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O tombamento da Serra do Mar do Paraná, ocorrido no ano de 1986, encerra uma das maiores demonstrações de reconhecimento do bem comum que os paranaenses já realizaram. Foi um ato histórico em respeito à importância maior de um patrimônio de todos, motivo de orgulho e de grandeza.

Pesquisadores, montanhistas, artistas, amantes da natureza: são muitos os atores que compõem o amplo grupo de personalidades que permitiu uma tomada de decisão que contou com o indispensável amparo do governo do estado do Paraná. A conquista do tombamento deve-se igualmente à vontade popular de permitir que as áreas naturais, as paisagens, a flora e a fauna dessa região pudessem ser protegidas e preservadas indefinidamente.

Embora o Paraná tenha uma encarnada cultura madeireira que direciona de maneira negativa muitas decisões sobre a agenda da conservação do patrimônio natural, a nossa Serra do Mar distinguiu-se pela menor pressão recebida sobre suas florestas. O que também se explica pelas dificuldades de acesso em seus trechos mais remotos.

As manobras do governo do estado para impedir o tombamento da Escarpa do Devoniano são atitudes pequenas

Distintamente das matas da Serra do Mar, a Floresta com Araucária e os Campos Naturais, que abrigam a espécie símbolo do Paraná, não tiveram a mesma deferência por parte da sociedade paranaense. Dizimada impiedosamente até os dias de hoje, ainda sofre pressões indevidas para a exploração do pouco que ainda resta.

Um incomum e verdadeiro sentimento de pertencimento pesou nas decisões que permitiram manter protegidas as montanhas da costa do Paraná. Não restaram mais áreas de grande porte em nosso território, à exceção do Parque Nacional do Iguaçu, no extremo oeste, e importantes trechos de áreas ainda conservadas na Escarpa do Devoniano, dividindo o primeiro e o segundo planaltos do estado.

O altruísmo e a grandeza da década de 80, que permitiu atitudes de conservação da natureza em prol do povo do Paraná e suas futuras gerações, não reverberam da mesma maneira nos dias de hoje. Estamos diante de uma perda significativa de poder das estruturas públicas dedicadas à proteção de áreas naturais em função de políticas que não respeitam valores nem limites.

A merecida homenagem aos que participaram do tombamento da Serra do Mar, nos 30 anos comemorados em 2016, permite uma comparação que demonstra que os gestores públicos que referendaram esse posicionamento deixaram um exemplo que não foi adotado pelos seus sucessores.

As atuais manobras que vêm sendo realizadas pelo governo do estado para impedir o necessário e estratégico tombamento da Escarpa do Devoniano são atitudes pequenas e à revelia das recomendações técnicas de instituições públicas atreladas ao tema. É de se lamentar que nem a visão estratégica nem a disposição de colaboração do então governador do Paraná, que permitiu o tombamento da Serra do Mar, estejam presentes na atual gestão, que coincidentemente é liderada pelo seu filho.

Clóvis Borges, mestre em Zoologia, é diretor-executivo da Sociedade de Pesquisa em Vida Selvagem e Educação Ambiental (SPVS) e membro da Rede de Especialistas em Conservação da Natureza.
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