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No dia 19 de maio, o primeiro-ministro chinês Li Keqiang foi recebido pela presidente Dilma para a assinatura de 35 acordos, pelos quais a China deverá injetar US$ 53 bilhões em projetos de infraestrutura, comércio e serviços no Brasil. Nesse valor, está incluso aporte de US$ 7 bilhões somente na Petrobras, em financiamento para projetos inseridos no plano de investimento da estatal brasileira. Coincidentemente, esse valor é próximo do quanto a Petrobras reconheceu como perdas em seu balanço em função dos desvios já confessados no âmbito da Operação Lava Jato.

A injeção de capitais estrangeiros no Brasil tem duplo efeito positivo

O governo brasileiro divulgou com entusiasmo o “pacote chinês”, principalmente para amenizar o clima de extremo pessimismo que paira sobre a economia nacional em razão da queda no Produto Interno Bruto (PIB) de 2015, aceleração da inflação e das críticas ao pacote de ajuste fiscal apresentado ao Congresso. O PIB de 2014 foi igual ao de 2013 e a previsão do próprio governo indica que, em 2015, o PIB será 1,2% menor que no ano anterior, o que configura um quadro de recessão.

A lista dos 35 acordos é longa e cobre várias áreas, mas não se sabe com precisão quanto do total de US$ 53 bilhões destina-se a investimentos diretos da China no Brasil e quanto será aportado como empréstimos a serem devolvidos com os devidos encargos de juros. Os detalhes deverão ser conhecidos à medida que o conteúdo detalhado dos acordos for sendo revelado nos próximos meses. Também não se sabe ao certo se a China irá tornar-se detentora de participações societárias em empresas estatais brasileiras e em que proporção isso poderá ocorrer. Como há muitos pontos não explicitados, é o caso de perguntar se haverá desestatização de frações do capital de estatais por meio de venda para a China. Se isso ocorrer, cabe indagar também se os setores do PT e da CUT sistematicamente contrários a qualquer tipo de privatização vão promover movimentos contra a “entrega” de partes do capital estatal nacional para os chineses.

Questões ideológicas à parte, a injeção de capitais estrangeiros no Brasil tem duplo efeito positivo. Primeiro, é importante contribuição para a recuperação da combalida infraestrutura brasileira. Segundo, os dólares que vierem a ingressar darão relevante ajuda para amenizar o déficit em transações correntes (resultado da balança comercial e da balança de serviços). A avaliação inicial – que é precária em face da ausência de detalhamento dos acordos – é de que a iniciativa é positiva, sobretudo porque a China vem se constituindo em importante parceiro comercial para as exportações brasileiras e o Brasil anda bastante deficitário em infraestrutura, e o dinheiro chinês poderá ajudar a superar as deficiências, como é o caso do acordo para expansão da malha ferroviária.

No lado das críticas, é possível destacar que os acordos, pelo menos em sua versão publicada, são genéricos e deixam lacunas não esclarecidas, razão por que não é possível avaliação tecnicamente profunda. Um segundo aspecto obscuro diz respeito à ausência de cronogramas de aporte dos recursos e da execução dos projetos. Terceiro, e talvez o mais importante, não se sabe claramente quais contrapartidas o governo chinês exigirá em relação a controles e poder decisório sobre os projetos nos quais investirá. Os mesmos críticos da privatização também sempre foram contra a internacionalização da economia brasileira e a abertura ao investidor privado estrangeiro. Resta saber o que dirão em relação à abertura para a entrada de capitais chineses e as exigências feitas para colocar seu dinheiro no Brasil.

Apesar dos efeitos positivos para a economia brasileira, em um ponto não dá para ter ilusões: a China é um país comunista governado por uma ditadura que não é acostumada a negociar de forma leve nos embates comerciais internacionais. Ainda que os acordos possam ser considerados positivos, somente os desdobramentos futuros permitirão dizer se o Brasil fez um bom negócio. De qualquer forma, trata-se de uma inflexão no viés antiprivatização do PT, pois a permissão de investimentos estrangeiros no país em projetos historicamente estatizados, sejam eles feitos por um governo ou por investidores privados, é uma forma de desestatização. É o caso de esperar para ver.

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