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Porto Alegre: militares empilham sacos de areia na tentativa de vedar as comportas, em 2 de maio.
Militares empilham sacos de areia na tentativa de vedar as brechas nas comportas| Foto: Divulgação/Prefeitura de Porto Alegre

O sistema antienchente de Porto Alegre (RS), construído no início da década de 1970 com o objetivo de proteger a capital gaúcha, passou pelo maior teste de eficiência durante o principal desastre climático da história do Rio Grande do Sul.

À época, as autoridades gaúchas criaram sistemas de contenção nos rios Guaíba e Gravataí, localizados na região metropolitana da capital, após duas enchentes históricas que devastaram Porto Alegre e parte do estado em 1941 e 1967. Depois de mais de 50 anos, o sistema sucumbiu às inundações das últimas semanas durante as chuvas intensas que afetaram a maioria dos municípios gaúchos.

Em 1970, quando o sistema antienchente foi implantado em Porto Alegre, o objetivo era conter o nível da água até seis metros. Mas no último dia 3, a água atingiu 4,5 metros de altura e foi suficiente para inundar a capital gaúcha.

Entre os problemas destacados por especialistas ouvidos pela Gazeta do Povo estão as brechas de até dez centímetros entre as portas e o muro, a situação de motores de comportas que foram furtados ou danificados, bombas de água que não funcionaram, além do abandono da manutenção e falta de investimentos públicos

“Este sistema foi uma grande conquista para população. Ele foi bem projetado, mas não vinha tendo a imprescindível manutenção”, avalia o engenheiro e professor do Departamento de Obras Hidráulicas da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Gino Gehling.

“O sistema de proteção está carente de manutenção e não passou por modernização ao longo de diversas gestões municipais. Após as águas baixarem, deverá ser feito um levantamento criterioso que identifique comportas ausentes ou defeituosas”, cobra Gehling.

O docente aponta três causas que potencializaram as enchentes:

  • As comportas não conseguiram impedir o contrafluxo de água para o interior do polder (área a ser protegida de inundações).  
  • Os motores implantados em quase todas as elevatórias só trabalham em seco. Quando estão a ponto de serem cobertos pela água, devem ser desligados, o que paralisa o bombeamento de água para fora do polder.
  • Nenhuma das 23 Estações de Bombeamento de Água Pluvial (EBAP) tem geração de energia própria.

Porto Alegre: comportas antienchente são acionadas manualmente

Em 2012, a prefeitura de Porto Alegre reformou as comportas da cidade, o que permitiu acionar o fechamento das comportas de maneira eletrônica. Porém nos últimos dez anos, motores foram furtados e outros pararam de funcionar. Com isso, o mecanismo voltou a ser manual, sendo necessário utilizar retroescavadeiras para empurrar ou içar as comportas.

“As comportas dispõem de sistema de fechamento automático com emprego de energia elétrica, mas cabos elétricos foram furtados. O sistema de comportas deve ser testado com periodicidade”, alerta Gehling.

Há comportas com brechas de dez centímetros com vazamentos. O Exército tentou colocar sacos de areia para evitar a passagem da água, mas não foi o suficiente.

“A estanqueidade das comportas deve ser mais eficaz. Pôr sacos de areia é insuficiente. Talvez uma forma simples de evitar infiltrações por baixo e pelas duas laterais das comportas do muro seria usar uma manta com oito metros de largura, cobriria toda a altura dos portões, e dobraria ao nível do solo, revestindo-o numa extensão de dois metros”, sugere o professor.

Outro ponto que poderia ter ajudado a reduzir os danos das enchentes são as 23 bombas de água espalhadas em Estações de Bombeamento de Água Pluvial (Ebaps) por Porto Alegre. Porém, mais da metade das bombas não funcionaram. O trabalho das bombas consiste em drenar a água de dentro da área protegida para fora das galerias, mas com o alto nível do rio e a pressão cada vez maior, ocorreu vazamentos. Isso fez com que inundassem as Ebaps, resultando no desligamento das bombas, já que parte da elétrica estava exposta na água.

Para o engenheiro, é preciso que as 23 unidades funcionem 100%. “As estações são suficientes desde que estejam plenamente em condições operacionais, ou seja, com todos os motores e bombas com a capacidade de vazão prevista.”

Gehling aponta o que deve ser feito para melhorar o sistema antienchente:  

  • Reformar as Ebaps e trocar os conjuntos de motores e bombas independentes por conjuntos motobomba submersíveis;
  • Reconstituir o sistema de fechamento automático das 14 comportas do muro da avenida Mauá;
  • Adequar todos os equipamentos eletromecânicos para que operem como previsto em projeto e estejam em plenas condições operacionais.

Prefeitura cita investimentos para prevenção de enchentes

Em nota, a prefeitura de Porto Alegre respondeu que, junto com o Departamento Municipal de Água e Esgotos (Dmae), investiu R$ 592 milhões em obras que têm relação com prevenção de cheias ou que amenizam situações de alagamentos na cidade.

Segundo a gestão municipal, no sistema da Estação de Tratamento de Água São João, religado no último dia 7 para atendimento cerca de 425 mil pessoas, o investimento foi de R$ 82,7 milhões em obras de ampliação do complexo.

"Ao mesmo tempo, R$ 35 milhões foram investidos em dragagens de arroios para evitar inundações. Outros R$ 93,4 milhões foram utilizados na ampliação e trocas de redes de água, beneficiando 50 mil pessoas", argumenta a prefeitura da capital da gaúcha.

Em 2023, ainda conforme a atual gestão, foram investidos R$ 108 milhões em obras de macrodrenagem em Porto Alegre. "O valor foi aplicado em melhoria na infraestrutura para manejo de águas pluviais, melhoria no sistema de proteção contra a cheia, manutenção do sistema de drenagem pluvial e dragagem e desassoreamento de arroios, entre outros."

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