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| Foto: Sérgio Lima/Folhapress

A apreciação inédita pelo Senado da manutenção ou não da prisão de um dos membros da Casa suscitou diversas críticas de parlamentares sobre a atuação protagonista do Supremo Tribunal Federal (STF) no caso e discussões entre especialistas da área. Na quarta-feira (25), depois da autorização da prisão do senador Delcídio do Amaral (PT-MS) pelo STF, a Casa aprovou, em votação aberta, a manutenção da detenção do parlamentar.

Senadora culpa o próprio Senado pelo protagonismo do STF

A possível interferência inadequada do Judiciário sobre o Legislativo na questão envolvendo o senador Delcídio do Amaral (PT-MT) também foi alvo de questionamentos pelo Senado. A senadora Rose de Freitas (PMDB-ES), porém, culpou a própria Casa pela intervenção. “A culpa de tudo está nesta Casa [Senado]. Nós fomos cedendo espaço, deixando de cumprir nossas funções, deixando que o Tribunal legislasse no nosso lugar, e pelo próprio comportamento da classe política”, disse na sessão de quarta-feira (25).

Conforme aponta o cientista político da Unicamp Frederico de Almeida, é natural que exista algum tipo de conflito entre os poderes diante de uma situação inédita, como a apreciação da prisão de um parlamentar. Para ele, sob esse viés, a Constituição foi cumprida, já que houve uma já prevista interação entre STF e Senado na decisão.

Almeida diz ainda que a ideia da separação de poderes não é absoluta. “Ocorre a separação para evitar a concentração de poder, arbitrariedades e abusos, mas a separação é regrada de interações constantes, como a possibilidade de sanção e veto de leis pelo Executivo, por exemplo. A apreciação da prisão é outro desses meios de interação”, explica.

Votação aberta

O professor de Direito Constitucional do Instituto Federal do Paraná, José Arthur Castillo de Macedo, acredita que foi acertada a decisão do STF sobre a necessidade de votação aberta pelo Senado. “Pela Constituição, a exceção é a falta de publicidade. Se o voto secreto não é previsto, ele não pode ser presumido”, aponta.

Para ele, a interpretação constitucional não é monopólio de nenhum dos poderes. Assim, segundo Macedo, foi correta a atuação do STF. “Não entendo que há interferência quando se garante que as regras do jogo democrático sejam respeitadas”, observa.

O presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), por exemplo, criticou duramente a manifestação do ministro Luiz Edson Fachin sobre a necessidade de transparência da votação. “Com a separação dos poderes, não precisaria o STF decidir isso, como não nos cabe decidir sobre a modalidade de votação do STF”, declarou Renan, depois de lido o parecer do Supremo decidindo pela votação aberta.

STF e a Lava Jato: Veja quais foram os ministros citados

Também na sessão, o senador Donizeti Nogueira (PT-TO) chegou a sugerir que o Senado revisse as prerrogativas dos ministros do Supremo, como a vitaliciedade do cargo e a indicação pelo presidente da República. “O Supremo decidiu hoje com o fígado, não decidiu com a Constituição, e isso não pode ser prerrogativa de um poder como do Supremo”, declarou sobre a prisão do colega.

A defesa de Amaral também questionou a prisão do senador, alegando que não há acusação formal. “A Constituição não autoriza prisão processual de detentor de mandato parlamentar e há de ser respeitada como esteio do Estado Democrático de Direito”, disse o advogado Maurício Silva Leite. A Constituição só permite a prisão de parlamentares em caso de flagrante.

Análise

Para o cientista político da Unicamp Frederico de Almeida, é preciso considerar que mesmo as decisões judiciais têm viés político. “Isso não quer dizer que ela seja contra a Constituição, já que tem uma fundamentação técnica”, diz. O professor de Ciência Política da PUCRS Emil Sobottka observa as pressões impostas ao Judiciário: “O STF segue regras, mas é a mais politizada das Cortes, pela própria forma de escolha dos membros”.

Almeida, que também tem formação em Direito, diz que a interpretação do STF sobre a prisão em flagrante não é usual e inova, mas que a autoridade capacitada para avaliar a questão é o próprio STF. Para Roberto Romano, professor de Ética e Política da Unicamp, a decisão pela prisão de Delcídio, por unanimidade dos ministros do Supremo, é sinal “de que, pela seriedade da gravação, pode ser considerado, sim, flagrante”.

Frederico de Almeida diz ainda que é preciso considerar as citações aos ministros por Delcídio na gravação feita pelo filho de Nestor Cerveró (veja mais no infográfico). “Obviamente isso é um disparador e coloca os ministros em uma posição muito desconfortável”, diz. Para Romano, sobre isso, o STF deu o recado: “Não pode ser usado na guerra entre poderes”.

Para Almeida, porém, é preciso observar se a “nova” interpretação dos ministros sobre a prisão em flagrante será mantida com padrão semelhante para o futuro. “Porque aí vai se manter uma coerência. O teste dessa decisão, então, não é hoje, é no futuro”, diz, considerando que a Lava Jato possa atingir outros parlamentares.

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