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A democracia do prato feito
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Eu tenho uma notícia boa e uma ruim pra você. Vamos começar pela ruim: se você acha que a revolta da população com os corruptos vai fazer dessa eleição um ponto de virada na história brasileira, pense de novo. A grande probabilidade é de que tudo continue exatamente como está.

Não se trata de pessimismo. O ponto é que não há como mudar muito se as regras do jogo continuam as mesmas. Principalmente não dá para mudar se os candidatos forem os mesmos. E você pode reparar que, em todos os níveis, os candidatos são exatamente os mesmos que estão aí desde sempre…

Até existe um ou outro nome diferente (o que, aliás, também não é sinônimo de mudança para melhor. Às vezes, como estamos percebendo na disputa eleitoral, muito pelo contrário). Mas em geral os partidos continuam sendo comandados pelos mesmos caciques de dez, quinze e vinte anos atrás. E são eles que decidem, em última instância, quem é que pode ser candidato.

Esse filtro talvez seja o grande problema da democracia brasileira no momento. Por mais que o sujeito seja bem intencionado, ele só pode votar nos nomes que oferecem a ele. E o que acontece hoje é que você vai a uma feira em que só existem uns poucos fornecedores. A batata vem sempre do mesmo produtor, e se a uva estiver murcha você não tem outra barraca para escolher.

Não é que haja poucos partidos. Há quem ache que existem até partidos demais. O problema é que quase todos eles (com honrosas exceções) funcionam do mesmo jeito. Principalmente os competitivos; aqueles que souberam se fazer de modo a conseguir mais tempo de tevê e mais recursos do cofrão do TSE. As exceções são os nanicos. E esses não têm chance nenhuma de chegar lá.

Um partido no Brasil não é uma reunião de pessoas que pensam do mesmo modo. É um cacique, ou um grupo de caciques, distribuindo direito de candidatura a quem faz o seu jogo. E, depois da eleição, como diz o cientista político Adriano Codato, o partido se transforma em outra coisa: uma agência de empregos públicos. Os filiados viram candidatos a cargos comissionados, distribuídos a rodo.

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A ausência de prévias nos partidos é uma aberração. Em tese, o partido deveria ser um agrupamento de iguais, que escolhe entre os seus os mais preparados. Mas há uma piadinha sobre o PSDB (que pode ser aplicada a quase todo partido grande) que define bem nossa realidade. O candidato à Presidência é escolhido por três pessoas, em volta de uma mesa, bebendo vinho importado.

Isso não é uma democracia de fato. Porque o cidadão só tem poder de influenciar em algo depois que já está tudo decidido. Se te pedem para escolher entre pessoas que você não confia, que tipo de liberdade de escolha é esse?

Escolha entre o favorito dos caciques de A e o favorito dos caciques de B. E se você não quiser? Vote nulo, branco, sei lá. Mas não há opções.

Nos Estados Unidos, há uma infinidade de partidos, mas só dois que têm chances eleitorais reais. Nesses dois, o sujeito, até para ser candidato a porteiro, tem que disputar primárias. Se não for escolhido dentro do partido, nem chega a ser exposto para o público. E isso abre margem para que mesmo o mais poderoso congressista seja desafiado em seu distrito.

Aliás, outra diferença importante: os distritos. Aqui, o Congresso é eleito entre pessoas que mal têm ligação com aquele eleitor. E os deputados, ao invés de responderem a seus eleitores, respondem muito mais ao Executivo, que acaba tendo de fazer todo tipo de acordo espúrio para poder governar.

A eleição de 2018 vai ser jogada dentro dessas regras. Nenhum candidato foi de fato escolhido por você. Nem os da esquerda, nem o da extrema-direita, nem os do “centro” (na verdade, a direita que não se radicalizou e tenta esconder seu nome). Foi o que nos ofereceram. Escolhamos entre eles, entre os pratos feitos. É o que resta.

Ah, a notícia boa: faltam seis meses para acabar o governo do Temer!

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