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Quem tem alguma familiaridade com o calendário litúrgico cristão, mesmo sem ser um assíduo frequentador da Igreja, sabe que ainda por algumas semanas vivemos o chamado Tempo Pascal. Assim como há o período da Quaresma (antes da Páscoa), após a mesma os cristãos celebram, ao longo de sete semanas, o tempo da Páscoa. A ressurreição do Senhor Jesus e sua presença viva entre os seus são o grande centro unificador em todas as celebrações. E sua ressurreição não foi apenas a revitalização de um corpo cadavérico. Ressuscitaram a sua vida, a sua história, as suas palavras, o seu perdão misericordioso, a sua compaixão pelos sofredores. É tudo isso que quer dizer a a expressão “Ressurreição de Jesus”.

Mas, e após a ressurreição do Senhor, qual é o caminho para os que nele creem? A mera admiração por seu passado ainda não responde ao futuro dos que hoje o seguem. E o futuro chegará inexorável, com todas as suas latências e as nossas impotências. Inclusive aquela, a absoluta e inevitável. Esta percepção realista suscita algumas reflexões que nos levam à fronteira entre professar a fé na nossa ressurreição, seguindo o Senhor, ou não fazê-lo. Quem escolhe a primeira possibilidade pode conferir um sentido totalizante para o seu presente e futuro: a eternidade. Quem opta por não crer vive esta vida segundo os gozos das diferentes fases até que o fim seja a última, a solene e, ao mesmo tempo, trágica palavra. A releitura da vida exigirá de cada um a sua escolha final.

O futuro chegará inexorável, com todas as suas latências e as nossas impotências

Para o leitor que professa a fé em Jesus Cristo, o evangelho deste domingo (Lc 24, 35-48) oferece algumas interessantes inspirações. Como em domingos anteriores, também desta vez o Ressuscitado se põe em meio aos seus discípulos. O diálogo é festivo, matizado pela alegria do reencontro. Os sentimentos são de vitória, após uma dolorosa e frustrante derrota. Afinal, sem a ressurreição tudo teria terminado em um grande e vergonhoso fracasso. Logo após a euforia inicial soam as palavras do mestre: “Assim está escrito: o Cristo sofrerá e ressuscitará dos mortos ao terceiro dia, e no seu nome será anunciada a conversão, para o perdão dos pecados, a todas as nações, começando por Jerusalém. Vós sois as testemunhas destas coisas” (Lc 24, 47).

O texto fala de sofrimento, ressurreição, anúncio de conversão para o perdão. Alguns versículos antes, o evangelista noticia que o Senhor lhes abriu a inteligência para compreender as Escrituras. Em outras palavras, o sofrimento e a morte somente podem ser compreendidos à luz da ressurreição. O sofrimento e a ressurreição de Jesus conferem sentido de esperança às situações de sofrimento dos discípulos. Eles terão o mesmo destino do seu Senhor.

Agora podemos voltar à pergunta-título destas linhas. Cada um de nós vai passar a eternidade segundo a fé que professou enquanto viveu nesta existência histórica. É assim que cremos nós, cristãos. Por “professar” não se quer aqui falar de uma disposição intelectual ou filosófica. Mais do que tudo, significa deixar-se modelar e assumir com liberdade as opções e os comportamentos de Jesus Cristo. Se Ele perdoou, o discípulo perdoa. Se agiu com bondade, o discípulo, inspirado por seu Senhor, agirá com bondade. Se ele se compadeceu pelos empobrecidos e se aproximou deles, o discípulo se compadece e se aproxima deles. A partir desta premissa, cada um que crê pode responder sobre a “sua eternidade”.

Dom José Antonio Peruzzo é arcebispo de Curitiba.
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