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No período pré-eleitoral, como o que estamos, é comum ouvirmos nas propagandas políticas na televisão, rádio e até mesmo nas ruas alguns jingles políticos de candidatos – uma publicidade musicada simples e com muitas repetições. Os mais comuns são aqueles que se utilizam da harmonia e melodia de uma música famosa ou “da moda” para criarem o “efeito chiclete” na população.

Já estamos acostumados com jingles, distribuição de panfletos e adesivos nos sinaleiros, comícios... mas será que esses jingles implicam em alguma violação de direitos autorais?

Vejamos o que a Lei de Direitos Autorais (Lei 9.610/98) expressa em seu artigo 7: “São obras intelectuais protegidas as criações do espírito, expressas por qualquer meio ou fixadas em qualquer suporte, tangível ou intangível, conhecido ou que se invente no futuro, tais como: as composições musicais, tenham ou não letra”.

A partir da análise legal, resta indubitável que as obras musicais são protegidas pela lei, devendo o seu titular – sem envolvimento do Escritório Central de Arrecadação e Distribuição de Direitos Autorais (Ecad) – autorizar toda e qualquer utilização, reprodução ou adaptação realizada por terceiros, incluindo-se aqui, também, os jingles políticos.

Uma alternativa seria o uso de uma obra caída em domínio público

Não é difícil observarmos muitos destes jingles postados em páginas da web acompanhados da palavra “paródia” em seu título, numa clara tentativa de afastar a violação dos direitos autorais. Isso ocorre porque a Lei de Direitos Autorais, em seu artigo 47, expressa que “são livres as paráfrases e paródias que não forem verdadeiras reproduções da obra originária nem lhe implicarem descrédito”, ou seja, não necessitam de prévia autorização do titular da obra musical original.

O dicionário Michaelis define “paródia” como “imitação satírica e jocosa de uma obra literária, musical, teatral etc.”. O Aurélio a define como uma “imitação cômica de uma composição literária; imitação burlesca”. Neste cenário, não nos parece que os jingles políticos que se utilizam de uma harmonia e melodia de uma composição conhecida, alterando apenas sua letra, estão inseridos nessa limitação dos direitos autorais definida pela lei, visto que estão – ou deveriam estar – inseridos em um contexto que denota respeitabilidade, integridade e legalidade.

Portanto, um político que possui essa intenção deve obrigatoriamente solicitar autorização para o titular da obra musical, a qual poderá ser a título gratuito ou oneroso. Importante frisar que os jingles executados publicamente, que se utilizam de harmonia e melodia de obra musical já existente, e mesmo aqueles com uma composição totalmente original, não estão sujeitos ao pagamento de direitos autorais para o Ecad, restando, assim, a autorização a critério do titular, muitas vezes concedida para fins de afinidade política, posto que o motivo de sua obra ser escolhida é justamente já ser deveras popularizada.

Uma alternativa para os políticos que intentam a utilização de uma música famosa para criar o jingle eleitoral seria a edição de uma obra caída em domínio público. A Lei de Direitos Autorais brasileira considera, em seu artigo 41, que a obra musical está em domínio público após 70 anos da morte de seu autor, contados a partir de 1.º de janeiro do ano subsequente ao falecimento. É um prazo bastante extenso, mas o bom senso fica a critério do candidato em optar por essa escolha ou solicitar autorização do titular de uma obra “da moda” para embelezar sua campanha.

É importante salientar que a obra musical é propriedade intelectual de seu autor, que investiu seu tempo, labor, criatividade e estudo para compô-la e auferir ganhos pela sua execução, reprodução e adaptação, sendo que seu uso indevido fere os direitos autorais, implicando em sanções penais e civis. Enquanto isso, ficamos na torcida para que os candidatos que almejam nos representar pelos próximos quatro anos respeitem a lei já em sua campanha eleitoral, com uma nova e pegajosa letra circulando livremente por nossos ouvidos.

Natália Fragoso é musicista, advogada especialista em Propriedade Intelectual e pesquisadora pelo Grupo de Estudos em Direito Autoral e Industrial da Universidade Federal do Paraná (Gedai/UFPR).
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