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Comentário de Padre Porto gerou polêmica em Mauá da Serra. | /Divulgação
Comentário de Padre Porto gerou polêmica em Mauá da Serra.| Foto: /Divulgação

O debate sobre os salários dos vereadores é uma boa novidade, mas precisa ser feito com cautela. A boa notícia, segundo analistas ouvidos pela reportagem, é que a onda a favor da redução de salários dos vereadores, que começou em Santo Antônio da Platina , abriu um debate sobre o papel do Poder Legislativo. Além disso, força as câmaras municipais a serem mais transparentes. Já a cautela se faz necessária para evitar que a passionalidade do momento político do país leve a soluções “fáceis”, mas extremas, como vereadores sem salários ou ganhando salário mínimo. Isso porque a tese da não remuneração ou do salário mínimo pode ser bonita, mas enganosa.

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Para o professor de filosofia política da Universidade Estadual de Londrina (UEL), Elve Cenci, pagar salário mínimo ou não remunerar vereador “favorece o poder econômico ou os financiadores de campanha e os grupos de interesses que financiam a campanha de quem tem penetração popular”. O risco, na opinião dele, é de que em vez de porta-voz da sociedade, os vereadores se tornem “porta-vozes do financiador”. “Não existe almoço grátis”, declarou Cenci, usando a frase atribuída ao economista liberal norte-americano Milton Friedman. Para ele, o salário não pode ser tão alto que “represente enriquecimento” e “nem um valor que seja insignificante porque compromete a atividade parlamentar”.

Professor do Departamento de Administração da UEL, Luís Miguel Luzio concorda: “seria muito bonito, mas eu tenho medo de que isso [redução da remuneração] possa substituir outras questões”. Ele citou como exemplo a entrada no Legislativo de pessoas “que não têm interesse na coisa pública ou que tenham outros interesses”. Luzio acredita que seriam “temerosas” soluções como reduzir o pagamento para um salário mínimo ou colocar a atividade parlamentar como trabalho voluntário. Segundo ele, isso poderia “dar origem a outros males até maiores”. Ele defende que a questão dos salários seja discutida caso a caso, mas afirma que é preciso que seja pago “salário decente, digno”. “Mas também tem que estar dentro da realidade de um país que tem outros problemas sociais. Não dá para haver descolamento dessa realidade.”

Luzio defendeu ainda que a discussão não pode ser feita de forma isolada. É preciso levar em conta também os outros gastos com o mandato, como a verba de ressarcimento, auxílio-moradia e outras benesses pagas a deputados estaduais e federais e senadores, por exemplo.

Rejeição

Elve Cenci afirmou que o debate sobre o Legislativo é importante, mas ressalva que ele está inserido em um ambiente de “rejeição à política e aos políticos”. “Em função da rejeição à política estão desqualificando o Legislativo”, afirmou. Ele criticou a tese de redução do número de vereadores: “é extremamente perigosa”, pois levaria à “redução da representação”. Segundo Cenci, com menos vereadores seria mais fácil o controle dos prefeitos sobre as câmaras municipais. “Fica mais fácil para o prefeito cooptar vereadores, fica mais fácil para a corrupção.”

Para Cenci, com menos vereadores o “fenômeno papel de bala” ganharia ainda mais força. A referência é à fala do deputado estadual Cobra Repórter (PSC), que em meio à crise entre servidores públicos e o governo do estado afirmou que tinha que votar alinhado com o governador Beto Richa (PSDB), caso contrário “não ganharia nem papel de bala” do governo.

Movimentos podem dificultar novos aumentos

Ainda que não consigam reduzir os salários dos vereadores, como desejam, os movimentos que colhem assinaturas a favor dessa medida estão criando um ambiente que vai dificultar a aprovação de aumento. A política salarial para a próxima Legislatura deve ser definida antes do primeiro turno das eleições municipais, que acontecem em outubro do ano que vem. Em Londrina, os vereadores ganham R$ 13,5 mil por mês. Conforme o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), essa faixa de renda se enquadra na classe B (que tem ganhos de R$ 7.250 a R$ 14,5 mil) e soma em torno de 10% da população brasileira.

De acordo com a Constituição, eles poderiam ganhar até R$ 19 mil, que equivale a 75% do salário dos deputados estaduais, que é de R$ 25.322,25. Além do salário, os vereadores de Londrina têm direito a até R$ 450 para correio, até R$ 300 para ligações interurbanas e até R$ 4 mil para cópias em preto e branco e 500 cópias coloridas por mês. Se as cotas não são usadas, elas não ficam acumuladas para o mês seguinte.

Além disso, os vereadores podem contratar até cinco assessores parlamentares. Somados, os salários dos assessores podem chegar a, no máximo, R$ 21.910 mensais. Esse dinheiro não passa pelas mãos do vereador, é pago diretamente pela Câmara. Para o caso de viagens a serviço da Câmara, não há um valor definido para diárias: o Legislativo reembolsa o que foi efetivamente gasto.

Presidente da Câmara diz que discussão é ‘simplista’

O presidente da Câmara de Londrina, Fábio Testa (PPS), disse que “toda mobilização tem que ser ouvida e respeitada”, mas que a discussão em torno dos salários dos vereadores e dos políticos é “simplista”. “Em algumas esferas de poder existem penduricalhos, mordomias, questões altamente excessivas e onerosas.” Segundo ele, a redução de custos não se restringe à questão salarial. O Poder Legislativo, diz Testa, tem outros custos que ficam de fora quando o debate fica só em torno do salário. Ele afirmou que na sua gestão na presidência há um esforço pela redução de custos. “Meu primeiro ato como presidente foi retirar o carro da presidência da Câmara, antes tinha um carro exclusivo. Reduzimos a cota de correios de R$ 900 para R$ 450. O contrato que temos para a compra de passagens aéreas está sendo repactuado, vai cair de R$ 80 mil para R$ 40 mil”, enumerou.

Testa disse ainda que a atual Mesa da Câmara pretende apresentar pelo menos três projetos de resolução que resultarão em cortes de gastos. “Quando pega todos os custos que estamos cortando é muito mais do que a simples redução do salário dos vereadores.” O presidente do Legislativo lembrou ainda que com mais ou menos cortes de custos, a lei em vigor estabelece que a Câmara Municipal deve receber 4,5% da arrecadação do Poder Executivo. Ou seja, o corte de custos não implica diretamente mais dinheiro no caixa da prefeitura. “Eu sou favorável à redução de custos não só do Legislativo, mas de todos os poderes. Teria que ser feito um debate para mudar a Constituição no que diz respeito aos repasses que são feitos do Poder Executivo para o Legislativo”, ressaltou.

Testa defendeu uma redução gradual do repasse, ao longo dos anos, para fazer a adequação.

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