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Foto: Jonathan Campos
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A reforma trabalhista começou a valer em novembro de 2017 e desde o início encontrou resistência em parte da Justiça do Trabalho. Uma decisão tomada recentemente pela 1ª Turma do Tribunal Regional do Trabalho de Minas Gerais contra o Magazine Luiza é um exemplo de como essa resistência levou a interpretações enviesadas da lei – algo que podemos esperar em outras reformas que devem ser aprovadas nos próximos anos. Os desembargadores mandaram a empresa pagar o salário integral de um funcionário que era contratado como intermitente por entenderem que ele desempenhava uma função rotineira.

Não há nada na lei que diga quando e como o contrato intermitente pode ou não ser adotado. Em tese, a reforma permite que qualquer pessoa possa ser contratada nesse modelo, para qualquer função, desde que aceite as condições – ou seja, trabalhar apenas quando o empregador entender que há necessidade, recebendo proporcionalmente às horas trabalhadas. Um funcionário contratado nesse sistema entrou com uma ação após seu desligamento pedindo o salário integral, mesmo não tendo trabalhado para isso. O TRT-MG aceitou o argumento de que sua função, de assistente de loja, fazia parte de atividades corriqueiras da empresa e que por isso não caberia o contrato intermitente.

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Se essa interpretação for aceita por tribunais superiores, o modelo de contrato intermitente acabará porque na prática todos os contratados por uma empresa têm atividades que de alguma forma podem ser enquadradas como rotineiras. É assim com o garçom do bar, a contadora da firma e o professor do curso de inglês. Não interessa se a demanda por essas atividades (como o movimento em uma loja, por exemplo) varie com o dia da semana ou a época do ano.

O contrato intermitente foi criado para dar flexibilidade para as empresas e, ao mesmo tempo, permitir a formalização de mais trabalhadores. Muitas atividades econômicas têm flutuações grandes de demanda e acabam não formalizando seus funcionários. É o mercado dos bicos. Com a reforma, essa situação se torna formal. Nada impede que o trabalhador tenha mais de um vínculo, ou que após ganhar experiência migre para um contrato padrão.

Há outros exemplos de resistência à reforma. O mesmo TRT-MG decidiu que pessoas contratadas antes da reforma trabalhista não estão sujeitas às novas regras. Os desembargadores avaliaram um caso de cobrança de horas “in itinere”, pagas durante o transporte dos funcionários. A nova lei acabou com o dispositivo, mas os juízes entenderam que isso só vale para quem fosse contratado após a reforma começar a valer. Assim eles acabaram criar uma desvantagem para esses trabalhadores, que se tornaram mais caros para as empresas. E também criaram um enorme insegurança jurídica sobre a validade da norma. Afinal, é preciso demitir todo mundo e fazer contratos novos para se adequar à legislação?

Podemos esperar reações desse tipo em qualquer reforma que se queira fazer no Brasil. O argumento do direito adquirido está enraizado na cultura brasileira e é um dos principais empecilhos para a aprovação de uma reforma da Previdência decente. É também esse pensamento que torna tão difícil rever benefícios fiscais, seja para setores empresariais ou para regiões. O governo Jair Bolsonaro promete fazer uma revisão ampla nesses benefícios e terá a chance de provar que a intenção é para valer vetando a lei aprovada  pelo Congresso que estende benefícios à Sudene, Sudam e Sudeco até 2023. Também está na mira do governo o pagamento ao Sistema S, que já se movimenta fazendo campanha pela manutenção de suas receitas.

Em outras frentes, o novo governo tem ideias para melhorar o uso dos recursos da seguridade social e da assistência ao trabalhador, como o abono salarial – um benefício para trabalhadores formais de salários mais baixos que se tornou injustificável. O país terá de buscar, em outro exemplo, mais equilíbrio no uso de recursos entre salário-desemprego e treinamento de mão de obra, hoje quase plenamente concentrados no auxílio financeiro ao desempregado.

Velhos maus hábitos, quando confrontados, geram uma reação em contrário que torna os efeitos das reformas mais lentos do que gostaríamos. O novo governo precisa aprender logo a comprar as brigas que valem a pena e a abandonar rapidamente as ideias estúpidas que muitas vezes o próprio presidente eleito leva a público. Como exemplo, cito as poucas vezes em que ele falou sobre a reforma da Previdência e sua tentação de abandonar o Acordo de Paris.

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