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De acordo com investigações, a campanha de Renan teria sido contemplada com duas doações no valor total de R$ 400 mil | Valter Campanato/Agência Brasil/Fotos Públicas
De acordo com investigações, a campanha de Renan teria sido contemplada com duas doações no valor total de R$ 400 mil| Foto: Valter Campanato/Agência Brasil/Fotos Públicas

O ministro Teori Zavascki, relator da Operação Lava-Jato no Supremo Tribunal Federal (STF), determinou a quebra do sigilo bancário e fiscal do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), e de mais outros suspeitos de envolvimento em supostas fraudes na contratação do consórcio Estaleiro Rio Tietê pela Transpetro em 2010. Teori autorizou a devassa nas contas do presidente do Senado e do ex-presidente da Transpetro Sérgio Machado a partir de um pedido do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, num dos inquéritos da Operação Lava-Jato. A quebra do sigilo compreende o período de 1º de janeiro de 2010 a 1º de abril de 2014.

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O ministro rejeitou, no entanto, pedido do procurador-geral para fazer busca na residência oficial de Renan. A Procuradoria-Geral da República suspeita que Renan, Sérgio Machado e outros agentes públicos receberam propina para facilitar a vitória do consórcio Estaleiro Rio Tietê numa licitação destinada à renovação da frota de barcaças e empurradores usados pela Transpetro no transporte de etanol entre Mato Grosso e São Paulo. O consórcio é formado pelas empresas Rio Maguari Serviços e Transportes Rodoviários, SS Administração e Serviços e Estre Rio Petróleo e Gás.

Pelas investigações do grupo de trabalho que está à frente da Lava-Jato em Brasília, as empresas teriam repassado propina a Renan camufladas como doações eleitorais ao diretório do PMDB de Alagoas e à própria campanha do senador em 2010. As doações ao diretório seriam da ordem de R$ 650 mil. A campanha de Renan teria sido contemplada com duas doações no valor total de R$ 400 mil. O diretório do PMDB de Alagoas, controlado por Renan, chegou a ser alvo de buscas na última terça-feira. As empresas fizeram as doações no mesmo período em que estava em andamento a licitação na Transpetro.

Depoimento de Youssef

As investigações sobre as supostas fraudes começaram a partir de depoimentos do ex-diretor de Abastecimento da Petrobras Paulo Roberto Costa e do doleiro Alberto Youssef, dois dos principais delatores da Lava-Jato. A partir das declarações dos dois e de indícios recolhidos numa segunda fase da apuração, o procurador-geral sustenta que “a contratação do Estaleiro Rio Tietê possui elementos a confirmar que teria sido fraudulenta” a licitação. Segundo ele, “sabe-se agora que recursos relacionados a essa contratação foram carreados a favor de José Renan Vasconcelos Calheiros”.

Um dos primeiros a apontar o dedo contra Renan, Paulo Roberto confessou ter recebido R$ 500 mil em propina de Sérgio Machado para facilitar a contratação de navios no sistema bareboat pela Transpetro. O ex-diretor diz que recebeu o dinheiro no apartamento de Sérgio Machado, em São Conrado, no Rio. Afilhado político de Renan, Machado foi presidente da Transpetro de 2003 até o ano passado. Ele só foi afastado do cargo depois que as denúncias de Paulo Roberto vieram a público. Ainda assim, a demissão do ex-presidente quase levou Renan a romper com o governo.

No mesmo depoimento que falou sobre a propina paga por Machado, o ex-diretor da Petrobras fez acusações ao presidente do Senado. “Que tem conhecimento de que um percentual dos valores envolvidos nos contratos da Transpetro são canalizados para o senador Renan Calheiros com quem José Sérgio de Oliveira Machado se reúne periodicamente em Brasília”, disse o ex-diretor. Ele não especificou os valores das propinas. Mas disse que as somas movimentadas são expressivas. Alguns navios contratados pela Transpetro custariam em torno de R$ 180 milhões.

O procurador-geral argumenta ainda que as fraudes na contratação do consórcio Estaleiro Rio Tietê são demonstradas também numa ação por improbidade administrativa ajuizada pelo Ministério Público Federal de Araçatuba, em São Paulo, contra Sérgio Machado e Wilson Quintela Filho, um dos dirigentes do consórcio, e outros empresários e servidores públicos. Sem conhecer as investigações da Lava-Jato, o Ministério Público de Araçatuba chegou às mesmas conclusões que o grupo de trabalho da Procuradoria-Geral.

Na ação por improbidade, o Ministério Publico informa que duas semanas antes do início da licitação, em 23 de fevereiro de 2010, a SS Administração e Serviços, uma das empresas do consórcio, arrendou um terreno em Araçatuba “com vista a construir os comboios da Transpetro”. Ou seja, a empresa já sabia que a licitação era um jogo de cartas marcadas. O vencedor já estava definido antes do início da disputa. Na ação, o Ministério Público responsabiliza 16 pessoas, entre elas o prefeito de Araçatuba, Cido Sério (PT), e nove empresas.

Num dos depoimentos da delação premiada, Paulo Roberto Costa diz ter recebido oferta de propina de Wilson Quintela, um dos executivos do consórcio Rio Tietê. “Que Wilson Quintela disse ao declarante em reuniões pessoais que daria uma parte do estaleiro ao declarante caso o mesmo ganhasse a licitação; que esclarece que a situação do estaleiro estava vinculada à aquisição pela Petrobras de vinte empurradores e oitenta barcaças”, disse. A negociata só não foi adiante porque, antes de ser concluída, Paulo Roberto foi demitido. Ele diz presumir, no entanto, que o suborno foi repassado a uma outra pessoa.

Paulo Roberto lembrou ainda que a ingerência dele sobre a Transpetro era indireta. Cabia apenas ao então diretor de Abastecimento da Petrobras incluir nomes nas listas de empresas habilitadas a participar de licitações na Transpetro. A Procuradoria-Geral pediu e o ministro Teori também autorizou a quebra dos sigilos bancários e fiscal das empresas vencedoras da licitação, do diretório do PMDB de Alagoas e de Wilson Quintela, entre outros envolvidos no negócio.

O ex-diretor da Petrobras também acusou o lobista Fernando Soares, o Baiano, de atuar na área da Petrobras como operador do PMDB. Ele disse que recebeu R$ 1,5 milhão a título de agrado de Baiano, réu confesso e também um dos delatores da Petrobras. “O grupo criminoso, como se percebe, seria composto por parlamentares, diretores da Petrobras, e empresários. É sabido, também, que haveria um conjunto de operadores executando medidas para permitir que o esquema ilícito funcionasse adequadamente”, sustenta o Ministério Público.

A Procuradoria-Geral também investiga suposto pagamento de propina do Sindicato dos Práticos do Rio de Janeiro ao deputado Aníbal Gomes (PMDB-CE), apontado por Paulo Roberto como representante de Renan em negociações na Petrobras. Depois de firmar um acordo de mais de R$ 40 milhões com a Diretoria de Abastecimento, os Práticos repassaram R$ 5,7 milhões aos advogados Paulo Baeta Neves e Paulo Ornelas, ligados a Anibal Gomes. Quando o caso veio a público, o deputado disse que levou os advogados ao encontro de Paulo Roberto, mas negou que tenha recebido qualquer vantagem no negócio.

O jornal O Globo tentou falar com o advogado Eugênio Pacelli, responsável pela defesa de Renan, sobre as investigações do Ministério Público, mas não obteve resposta. Na última semana, Renan foi a rebater publicamente as acusações de que está envolvido em corrupção na Petrobras. Na terça-feira, dia em que a PF entrou na casa do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), mas deixou de entrar na dele por não ter autorização judicial, Renan reiterou que já tinha prestado as informações aos investigadores.

“Não tenho nenhuma informação (sobre o pedido do MPF). Já prestei todas as informações que me foram pedidas, coloquei qualquer coisa à disposição. E nunca consenti, e nem consentiria, e nem permiti, nem permitiria, que alguém, em qualquer circunstância, em qualquer lugar, falasse por mim”, disse Renan.

Na última terça-feira, policiais federais e procuradores fizeram buscas e apreensão de documentos em 53 endereços de investigados na Lava-Jato. O procurador-geral pediu e obteve autorização para fazer buscas em endereços do presidente da Câmara. Teori entendeu, no entanto, que a situação de Renan seria diferente. O ministro rejeitou o pedido de busca na casa de Renan, mas autorizou a devassa nas contas do senador.

Os documentos apreendidos nas buscas estão sendo analisados por peritos da PF. A partir dos laudos e do resultado das quebras de sigilo, o procurador-geral deverá decidir se apresenta ou não denúncia contra Renan. O senador responderia ainda a outros quatro inquéritos no STF abertos desde o início da Operação Lava-Jato.

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