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| Foto: Beto Barata/PR

Poucos políticos querem ver seu nome colado ao do presidente Michel Temer. O vazamento de vídeos da delação do operador financeiro do PMDB Lúcio Funaro piorou ainda mais o clima no Congresso antes da votação da segunda denúncia contra Temer – o parecer, favorável ao presidente, deve ser votado nesta quarta-feira (17) na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara.

Neste cenário, um fator pode dificultar ainda mais a vida do presidente: a posição que está sendo adotada pelo presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), que dá sinais de querer voltar a se apresentar como alternativa viável para aglutinar forças entre os parlamentares focando nas eleições de 2018.

Maia tem mandado recados explícitos para o presidente e seu núcleo mais próximo. Se o casamento entre Maia e Temer foi por conveniência, agora ele parece fazer menos sentido, com os partidos se reorganizando em torno das candidaturas para as eleições de 2018. Nesse cenário, Maia quer mostrar que seu partido pode se apresentar como uma opção para a “nova direita”, principalmente após o enfraquecimento do PSDB.

Jantares com oposicionistas, declaração de que vem “levando facada nas costas do PMDB”, e greve de votação de medidas provisórias enviadas pelo governo são apenas alguns exemplos da movimentação que Maia vem adotando nas últimas semanas, quando a Câmara se prepara para levar ao plenário a segunda denúncia contra Temer.

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“Não há, a princípio, uma relação afetivo ideológica entre o Temer e Maia, entre o PMDB e o DEM. É uma questão de conveniência. Mas agora Temer está se enrolando. A partir da questão do Funaro, isso o fragilizou demais. Colocou novos elementos, que são muito graves. Quase críticos para o Temer seguir à frente do país”, avalia o cientista político André César, da Hold Assessoria Legislativa.

O movimento de preparação para as eleições de 2018 já permeia esse movimento de Rodrigo Maia. O partido está em busca de quadros para a disputa eleitoral, inclusive para lançar um candidato a presidente ou capitanear uma candidatura com outros partidos. César cita uma expressão de Leonel Brizola (responsável por lançar o pai de Rodrigo Maia, César Maia, na política em 1981) para explicar o movimento atual: Maia está “costeando o alambrado”, avaliando a hora de mudar para o terreno opositor.

“Maia, na condução do DEM, certamente está ouvindo o partido. Eles estão sondando pessoas, jogando vários laboratórios para ver o que pega. O DEM está costeando o alambrado. O partido tem 29 votos na Câmara. Se ele mudar de lado a coisa pode mudar para Temer na votação da denúncia. E pode criar um efeito manada”, afirmou.

Nos bastidores, entre apoiadores de Temer, o poder do DEM é minimizado. É um “partido pequeno” para conseguir causar problemas para a votação da denúncia. Para escapar, Temer precisa de 172 votos pedindo o arquivamento da denúncia pelo plenário. Na última votação, obteve 263. No DEM, dos 29 deputados, 23 votaram em favor do presidente.

“Esse movimento do DEM, de procurar um candidato, mostra que o partido está solto na pista. Então pra que se colar na imagem do Temer? Se queimar com o eleitorado?”, avalia César. “Na primeira denúncia tivemos aquele frisson [por Maia assumir a presidência da República], mas o mundo político-econômico em geral não viu condições de ele assumir. Agora, as forças questionam ‘por que ficar com Temer’? E talvez se tenha dito ao pé do ouvido de Maia: ‘chegou sua hora’”, comenta César.

Briga entre Maia e advogado de Temer expôs fissura

O mais recente episódio que tensionou a relação Maia-Temer foi a divulgação no site da Câmara dos vídeos do delator Lúcio Funaro, que estão sob perícia da Polícia Federal. Em resposta, o advogado de Temer, Eduardo Pizarro Carnelós, criticou os vazamentos de forma dura. Maia respondeu defendendo que o material já estava desde setembro no site da Câmara. O clima piorou entre as duas esferas. “Jamais pretendi imputar ao Presidente da Câmara dos Deputados a prática de ilegalidade, muito menos crime”, divulgou o defensor de Temer, em nota, tentando abafar o mal entendido.

Dentro do governo, a avaliação é de que o vazamento dos áudios não atrapalhará a votação da denúncia na CCJ. Também não há qualquer desentendimento ou tensão entre Maia e Temer. O deputado Darcísio Perondi (PMDB-RS) afirmou que o assunto foi “trabalhado” durante o final de semana, com diálogo entre as partes. Para ele, desencontros entre as autoridades são normais. O deputado, ligado ao núcleo de Temer na Câmara, afirmou ainda confiar em Maia e que “ele poderia ser meu candidato a presidente ou vice-presidente”.

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A oposição coloca lenha na fogueira e trata como proposital a divulgação de trechos da delação de Funaro e dos áudios recuperados do gravador de Joesley Batista. “Michel temer está vendo a sua situação na Câmara pior rapidamente. De um lado, um aliado que se recusa a esconder os vídeos da delação de Lúcio Funaro”, afirmou o deputado Alessandro Molon (REDE-RJ), que projeta que o plenário da Câmara irá pedir a sequência do julgamento de Temer.

Planejamento de Maia pode ir além deste atual movimento

A mudança de clima entre Maia e Temer teve uma importante virada quando alguns correligionários do PSB, que ensaiavam uma migração para o DEM, foram seduzidos pelo PMDB. Maia vinha articulando há meses a filiação de uma dezena de políticos no seu partido, entre eles o ministro de Minas e Energia, Fernando Coelho Filho, e seu pai, o senador Fernando Bezerra (PE).

“A gente não pode ficar levando facada nas costas do PMDB, principalmente de ministros do Palácio e do presidente do PMDB”, afirmou o presidente da Câmara em entrevista à TV Bandeirantes, em setembro.

Mas a movimentação de Maia contra Temer – e em favor de um plano político e de seu partido – ainda poderá ter outros episódios. Mais de 20 pedidos de impeachment foram recepcionados na Câmara e aguardam parecer de Maia para que comecem a tramitar, inclusive o de autoria da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Nenhum deles foi arquivado por Maia e pode ser aberto a qualquer tempo.

“Maia está jogando. Agora ele entendeu o jogo e começou a jogar muito bem. A resposta ao advogado do Temer foi brilhante, no contexto de hoje”, avalia o cientista político André César.

Em entrevista à GloboNews em julho, Maia negou ser conspirador para derrubar Temer. Mas diferenciou seu papel como deputado do DEM e como presidente da Câmara. “Uma coisa é o presidente da Câmara, outra coisa é o deputado eleito pelo DEM que apoia o governo do presidente Michel Temer. Esse deputado será leal sempre. Agora, o presidente da Câmara vai ser o presidente da instituição e árbitro do jogo. Então, a minha distância do governo nesse momento e a Constituição e o Regimento da Casa são aqueles escritos que eu vou respeitar nesse processo.”

Resta saber: neste momento, Maia está se colocando como deputado – e, como qualquer parlamentar que olha o momento da política e define seus movimentos – e estaria costeando o alambrado?

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