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Soberania mineral

Menos dependência da China: a região que coloca o Brasil entre as fontes de urânio mais ricas do mundo

Descoberta de urânio reposiciona o Brasil no mapa da energia limpa e da mineração crítica.
Descoberta de urânio reposiciona o Brasil no mapa da energia limpa e da mineração crítica. (Foto: Marcelo Correia/Indústrias Nucleares do Brasil)

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Um novo levantamento do Serviço Geológico do Brasil (SGB) pode reposicionar o país na geopolítica dos minerais estratégicos. Ao identificar 39 ocorrências de fósforo, terras raras e, principalmente, e fontes de urânio em níveis muito acima da média mundial, a Bacia do Parnaíba surge como uma das fontes mais promissoras do planeta.

O potencial coloca o Brasil em posição de conseguir reduzir a dependência de fornecedores globais, como a China, que domina o mercado de elementos essenciais à transição energética. A descoberta eleva o potencial da região e reacende o debate sobre o papel brasileiro na cadeia global de energia limpa.

A Bacia do Parnaíba, que se estende por 331 mil km² entre os estados do Maranhão, Piauí e Ceará, desponta como uma nova fronteira estratégica na mineração de urânio, fósforo e elementos terras raras (ETRs). O estudo analisou formações geológicas com cerca de 400 milhões de anos.

Nessas áreas, o SGB encontrou fósforo com até 27%, elementos terras raras com teores médios de 0,4% e picos de 2,3%, além de urânio com concentrações de até 1.270 partes por milhão (ppm). As principais fontes de urânio nos Estados Unidos, Austrália e norte da África operam com teores significativamente mais baixos.

“Esse tipo de concentração em rochas fosfáticas é raro e os valores encontrados, com até 2,3% (de um tipo de fosfato), posicionam a tipologia como uma das mais enriquecidas do mundo”, afirma Valdir Silveira, diretor de Geologia e Recursos Minerais do SGB.

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Fontes de urânio podem colocar Brasil em destaque em curto espaço de tempo

O urânio está no centro das políticas energéticas globais por seu uso em usinas nucleares de baixa emissão. Os reatores das usinas rompem a ligação entre os prótons e nêutrons do átomo de urânio e, com isso, geram calor — um processo chamado fissão nuclear. É com esse calor que se produz energia elétrica.

Segundo o diretor da SGB, com reservas compatíveis às maiores do mundo, o Brasil pode ampliar sua autonomia energética, modernizar a matriz industrial e reduzir a exportação de minérios brutos. Para isso, o SGB pretende firmar parcerias com centros como o Centro de Tecnologia Mineral (Cetem) e o Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia (INCT).

“Pretendemos avançar com instituições estratégicas para avaliar o aproveitamento dessas ocorrências. Considerando a necessidade global de diversificação da matriz energética limpa, o mercado mundial de urânio ganha relevância e pode colocar o Brasil em posição de destaque em curto espaço de tempo”, avalia o diretor do SGB.

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Terras raras da Bacia do Parnaíba podem exigir processos mais simples para extração

Segundo o SGB, os valores detectados tornam a recuperação do urânio viável mesmo em cenários econômicos adversos. Pesquisadores extraíram as amostras do Piauí de rochas fosfáticas — um modelo raro, mas altamente enriquecido —, enquanto outras ocorrências de ETRs se concentram em areias monazíticas e complexos ígneos.

Testes feitos em outros países mostraram que é possível usar uma técnica simples, com ácidos, para retirar os elementos terras raras das rochas fosfóricas. Esse método, chamado lixiviação, funciona como um “banho químico”: o ácido dissolve os minerais e separa os metais que interessam. Como o processo é fácil e barato, ele ajuda a tornar a extração mais econômica e viável no Brasil.

A empresa pública Indústrias Nucleares do Brasil (INB) extrai e processa todo o urânio do país, sendo a única autorizada a realizar essa atividade. O monopólio da atividade pertence à União. Recentemente, a Lei 14.514/2022 autorizou a INB a prestar serviços para entidades nacionais e estrangeiras, públicas ou privadas, no país ou no exterior.

Terras raras concentradas em fosforitos permitem extração mais simples e barata, com uso de ácidos diluídos e técnicas de baixo custo.Terras raras concentradas em fosforitos permitem extração mais simples e barata, com uso de ácidos diluídos e técnicas de baixo custo. (Foto: Zig Koch/Agência Brasil)

Três minerais estratégicos surgiram com aquecimento global do passado

Caso os estudos mais aprofundados confirmem o potencial, a região pode alavancar a verticalização da indústria mineral no Brasil. Além da extração, o país pode avançar com o beneficiamento dos minérios.

“Ainda são resultados preliminares, mas a tríade de minerais estratégicos no mesmo contexto é um bom indicativo”, afirma Silveira. Segundo o SGB, as formações estudadas surgiram em períodos de aquecimento global do passado.

Grandes inundações marinhas e ambientes sem oxigênio geraram condições que favoreceram o acúmulo desses minerais. A análise do SGB indica que áreas vizinhas, como a porção sul da bacia — também chamada Bacia do Maranhão — podem ter a mesma composição. “E por que não dizer também na porção sul e ocidental da Bacia do Parnaíba?”, sugere o diretor do serviço de geologia.

Os minerais estratégicos da descoberta

  • Urânio: combustível para usinas nucleares, elemento-chave para transição energética e segurança energética nacional.
  • Fósforo: base da produção de fertilizantes, com grande impacto na agricultura.
  • Terras raras (ETRs): grupo de 17 elementos químicos usados em turbinas, imãs, eletrônicos e sistemas de defesa. Apesar do nome, não são escassos, mas exigem processos complexos de separação.

EUA miram terras raras brasileiras em meio à disputa global

Em meio às negociações com o Brasil sobre o tarifaço, entrou em vigor na última quarta-feira (6), os Estados Unidos demonstraram interesse em fechar acordos para aquisição de minerais estratégicos e terras raras. No dia 23 de julho, o diplomata Gabriel Escobar, da Embaixada dos EUA, reuniu-se com o Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram), em Brasília.

Escobar propôs uma missão comercial de mineradoras brasileiras aos EUA e manifestou interesse na Política Nacional de Minerais Críticos e Estratégicos, além de projetos de lei sobre o tema. A iniciativa integra o esforço norte-americano para reduzir a dependência da China, que domina mais de 90% da produção global de ímãs permanentes.

Segundo o Ministério de Minas e Energia, o Brasil possui a segunda maior reserva de terras raras do mundo, com 21 milhões de toneladas, distribuídas entre Goiás, Minas, Bahia, Amazonas, Rio de Janeiro, São Paulo e Roraima. De acordo com projeções do ministério, a demanda global por ETRs pode crescer até 10 vezes até 2050.

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