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Basta olhar em volta: “O Brasil é um deserto de homens e ideias” – usando as palavras atribuídas a Oswaldo Aranha. Neste ermo, só é realizado o que a tecnocracia determina, conforme a burocracia concede, o Ministério Público permite e a mediocridade alcança.

O vazio criativo encontra-se principalmente nas grandes cidades. Curitiba não foge à nova regra. Por mais que ela seja generosa em ideias e soluções urbanas (nove entre dez curitibanos são urbanistas), a capital ainda não foi varrida do mapa brasileiro. O sistema de transporte público é um exemplo da nossa capacidade inventiva, conforme o arquiteto Carlos Ceneviva: “Foi feito com pouco dinheiro e muita criatividade”.

Do avesso são os discursos dos candidatos a prefeito de Curitiba. De esquerda, centro ou direita, de Norte a Sul, de Leste a Oeste, parece que seus programas de governo foram elaborados por um só marqueteiro. E se uma ideia ultrapassar os limites do “factível” (como gostam de usar em vão essa palavra!), não rende votos e não pode ser realizada porque ninguém ainda executou coisa parecida. Ousadia, nestes arraiais, é uma palavra só permitida aos poetas. Mesmo assim, advertem, quando usada com moderação. Com tantos erros históricos já cometidos em nome de desatinos políticos e desacertos partidários, ainda assim temos medo de errar.

Chegará o dia em que caberá ao prefeito a função de zelador das ruas. Zelador do tráfego, das calçadas, da ordem, da limpeza e da nomenclatura viária, sobretudo.

Habituados com sofríveis opções, chegamos ao ponto de exaltar o dever como uma rara virtude. Em função da combalida saúde financeira de Curitiba – com o governo do Estado em petição de miséria –, chegará o dia em que caberá ao prefeito a função de zelador das ruas. Zelador do tráfego, das calçadas, da ordem, da limpeza e da nomenclatura viária, sobretudo.

Neste sentido, o nome da menor avenida do mundo é uma boa amostra. Nascente da Rua das Flores, a quadra da Praça Osório até a Rua Ébano Pereira e Travessa Oliveira Belo é a menor avenida do mundo e surgiu com o nome de Luiz Xavier. Primeiro prefeito reeleito de Curtiba, o Coronel Luiz Antônio Xavier (1856-1933) ganhou nome de rua ainda em vida, devido à sua popularidade. Não era um técnico, de urbanismo nada entendia, mas era extremamente simpático e administrava a cidade como se cuidasse do jardim de sua própria casa. Era um honesto e aplicado zelador das ruas. Foi ele que conseguiu (quando parecia infactível), alinhar a Rua XV de Novembro à Praça Osório, transformando um alagadiço em espaço integrado.

Nome de rua ainda em vida, ainda vivo Luiz Xavier viu seu nome jogado na sarjeta: quando Getúlio Vargas assumiu o poder, em 1930, os sabujos getulistas retiraram a placa com Luiz Xavier e encimaram a de João Pessoa, o vice de Getúlio assassinado na Paraíba. Luiz Xavier sentiu-se ferido de morte. A menor avenida do mundo, portanto, ficou denominada Avenida João Pessoa por mais de vinte anos. Como conta o saudoso historiador Valério Hoerner Júnior: “Morre Getúlio. Dia fatídico para o país. De qualquer maneira, não havia mais por que alimentar sujeição ao sorriso do velhinho. Uma iniciativa bairrista da Câmara, então, sem alarde mas com valentia, devolveu João Pessoa ao solo paraibano e reinvestiu o ex-prefeito na função que com tanta galhardia desempenhara”. Foi uma injustiça reparada. Falecido em 1933, Luiz Xavier não assistiu à reabilitação de seu nome jogado no olho da rua.

Com os contribuintes, o próximo prefeito vai ter que administrar uma dívida, como sempre, maldita. Com os vereadores, o passivo a ser administrado compreende milhares de novas ruas a serem regularizadas e emplacadas nos próximos anos, com uma lista de espera onde há denominações já aprovadas desde a década de 1970.

Pelos números conhecidos, Curitiba não está precisando de um prefeito. Precisa, isto sim, de um honesto e aplicado zelador de ruas.

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