia dizer.

Dom José Antonio Peruzzo é arcebispo de Curitiba.
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