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| Foto: Robson Vilalba/Thapcom

Recentemente, a ONG Oxfam publicou um relatório intitulado “A distância que nos une: um retrato das desigualdades brasileiras”, e gerou uma grande repercussão, tanto exaltando suas conclusões quanto criticando suas omissões metodológicas.

Poderia me juntar ao exército de analistas que dominam os conceitos de matemática básica e estatística para tecer críticas aos colossais equívocos metodológicos e desonestidade técnica presentes no relatório, como, por exemplo, o uso de estimativas parciais e comparação entre bancos de dados incompletos. Também poderia me juntar a outros diversos pesquisadores que apontam equívocos, para não repetir a palavra “desonesta” no texto, na utilização de conceitos econômicos, como os termos “riqueza líquida” e “endividamento”. Da mesma maneira, poderia fazer coro aos tantos outros que indicam que foram ignoradas importantes informações como o Índice de Gini e relatórios da Organização Mundial da Saúde que apontam melhoras significativas na qualidade de vida ao redor do mundo. Porém, quero me ater a uma discussão sobre o que acredito ser o ponto central não só do relatório, mas da própria missão desta ONG.

No relatório existe uma forte convicção da necessidade de promover igualdade no Brasil e no mundo, partindo da perspectiva de que “não é possível erradicar a pobreza no mundo sem reduzir drasticamente os níveis de desigualdade”, conforme aponta o próprio relatório na sua página 11. Este é o ponto principal da discussão.

Ninguém quer ser igual ao vizinho ou ao colega de trabalho; as pessoas querem ter o que atenda a subjetividade de suas necessidades

Quando falamos em desigualdade, vêm à mente os ideais da Revolução Francesa de “liberdade, igualdade e fraternidade”, inspirados na análise de Jean-Jacques Rousseau em A origem da desigualdade entre os homens. Ao longo da história, diversos líderes embriagados por esta necessidade suprema de reduzir a desigualdade, para assim abolir a pobreza, obtiveram como resultado de seus experimentos sociais mais pobreza, fome e morte. Não estou sinalizando minha opinião sobre regimes socialistas, mas evidenciando fatos: mais de 100 milhões de vítimas de regimes socialistas são contabilizadas pelo The Victims of Communism Memorial Foundation. Ou seja: foi criada uma relação equivocada de causa e consequência entre desigualdade e pobreza.

Quando se fala em igualdade, ela é confundida com o conceito de justiça. Todos queremos um mundo mais justo, e partimos do preceito de que a igualdade seria o ponto-chave, mas igualdade em quê? Quem soube responder essa pergunta com maestria foi Martin Luther King Jr., que lutou pela igualdade dos direitos civis. Em vez de promover uma luta racial nos nos Estados Unidos dos anos 1960, ele fez algo muito maior, e queria a igualdade de oportunidades entre brancos e negros. Não há evidências de que ele tenha pedido cotas em escolas, mas pediu que todos tivessem o justo acesso à escola e, pelo mérito individual, cada um trilhasse seu caminho. Ademais, Rosa Parks, considerada a “mãe dos direitos civis”, se recusou a ceder o seu lugar a um homem branco em um ônibus em Montgomery (algo obrigatório pelas leis segregacionistas) por acreditar que já havia conquistado aquele lugar. Uma luta por justiça.

Leia também:  O problema não é a desigualdade, é a pobreza (artigo de Rodrigo Saraiva Marinho, publicado em 7 de dezembro de 2016)

Leia também: Pobreza e desigualdade (editorial de 23 de janeiro de 2017)

Além disso, a redução da pobreza pode ter mais correlação causa-consequência com as outras duas metas da Revolução Francesa: liberdade e fraternidade. A liberdade, tanto em questões pessoais quanto econômicas, é o que garante a possibilidade de as pessoas saírem da condição de pobreza e, com o anseio de buscar uma condição melhor, serem livres de escolher as possibilidades disponíveis que garantam a satisfação das suas necessidades individuais. Ninguém quer ser igual ao vizinho ou ao colega de trabalho; as pessoas querem ter o que atenda a subjetividade de suas necessidades. Um governo planejador jamais saberá a cor da camisa que deixa um cidadão mais satisfeito, e o quanto outro cidadão estaria disposto a abrir mão de um suculento filé por um ingresso para o jogo de seu time do coração.

A última meta, a fraternidade, parece ser a mais esquecida, embora seja a peça para que a humanidade avance em seu processo evolutivo como sociedade, tal qual se é propagado pelos defensores do igualitarismo. Promover a igualdade de modo coercitivo não traz mérito para ninguém. O desejo de compartilhar e ser solidário é um valor individual que deve ser cultivado, e não a retórica doutrinária de que é preciso tomar de uns em favor de outros. Essa doutrina – socialista – nos torna mais distantes da possibilidade de sermos uma sociedade que pense no bem comum, pois nos ensina a enxergar no outro o inimigo, motivados pela falácia da luta de classes. Ludwig von Mises, notável economista e filósofo do século 20, já havia predito a impossibilidade de êxito, tanto econômico quanto social, dessa mentalidade – e isso nas primeiras décadas do século passado, uma época em que a implantação de regimes socialistas era unanimidade e tida como solução para as mazelas do mundo.

Estamos, sim, distantes – cada vez mais distantes de enfrentar o que verdadeiramente aumenta a pobreza: falta de liberdade e de espírito fraterno, os verdadeiros motes para alcançar o que de fato anseia a humanidade, seja como um grupo, seja como indivíduos.

Adriano Paranaiba, economista e doutor em Transportes, é professor de Economia e Gestão no Instituto Federal de Goiás e editor-chefe do periódico acadêmico “Mises: Interdisciplinary Journal of Philosophy, Law and Economics”.
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