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Enfim, os estados chegaram a um acordo com a União a respeito do pagamento de suas dívidas. Depois de muitas reclamações dos governadores contra a aplicação dos juros compostos – juros sobre juros – para a atualização das dívidas, que estariam tornando esses empréstimos impagáveis, o presidente interino e os governadores fizeram um acordo, tomaram uma excelente decisão para resolver o problema: vão “empurrar com a barriga” o assunto por mais dois anos.

Durante os próximos dois anos, as parcelas dos empréstimos serão reduzidas por meio de descontos, que serão de 100% nos primeiros meses e deverão ser reduzidos gradualmente até o mês de julho de 2018, quando os estados voltarão a pagar as parcelas integrais de seus empréstimos.

A dívida vai permanecer, cada vez maior. É uma dívida a ser paga pela sociedade

Ou seja, Temer propôs que os governadores ficassem sem pagar nada nos próximos meses e somente no próximo mandato, depois de 2018, é que as dívidas voltarão a ser pagas. Todo mundo fica feliz: os governadores, porque ganharam uma moratória; e o presidente, porque ganhou o apoio das lideranças estaduais. Mas, a rigor, o acordo apenas empurra o problema para a frente. Afinal de contas, do que se sabe, nada vai mudar no regime de cobrança de juros e, se a moratória significar a cobrança, a partir de 2018, dos juros não pagos nos meses de 2016 e 2017, a crise financeira dos estados deverá piorar. Por outro lado, se a União estiver dando um presente aos estados, a conduta seria semelhante à famigerada pedalada, centro do debate do impeachment.

Mas pouco se fala sobre a origem dessas dívidas. A despeito da exibida preocupação dos governadores, nenhum deles está pessoalmente comprometido com o pagamento dos empréstimos. Suas preocupações são imediatas: como concluir o mandato sem demonstrar que estamos falidos? Afinal de contas, em 2018 muitos desses governadores esperam estar concorrendo à reeleição ou a outros cargos. E, neste ano de 2016, esperam apoiar candidatos vitoriosos nos municípios de seus estados. Para isso, precisam de recursos para ter margem de manobra.

A dívida, entretanto, vai permanecer, cada vez maior. É uma dívida a ser paga pela sociedade, que certamente nunca foi consultada se desejava contraí-la, e para que a dívida seria feita.

Um dos exemplos da atual crise da dívida dos estados é o Rio de Janeiro, que na última sexta-feira decretou “estado de calamidade financeira” e, com isso, pretendia obter ajuda extra do governo federal. Diante disso, muita gente está querendo saber como é que se faz para decretar estado de calamidade para conseguir ajuda para pagar as próprias contas.

O governo do Rio de Janeiro trabalha já há seis anos para executar uma nova linha de metrô, o chamado “Metrô Linha 4”. Sua concessão iniciou há quase 20 anos, em 1998, mas, naquela época, não saiu do papel. Em 2010, com o argumento de produzir um legado para a Copa do Mundo, o governo do estado simplesmente renovou, com urgência, a concessão dos anos 90, alegando que não haveria tempo hábil para realizar uma nova concessão. Hoje, a menos de 50 dias da abertura da Rio 2016, a obra ainda não foi concluída, e provavelmente não o será a tempo para os Jogos Olímpicos. Mesmo assim, o estado pede uma ajuda extra para o governo federal com o objetivo de viabilizar a conclusão da obra.

Se, em vez de se endividar às pressas para anunciar a execução de uma obra com a promessa de ser um legado da Copa do Mundo, o estado do Rio de Janeiro tivesse planejado essa obra, realizado uma nova licitação com parâmetros modernos e equilibrados, e executado as ações dentro dos prazos, talvez a obra já tivesse sido concluída, com menos tempo e menos custos.

Por equívocos desse tipo é que deveria haver uma auditoria sobre o endividamento do poder público no Brasil. Algumas perguntas fundamentais precisam ser respondidas: quem decidiu fazer a dívida? As condições do endividamento foram equilibradas? A dívida era realmente necessária? Os recursos emprestados foram aplicados no propósito original? Houve ganhos reais para a sociedade?

As contrapartidas exigidas pelo governo Temer para que os estados possam usufruir do acordo sobre a dívida também são questionáveis. Um passo realmente importante para conter o endividamento seria exigir, na Constituição, que novas dívidas com grande impacto no orçamento público fossem condicionadas à realização de plebiscitos para a decisão popular. Uma medida desse tipo poderia reduzir a confusão dessas dívidas, que obrigam a sociedade a pagar pela decisão dos governantes.

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