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Saí do ar em julho passado. Tive um acidente gravíssimo e fiquei quase oito meses no hospital, com 45% do corpo queimado, altas fraturas, morfina em doses cavalares, a festa toda. Ainda estou entrevado. Agora há pouco, quando saí daquele leito, me descobri na posição do proverbial ET espantado que tantos cronistas políticos brasileiros usam para mostrar a diferença entre a política real e as expectativas do discurso legal e político.

Como assim, caiu o avião do Eduardo Campos? Aí a Dilma foi reeleita, mas já perdeu o poder de fato? Por favor, alguém me explica o que aconteceu com a Petrobras! E esse juiz Moro, donde veio? Quem mastigou os dados do IBGE? O Levy Fidélix falou o quê? E que história é essa do Obama com os Castro? Peraí, o Robin Willians se matou? E essas passeatas de milhões de pessoas, quem diria, hein? Mas foi só eu dar uma cochiladinha que o Suassuna foi-se embora?

O lado estranho de sair do ar por meses, especialmente para alguém tão ligado no noticiário político e social, é perceber como acaba tudo sendo basicamente a mesma coisa

Descobri a morte do Suassuna – ocorrida dois dias depois do meu acidente – ainda no hospital, lendo uma revista velha com uma retrospectiva de 2014 que minha família guardou para mim. Chorei tanto que minha mulher queria me tirar a revista. É mais fácil eu culpar a morfina, mas que ele vai fazer falta, lá isso vai.

O lado estranho de sair do ar por meses, especialmente para alguém tão ligado no noticiário político e social quanto eu, é perceber como acaba tudo sendo basicamente a mesma coisa. Os fatos políticos novos são apenas consequências, muitas vezes previsíveis, dos fatos anteriores. As lutas de fundo – estas, sim, importantes – continuam as mesmas. O país continua servindo de corda para um cabo de guerra cujo prêmio são as fartas tetas do erário. A sociedade em decadência continua, bom, em decadência, com uma tara nova na moda a cada 15 segundos e apregoando que cafuné aqui ou ali é a razão do viver.

O outro lado da mesmice é a percepção das mudanças graduais como se fossem súbitas. Como alguém que fica uns anos sem ver uma criança se assusta quando a reencontra – daí as tias velhas que beliscam as bochechas e dizem “como você cresceu!”, quando a gente é pequeno –, alguém que toma contato súbito com todas as maluquices do momento vai sempre tomar um susto. Não é que a situação esteja forçosamente pior, ainda que seja difícil comparar, sei lá, a antiga e já clássica dança na boquinha da garrafa com o meramente ultrapassado quadradinho de oito. É só que ela é diferente. Outros escândalos, outras manias, outras invencionices. Outros tempos.

Mas é sempre bom estar de volta.

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