Se você tiver algum dinheiro sobrando, tiver espírito empreendedor e vontade de ampliar seus lucros, leia com atenção o novo Plano Diretor de Curitiba, aprovado na terça-feira pela Câmara: emendas introduzidas por alguns vereadores escancaram oportunidades para investimentos imobiliários para negócios de diversas naturezas.
Dois sindicatos – o dos Engenheiros e o dos Arquitetos e Urbanistas – alertam para o perigo de desvirtuamento dos objetivos do Plano. Isto é, ao invés de ser um rigoroso guia para evitar o crescimento desordenado da cidade, as emendas introduzidas no projeto podem comprometer o futuro. Ofícios contendo as observações foram enviados pelas duas entidades a todos os vereadores e ao prefeito.
O prefeito terá tempo para estudar a versão que a Câmara aprovou e poder para vetar as intromissões indevidas – mas certamente comprará briga com vereadores que, ao propor determinadas emendas, provavelmente estavam mais preocupados em atender interesses localizados nos bairros onde colhem votos. Ou influenciados por setores econômicos que enxergaram oportunidades de negócios, aqui ou acolá, para, por exemplo, construir andares a mais nos edifícios que projetaram.
Engenheiros, arquitetos e urbanistas, depois de meses de participação na elaboração do Plano Diretor, perceberam – e escreveram no ofício – que algumas “emendas pontuais, sem a devida e necessária articulação, e que têm caráter de alterar o ordenamento do uso e ocupação do solo de Curitiba, constituem, no mínimo, uma ameaça à organização da política de ordenamento territorial da cidade, que tem no zoneamento de uso e ocupação do solo o seu principal instrumento.”
Segundo os signatários, boa parte das emendas tem caráter suspeito. Alguns exemplos:
• Concessão de anistia ampla aos que desobedeceram (ou desobedecerão) a lei do zoneamento, prevendo, no máximo, compensações pecuniárias.
• Criação de inúmeros incentivos e desobrigações em relação ao direito de construir.
• Há emendas bem localizadas, como algumas que abrem oportunidades não previstas no projeto original em bairros específicos e muito valorizados, como Boqueirão, Santa Cândida e Santa Felicidade.
• Flexibilização de regras que pretendiam limitar coeficientes de ocupação, altura máxima e número de pavimentos, recuos obrigatórios e porte comercial.
• Nesses casos, as emendas aparecem em linguagem genérica e libera todos os parâmetros urbanísticos em qualquer lugar da cidade, mediante simples contrapartidas financeiras.
• Se o investidor quiser construir um estacionamento de veículos próximo a terminais de ônibus, terá o direito de acrescentar mais dois andares acima do parâmetro da região em que se localizar sem precisar computá-los.
E por aí vai... O Plano Diretor poderá deixar de servir para ordenar e arrisca acabar desordenando uma cidade que já foi exemplo em políticas de ocupação. No fundo, a cidade pode perder a direção.



