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 | Hugo Harada/Gazeta do Povo
| Foto: Hugo Harada/Gazeta do Povo

Desde seu primeiro momento, em um golpe de Estado a que o povo assistiu bestializado, a República brasileira corresponde à expressão de horror do republicano Ruy Barbosa quando a conheceu na realidade após tê-la cantado em verso e prosa na teoria. “Majestade, me perdoe, eu não sabia que a República era isso”, disse o baiano, antecipando um ex-presidente que de nada sabia, mas ainda assombra a política brasileira.

A história da República é a história de uma sucessão de golpes, ditaduras, convulsões sociais, mais golpes, corrupção em níveis inimagináveis e flagrante desamor pelo Brasil. Mas não é isso que faz com que a República brasileira não consiga funcionar; estes são sintomas de um problema mais sério, que é a ilegitimidade da República na alma do brasileiro. Não se trata do golpe de Estado, mesmo porque tantos outros foram feitos que um a mais ou a menos não é tão grave mais de século depois. Refiro-me, sim, ao modo de pensar do brasileiro, ao modo personalista com que nossa cultura lida com a sociedade e com a coisa pública. O que é da República não é de ninguém; o que fosse do Imperador seria dele. Isto é algo que o brasileiro entende instintivamente.

O próprio Lula já seria menos capaz de fazer mal ao país como rei que como presidente

O fenômeno também tem outro lado: cada presidente eleito tem quatro ou oito anos para enriquecer e ainda juntar dinheiro para tentar eleger um correligionário. E mesmo assim o povo brasileiro, apesar dessa vergonhosa sucessão de ladrões, continua sempre com a esperança de encontrar uma figura paterna no Planalto. Essa figura seria o rei, ainda que Lula tenha tentado sê-la e Getúlio, que fechou o Congresso e instaurou uma ditadura, ainda seja lembrado como “pai dos pobres”.

No Brasil não importa quem suba ao trono. O próprio Lula já seria menos capaz de fazer mal ao país como rei que como presidente, ainda que provavelmente um sorteio entre toda a população certamente escolhesse alguém melhor. Nós até temos uma família imperial – ou duas, pois são dois ramos dela, que não se bicam – e isso poderia facilitar um pouco as coisas. Mas que se chame o Roberto Carlos, o Pelé ou o Rei da Cocada Preta e se o ponha lá, encarregado de ver que o Brasil esteja funcionando quando ele o passar às mãos de seu filho.

Precisamos de uma estabilidade que permita que seja feita a limpeza completa que a política brasileira demanda urgentemente, e ela só pode existir se o chefe de Estado não for um político profissional e não tiver incentivos para encher as burras o quanto antes. Ou seja: se tivermos um rei. É isso que a cultura do Brasil demanda, e é essa a única maneira de sair da sinuca de bico em que as felizes revelações da podridão debaixo do tapete da República nos enfiaram.

Hoje em dia é preciso levar a monarquia a sério.

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