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Uber, Vale, Eletrobras, aplicativos, “igualdade salarial” e mais: governo Lula intensificou a ofensiva sobre o setor privado e a liberdade econômica.| Foto: André Borges/EFE

A passagem do tempo e as aceleradas inovações tecnológicas provocam transformações da realidade econômica que alteram inevitavelmente a validade de certas teorias e certas políticas públicas, porquanto mudam concomitantemente as relações de produção, a estrutura do mercado e os hábitos de consumo. O desafio das estruturas estatais e dos governantes consiste em acompanhar as mudanças, reexaminar as teorias econômicas e atualizar sua visão da realidade geral com o objetivo de ajustar as políticas públicas e as ações de governo.

Nesse contexto de um mundo que muda em alta velocidade, tem sido constatado que as maiores dificuldades da estrutura de Estado e dos governos em se ajustar aos tempos novos ocorrem quando os mesmos governantes ficam tempo demasiadamente longo no cargo. Assim, os países nos quais o chefe de governo se mantém no poder por muitos anos, às vezes décadas, acabam se retrasando e ficando para trás na corrida mundial pela atualização e modernização. Isso vale também para o caso de países em que o chefe de governo, embora tenha mandatos fixos, acaba se reelegendo mais de uma vez, como é o caso do Brasil.

Lula está em seu terceiro mandato como presidente da República, o que lhe permitirá sentar-se por 12 anos na cadeira presidencial, com a particularidade de haver um intervalo de 12 anos entre o fim de seu segundo mandato e o início de seu terceiro mandato. De início, pode-se especular sobre os riscos de um chefe de governo – cujo poder no regime presidencialista é altíssimo – voltar ao comando do governo nacional com crenças, teorias e políticas superadas e inadequadas para a atual realidade econômica, social e política.

O hábito estatizante e intervencionista, embora nocivo e enferrujado, continua sendo a marca deste terceiro mandato de Lula

Desde o primeiro governo de Getúlio Vargas (1930-1945) até o fim dos anos 1980, o Brasil seguiu a cartilha que preconizava um Estado grande e um governo forte, com alta dose de estatização da produção e pesada intervenção do governo nos domínios econômicos e nos mercados, sob o argumento de que o setor privado brasileiro não dispunha de capitais ou de uma classe de capitalistas capazes de darem conta de promover a implantação da infraestrutura física, nem de criar um parque industrial condizente com o tamanho do país e o crescimento populacional. Desde então, essa crença esteve presente na política estatizante e intervencionista do governo, inclusive no período de 1964 a 1985, quando o país foi governado pelo regime militar.

O mundo seguiu mudando; uma onda da globalização se apresentou em meados dos anos 1980 e se consolidou nos anos 1990 em diante, provocando uma revolução econômica e política que consistia na abertura internacional, liberalização do comércio, privatização de empresas estatais e redução da intervenção governamental nos mercados. Com isso, iniciou-se uma fase de atração de capitais estrangeiros para investimento empresarial no país; parte da infraestrutura física foi financiada pelo Banco Mundial; e, mais adiante, foi dado um choque nas velhas estruturas estatizantes e intervencionistas, sobretudo no governo de Fernando Collor de Mello, que teve início em março de 1990. Apesar de um mandato curto (Collor sofreu um impeachment em outubro de 1992 após denúncias de corrupção), o Brasil avançou significativamente na abertura internacional, privatização de empresas estatais e liberalização do mercado.

Fernando Henrique Cardoso, que teve dois mandatos como presidente da República, de janeiro de 1995 a dezembro de 2002, prosseguiu com a política de desestatização, incluindo ambiciosa política de privatização de bancos estatais federais e estaduais sob o Programa de Estímulo à Reestruturação e ao Fortalecimento do Sistema Financeiro Nacional (Proer), executado com êxito apesar da ferrenha oposição do PT e da CUT. Vale registrar que em nenhum momento o governo ousou incluir no programa de privatização o Banco do Brasil, a Caixa Econômica Federal e a Petrobras, sob o argumento de que eram empresas estratégias e intocáveis.

A condição de empresas consideradas estratégicas não livrou essas megaestatais de serem exploradas e enfraquecidas sob corrupção e má gestão justamente nos governos esquerdistas do PT, que diziam ser seus maiores defensores. Na fase aguda dos prejuízos da Petrobras, os acionistas foram severamente punidos, incluindo entre eles a legião de trabalhadores aos quais o governo autorizou o saque do FGTS para compra de ações da companhia. Atualmente, os acionistas privados da Petrobras detêm 63,4% do capital da empresa; o BNDES detém 7,9%; e o Tesouro Nacional é dono de apenas 28,6% do capital, embora as ações do governo sejam todas com direito a voto, o que lhe dá maioria do capital votante e o controle da companhia.

O hábito estatizante e intervencionista, embora nocivo e enferrujado, continua sendo a marca deste terceiro mandato de Lula, como provam as recentes intromissões do presidente na Petrobras e a tentativa de emplacar membros do PT em megaempresas privadas, a exemplo da pressão do governo para a nomeação (que não deu certo) de Guido Mantega na presidência da Vale. Insaciável em sua ânsia de intervir no mercado e prejudicar o funcionamento da economia privada, o ministro do Trabalho, Luiz Marinho, apoiado por falas públicas de Lula, anunciou sua pretensão de regular os aplicativos de entregas de refeição e transporte particular de passageiros.

Em resumo, o PT e os partidos de esquerda que o apoiam com ideias dos anos 1970 seguem querendo impor suas crenças e práticas atrasadas sobre o funcionamento do mercado e do livre comércio nesta terceira década do século 21, em que a Quarta Revolução Tecnológica inundou o mundo com um turbilhão de inovações e novas formas de trabalhar, produzir e consumir. Além disso, é extremamente perigoso para o futuro das finanças públicas e da estabilidade econômica que o governo queira ir pelo caminho de aumentar o tamanho do Estado, aumentar as empresas estatais sob seu comando e intervir no livre funcionamento do mercado justamente no momento em que a dívida pública é alta como porcentual do PIB e as contas públicas apresentam déficit fiscal primário em torno de 2,5% do PIB.

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