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Caça de javalis vira caso de polícia e vai parar no STF 

Trazido como alimento há 60 anos, o javali se tornou uma das piores pragas para a agricultura
Trazido como alimento há 60 anos, o javali se tornou uma das piores pragas para a agricultura. (Foto: Divulgação/Polícia Militar de Santa Catarina)

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No Sul do Brasil, onde a terra permite grandes investimentos em agricultura, uma praga europeia vem dando dor de cabeça aos produtores há pelo menos 60 anos. O Sus scrofa, espécie conhecida como javali, foi introduzido no Brasil para o consumo de carne, segundo o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama). Mas o crescimento de sua população se deu de maneira desenfreada, transformando o animal de até 250 quilos em um verdadeiro inimigo para qualquer fazenda.

Não à toa, há 30 anos, o Ibama publicou uma autorização, em caráter experimental, para a “caça amadorista” do animal no Rio Grande do Sul. O experimento funcionou e o abate se tornou uma das principais formas de combate à praga, sendo regularizado desde 2013. Porém, o cenário vem mudando drasticamente nos últimos dois anos - e parece que para o pior. 

Em 2023, o Ibama foi obrigado a suspender a emissão de novas licenças para caça. A alteração foi resultado de mudanças impostas pelo decreto de armas do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O baque foi sentido de imediato por produtores: naquele ano, o Sindicato Rural de Lucas do Rio Verde (MT) estimou um prejuízo de R$ 20 milhões causado pelos javalis, que destruíram 3% do milho plantado no município.  

A situação foi revertida meses depois, entretanto, com mais complicações aos caçadores. O Ibama definiu que "os javalis devem ser abatidos de forma rápida de modo a evitar sofrimento desnecessário", descrição que dá margem para debates judiciais. 

Não bastasse o cenário mais permissivo à ameaça, o tema se tornou ainda mais espinhoso após diferentes operações policiais descobrirem criadouros ilegais de javali. Em Santa Catarina, por exemplo, a Polícia Militar Ambiental (PMA) apreendeu 21 animais que foram criados em situação irregular no interior de Monte Carlo. Todos foram abatidos por “profissionais habilitados para realizaram o abate humanitário”, segundo a PMA.

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E o que o STF tem a ver com isso tudo? 

O abate de javalis voltou a ser notícia no final de abril, após o Fórum Nacional de Proteção e Defesa Animal questionar a legalidade de uma lei estadual catarinense. Sancionado pelo governador Jorginho Mello (PL) em dezembro de 2023, o dispositivo autorizou a caça como método de controle populacional, podendo ser realizada "sem limite de quantidade e em qualquer época do ano”. 

Segundo a Secretaria de Agricultura e Agropecuária do estado, que regulamentou a lei, “os ataques desses animais causam prejuízo maior aos pequenos produtores, com propriedades de até 50 hectares. Para eles, um único ataque pode representar a perda de toda a produção do ano, especialmente nas plantações que ficam em regiões próximas às florestas de araucárias.” 

Apesar da sólida argumentação de Santa Catarina, o fórum decidiu tentar derrubar a lei e entrou com uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) no Supremo Tribunal Federal (STF). Em sua petição, argumenta que a lei sancionada por Mello “manifesta usurpação da competência legislativa da União, subvertendo a lógica federativa consagrada na Constituição”. Ou seja, na visão da entidade protetora dos animais, somente o governo federal deve impor novas leis sobre o controle de pragas como o javali. 

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Nenhuma decisão foi tomada no tribunal, mas a ADI foi distribuída ao ministro Kassio Nunes Marques, que pediu informações ao governador e à Assembleia Legislativa de Santa Catarina. Mesmo assim, só o fato de o caso chegar no STF foi o suficiente para gerar reações negativas de políticos. 

Um deles é o senador Jorge Seif Junior (PL). Em um vídeo publicado na rede social Facebook, ele compilou registros e estudos que apontam o perigo que o javali oferece aos produtores. “Agricultores sentem no bolso e na pele os prejuízos dessa praga descontrolada”, escreveu, destacando que o problema não é uma questão de caça, e sim de agricultura.

Por sua vez, o deputado Zé Trovão (PL) afirmou que, caso haja proibição, juntará “todos os caminhões de boiadeiro” para pegar “todos os javalis” e soltá-los na Esplanada dos Ministérios.  

É difícil precisar o número total de javalis no Brasil atualmente. Em 2023, o engenheiro agrônomo e presidente da Associação Brasileira de Caçadores - Aqui tem Javali, Rafael Augusto Salerno, afirmou à Câmara dos Deputados que havia “3 milhões deles espalhados pelo país”. Mas um dado oficial não foi divulgado pelo Ibama. 

Apesar disso, a entidade publicou por algum tempo dados sobre o abate da praga. Entre 2019 e 2021, foram 333 mil javalis abatidos. Em 2022, o número aumentou: só naquele ano foram 465 mil. Desde então, o Ibama não divulgou mais números abertos sobre a caça. 

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