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Cinquenta e três deputados estaduais foram dormir mais tranquilos ontem à noite. A renúncia de Ribas Carli Filho foi um alívio para todos os seus colegas de Assembleia Legislativa. Desde que foi pego dirigindo embriagado, com excesso de pontos na carteira e se envolveu em um acidente com a morte de dois jovens, Carli Filho se tornou o pesadelo dos parlamentares.

A Assembleia não saiu dos jornais no último mês. Os deputados viram sua imagem ligada à do jovem parlamentar, alvo de gigantesca indignação popular. Mais tarde, se viram obrigados a ter de lidar com o fato de que teriam de julgar um colega – justo eles, os reis do corporativismo, que nunca sequer abriram um processo de cassação.

Viram ainda na imprensa a vergonhosa notícia de que Carli Filho não estava sozinho na irresponsabilidade: pelo menos 20 outros deputados estaduais receberam notificação de suspensão da carteira de motorista. As pessoas eleitas para fazer as leis claramente estão desrespeitando os códigos mais simples de conduta.

Carli Filho se tornou um problema para a Assembleia. E sua renúncia acabou com isso. Não há mais necessidade de cassação. As infrações cometidas pelos integrantes da Comissão de Ética com o tempo cairão novamente no esquecimento.

Mas é de se esperar que, nem por isso, a Assembleia do Paraná volte a ser exatamente o que era antes do acidente e das duas mortes. Isto é: se depender dos deputados, é isso que vai acontecer. Tudo como dantes no quartel de Abrantes. E toque fazer bobagem de novo. Bote-se para funcionar a aposentadoria especial para deputados; varra-se para debaixo do tapete a proposta de transparência; volte-se a esquecer que a lei, assim como os radares e as lombadas eletrônicas, serve para todo mundo.

Fazer com que as coisas mudem não depende dos deputados. Essa é a lição que fica de tudo o que se passou nos últimos dias. O rumo dos acontecimentos depende de nós.

Por que Carli foi obrigado a renunciar? Não foi pela pressão dos colegas: foi pela pressão da sociedade. Mesmo calejados como estamos com erros de nossos homens públicos, os excessos do jovem deputado, que culminaram na perda de duas vidas humanas, pareceram demais. A mídia divulgou os fatos. As pessoas comentaram, se indignaram, foram às ruas. E, numa democracia, é assim que as coisas funcionam. É assim que devem funcionar.

Quando os deputados fazem algum outro tipo de erro, porém, não temos nunca o mesmo tipo de mobilização. Ficamos aborrecidos quando vemos que nosso dinheiro não está sendo bem tratado. Reclamamos de algum projeto que não nos parece correto. Mas, em seguida, ficamos quietos. Achamos que mudar isso não é nossa tarefa. Ou não está ao nosso alcance.

Muito pelo contrário, porém. Está ao nosso alcance. E é, sim, nossa tarefa. E, curiosamente, nas poucas vezes recentes em que a população se indignou contra algum fato escandaloso da nossa política, conseguiu algo. Collor caiu. A Copel não foi vendida. O deputado do castelo foi encurralado. E assim por diante.

Resta à população descobrir que a participação não precisa ser tão rara. É preciso que as pessoas se indignem mais vezes. E, quando indignadas, façam algo sobre isso. Motivos – disso podemos ter certeza – não faltam.

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