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Depressão, uma companheira silenciosa… (XXXVIII)
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Antonio, com o seu novo corte de cabelo...

“Que mensagem o senhor daria para os pais que, sem perceber, estão deixando os filhos de lado acreditando estarem fazendo a coisa certa?

Eu os recordaria que ser pai e mãe foi uma escolha. Em pleno século 21, quem não quer ter filhos não tem, de modo que não há desculpas.
Quem tem filhos tem responsabilidades sobre uma vida.
Essa vida precisa de respostas.
E diria que só há uma maneira de aprender a ser pai e mãe: convivendo com os filhos, estando presentes em suas vidas, errar, pedir desculpas, reparar o erro e seguir adiante, sempre com responsabilidade e presença.” Sergio Sinay()

Conversando com meu filho…

“27/02/2002…
Filho, cortei seu cabelo!
Sua mãe é maluca mesmo!
Quando a gente passa muito tempo sem fazer nada, fica inventando coisas para fazer.

Mas vou te contar o que aconteceu: você nasceu cabeludinho mas seus cabelos começaram a me incomodar porque achei que estavam muito “compridos”.

Pois bem, estávamos nós dois, assim, sozinhos, sem nada para fazer, naqueles dias que você passa assoviando junto com os passarinhos que voam para lá e para cá quando eu tive a brilhante ideia:
“ – Vou aparar os cabelinhos do Antonio…”

Corri pegar o aparelho de barbear do seu pai, regulei direitinho para tirar as pontinhas do seu cabelo, acomodei você no berço com uma toalha de rosto para os cabelos cairem enquanto eu cortava e… ZAP! Tcha-naaannn!! Passei a máquina do lado contrário, ou seja, cortei a zero!

Filho, eu não sabia se ria ou se chorava de raiva de mim mesma!
O fato era que o estrago estava feito.
Tive que raspar sua cabeça e rezei para que o seu pai não ficasse uma fera comigo!

Enquanto eu passava a máquina na sua cabeça, você ficou quietinho, ouvindo o zzzzzzzzzzzzzz do barulhinho que a máquina fazia. Você acredita que quase dormiu??

Ainda bem que você é um bebê lindo, para minha sorte!

Mas o pior não foi isto, eu quis deixar você mais bonito porque sua avó Regina, Tio Igor e Tia Fernanda, estavam para chegar. Seus tios estavam de passagem para a praia e sua avó veio para ficar conosco uns dias… Ai, ai, ai… Olha só o que fui fazer!!

Mas, quando chegaram, foi uma babação geral!
Sua avó nos ajudou um monte, também para quem cuidou de 5 filhos, experiência é o que não falta.
Ela nos deu uma porção de dicas e tranquilizou-me quanto a não te acordar a cada duas horas para mamar como eu estava fazendo.
Acho que te judiei sem querer, filho.
Coisas de mãe de primeira viagem.

Tão bom receber visitas em casa.
Para mim é uma alegria que venham e que venham sempre.

Sempre digo que sinto falta dos nossos familiares que estão em Londrina.
Mas esta semana o aperto no coração está enorme.

A distância deles e o período que preciso ficar em recuperação da cirurgia é por vezes cruel.
Não tenho com quem conversar para dividir minhas dúvidas, ainda tenho poucas amizades aqui.
A tristeza bate, o choro vem, os peitos cheios de leite empedram, ficam doloridos, e o bico do meu seio rachou…

A Dra. Marina receitou-me um remedinho para prevenir um estado maior de depressão.
Penso que é comum algumas mães passarem por isto no pós-parto e hoje posso entender o que é sentir-se assim, sem ânimo, com uma vontade de ficar num quarto escuro sem conversar com ninguém.

Filho, se ainda existe o esforço para que a depressão não se instale ele é atribuído a você e por você.

Meus dias são longos e parecem intermináveis.
O medo e a angústia muitas vezes são avassaladores deixando-me imobilizada e apática.
Perdoa, meu filho se sua mãe torta está assim.
Eu sei que vai passar e se eu não olhar para isto agora entendo que só me sentirei pior depois e te deixarei triste também.

Não sei explicar.
Sinto medo, culpa, é tudo e não é nada ao mesmo tempo.
Você está aqui, crescendo, desenvolvendo-se super bem, não posso me dar ao luxo de fraquejar, adoecer ou mesmo entristecer.

Você é o meu sol. Uma luz que veio brilhar na minha vida.
Alguém que Deus mandou para ensinar-me a ser mãe, a amadurecer e a formar uma família comigo e seu pai.

Há um esforço da minha parte para que o que eu sinto não te atinja, mas no fundo, não sei até onde posso controlar este sentimento para que não chegue em você.

Pergunto-me o tempo todo se darei conta, se viverei para ensinar tudo o que quero, se serei boa mãe, se não nos faltará trabalho que possa privá-lo de qualquer coisa, se saberei educá-lo direito…

Eu sei que tudo isto passa, mas preciso cuidar-me para dispensar cuidados a você.

Perdoa meu desabafo, meu filho… Ficarei melhor, prometo.

Você acabou de acordar, são duas e vinte da tarde.
Vou parar de escrever e atender você, meu pequeno sol.”

Lições que aprendi…

Não tenho vergonha de dizer que choro sim quando repasso a leitura no Diário.
Lembrar do que passei e do quanto consegui superar faz-me sentir mais forte e segura dos muitos papéis que me atribuo em minha vida.
Ser mãe, esposa, amiga, profissional, “terapeuta” nas horas vagas mostra que aprendi a ser flexível sem me quebrar.

Dez anos é tempo bastante para mudar meu comportamento e minha forma de encarar meus “pitis”.

Lembro-me que eu passava dias e dias chorando.
Tudo fazia-me chorar nestes primeiros meses de vida do Antonio.
A depressão instalou-se bem quieta, sem que eu me desse conta ou admitisse que ela estivesse ali.

Apesar do Antonio e da maternidade desejada, alguns pensamentos sombrios rondavam minha mente.
Orava, pedia a Deus que não me deixasse cair, sucumbir.
Meu filho era quem precisava de mim naquele momento e eu precisava sentir-me forte o suficiente para dar a ele atenção e todo o amor que eu pudesse.

A Dra. Marina ouvia-me com paciência e dizia para eu ficar calma, que tudo passaria.
Alexandre também ajudava-me como podia.
Quando era possível eu conversava com alguém sobre o que eu sentia.

As noites mal dormidas deixavam-me exausta.
As cólicas que o Antonio sentia acabavam comigo ao vê-lo contorcendo-se todo.
Sentia pena dele e por ele.

Mas os dias foram passando.
Antonio ganhava peso e crescia rapidamente.
Devagar a rotina foi se estabelecendo e ganhava um outro ritmo.

Um mês, dois, dez, dez anos…
Olho para trás e fico feliz com o resultado.

Não morri. Pelo menos ainda…
Mas deixei morrer muitas de mim no meio do caminho, descartei-as, já não me serviam mais para ser o que eu queria ser.
Tenho certeza que a experiência permitiu-me ser uma pessoa melhor.

Ainda precisei enfrentar alguns “bichos” emocionais.
Ainda precisei aprender a segurá-los pelas mãos para que não me machucassem mais.
Tive ajuda, busquei ajuda, expus meus sentimentos mais íntimos para que algumas curas pudessem acontecer.
Coloquei o medo de lado, coloquei o orgulho de lado e fui olhar a Celi frente a frente.

Se foi fácil?
Em muitos momentos tive vontade de fugir, em outros senti vergonha por expor-me tão ridiculamente.

Num curso que fiz recentemente, o instrutor dizia o seguinte:
“- Vamos fazer um intervalo?”

No que o grupo respondia:
“ – Antes do choro da Celi, ou depois do choro da Celi?”

Eu nunca me incomodei com a brincadeira.
Ao contrário, sentia-me segura por dividir com aquelas pessoas meus sentimentos mais imaturos e mal resolvidos.
Não tinha medo do que pudessem pensar ou dizer a respeito. Era o aprendizado para minha cura.

Se valeu a pena?
Para mim, sem sombra de dúvida, valeu sim.

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