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Diante da omissão de Lula, comunidade judaica reage com eventos e apoio de governadores 

O presidente Lula tem um histórico de omissões com a comunidade judaica: em 2010, se encontrou com o líder supremo do Irã, Ali Khamenei
O presidente Lula tem um histórico de omissões com a comunidade judaica: em 2010, se encontrou com o líder supremo do Irã, Ali Khamenei (Foto: Ricardo Stuckert/Presidência da República)

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A crise diplomática entre Brasil e Israel ganhou novos capítulos nas últimas semanas, após declarações duras de autoridades israelenses contra o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e a decisão do governo brasileiro de retirar o país da Aliança Internacional para a Memória do Holocausto (IHRA). A medida foi interpretada em Jerusalém como um gesto de afastamento em relação ao combate ao antissemitismo e provocou reação imediata da comunidade judaica e de lideranças políticas no Brasil.

No dia 26 de agosto, o ministro da Defesa de Israel, Israel Katz, publicou em português na rede X que Lula teria se revelado “antissemita declarado e apoiador do Hamas”. Ele associou o petista ao líder supremo do Irã, Ali Khamenei, em uma montagem feita por inteligência artificial. A postagem citava a saída brasileira da IHRA, entidade criada na década de 1990 e da qual o Brasil era membro desde 2021.

Em resposta, o Itamaraty classificou as declarações como “ofensas, inverdades e grosserias inaceitáveis”. Segundo o governo, a decisão de deixar a aliança se baseou na avaliação de que a definição de antissemitismo estaria sendo usada para restringir críticas à política de Israel. O assessor presidencial Celso Amorim chegou a afirmar que “qualquer defesa da Palestina” acabava sendo enquadrada como antissemitismo.

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Governadores presidenciáveis aderem à IHRA e apoiam comunidade 

Enquanto a Presidência sinalizava distanciamento, governadores reforçaram os laços com a comunidade judaica. Em março de 2024, Tarcísio de Freitas (Republicanos-SP) assinou a adesão do estado de São Paulo à definição da IHRA, seguido por Romeu Zema (Novo-MG), em julho, e Eduardo Leite (PSDB-RS), em janeiro deste ano.

“Em um momento em que vemos o aumento de manifestações de ódio e intolerância no mundo, precisamos ser firmes na defesa do respeito e da dignidade humana”, disse Leite na cerimônia no Palácio Piratini. Doze estados brasileiros já adotam oficialmente a definição da aliança, usada como referência internacional para identificar e prevenir manifestações antissemitas.

Segundo levantamento da Confederação Israelita do Brasil (Conib), em parceria com a Federação Israelita do Estado de São Paulo (Fisesp), as denúncias de antissemitismo no país cresceram quase 600% desde o início do conflito entre Israel e Hamas em outubro de 2023. 

StandWithUs critica política externa adotada por Lula 

A organização pró-Israel StandWithUs, presente no Brasil desde 2011, divulgou nota em que lamenta “a deterioração das relações entre Brasil e Israel”, afirmando que a postura do presidente Lula representa “uma ruptura inédita na tradição diplomática brasileira”.

A entidade destacou que, após o massacre cometido pelo Hamas em 7 de outubro de 2023, Lula recusou-se a classificar o grupo como organização terrorista, “adotando uma postura desproporcionalmente crítica a Israel, enquanto silenciava diante das ameaças do Irã, Hezbollah e Houthis”. Também relembrou a polêmica de fevereiro de 2024, quando o presidente comparou a contraofensiva israelense em Gaza às ações nazistas durante o Holocausto — fala classificada como “grave distorção histórica” e enquadrada pela IHRA como manifestação antissemita. 

Em evento realizado em São Paulo no início de agosto, voltado à imprensa, especialistas ligados à StandWithUs reforçaram que a atual política externa rompe com a tradição de equilíbrio e prejudica a comunidade judaica. O cientista político Igor Sabino afirmou que o Brasil “abandonou a posição de mediador e passou a ecoar críticas automáticas a Israel”. Já o professor Samuel Feldberg ressaltou que a saída da IHRA simboliza “um isolamento perigoso do Brasil no esforço internacional contra o antissemitismo”.

Porta-voz da IDF veio ao Brasil e escancarou guerra de narrativas 

Nesse contexto, o advogado e militar da reserva Rafael Rozenszajn, primeiro porta-voz das Forças de Defesa de Israel (IDF) em português, esteve no Brasil para lançar o livro A Guerra das Narrativas. A obra discute como manchetes fora de contexto, imagens manipuladas e discursos parciais moldam a percepção internacional sobre Israel e o Hamas, transformando a comunicação em um campo de batalha tão decisivo quanto o militar.

Com 18 anos de experiência no Exército israelense, em funções militares e jurídicas, Rozenszajn relata bastidores da chamada “guerra informacional” e alerta para o impacto da desinformação no Brasil. “O país foi o que registrou o maior crescimento proporcional de antissemitismo no mundo após os ataques de 7 de outubro”, disse em entrevista à Gazeta do Povo.

Segundo ele, a mídia brasileira frequentemente reproduz números e versões fornecidos por autoridades ligadas ao Hamas, apresentadas como se fossem independentes. “Não existe nenhum compromisso desse grupo com a verdade. Quando a imprensa baseia seus relatos nesses dados, contribui para a expansão do ódio e da intolerância”, afirmou. 

“Israel não vai ganhar a guerra midiática”, continua o porta-voz. “Nós não lutamos para isso, lutamos para minimizar os danos da guerra, porque ela não é travada só nos campos de batalha, mas também nos campos de comunicação.”

Rozenszajn caracterizou o conflito como uma guerra assimétrica e extremamente complexa. “Enquanto um Estado precisa agir dentro das normas internacionais, o Hamas, grupo terrorista, não tem compromisso algum com elas. Ele ataca civis e os usa como escudos humanos, enquanto Israel precisa proteger sua população e, ao mesmo tempo, tomar todos os cuidados com os civis na Faixa de Gaza".

Na análise dele, a legitimidade conferida ao Hamas prolonga o conflito. "Se o grupo entendesse que quem está sob pressão é ele próprio, a guerra já teria terminado há muito tempo.” A combinação de críticas internacionais, respostas diplomáticas e mobilização social mostra que a crise entre Brasil e Israel transcende a esfera oficial.

De um lado, o Planalto insiste em marcar distância de organismos multilaterais ligados à memória do Holocausto; de outro, governadores, entidades judaicas e especialistas intensificam ações para preservar vínculos históricos com Israel e combater o antissemitismo. Em meio à troca de acusações, a comunidade judaica aposta na diplomacia regional e no engajamento da sociedade civil para evitar que o afastamento político comprometa a cooperação cultural e educacional construída ao longo de décadas entre os dois países.

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