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Alargamento da praia em Itapoá (SC) vai movimentar ao menos 15 milhões de metros cúbicos de areia.
Alargamento da praia em Itapoá (SC) vai movimentar ao menos 15 milhões de metros cúbicos de areia.| Foto: Athos Leonan/Prefeitura de Itapoá/Divulgação

Cidade catarinense de 30 mil habitantes, Itapoá se prepara para realizar uma das maiores obras de alargamento de praia do mundo. A intervenção, que pode custar até R$ 400 milhões, se aproxima da realizada na costa do Mar do Norte, na Holanda. O país europeu é referência nesse tipo de obra com o que ficou conhecido como sand motor, uma mega-alimentação artificial de areia.

A obra em Itapoá deve movimentar ao menos 15 milhões de metros cúbicos (m³) de areia, volume que supera em cinco vezes o da obra de Matinhos (PR), considerada atualmente a maior do Brasil. A intervenção também desbanca Balneário Camboriú, cujo alargamento movimentou 2,2 milhões de m³ de sedimentos e se tornou famoso em todo o país. “Ninguém vai bater Itapoá. Até mundialmente vai ser um caso de destaque”, diz o coordenador da pós-graduação em Oceanografia da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Pedro de Souza Pereira.

Ele explica que poucos lugares do mundo utilizaram volumes de areia semelhantes ao da cidade catarinense. O especialista pondera, no entanto, o alto custo da obra, considerando o tamanho de Itapoá, mas vê a intervenção como “excelente oportunidade”.

Alargamento da praia venceu alternativa de desocupação em Itapoá

O oceanógrafo Ricardo Haponiuk, coordenador da Associação Brasileiro de Municípios e Meio Ambiente (Anamma), era secretário de Meio Ambiente de Itapoá na época em que o estudo de alargamento da praia foi realizado, em 2018. Ele diz que o engordamento foi a alternativa mais viável encontrada na época, em comparação, por exemplo, a desocupar toda a primeira quadra de casas próxima ao mar.

“Mas é importante levantar essa discussão: por que não fazer a conta de quanto vale a primeira quadra da praia e ver quanto custa para ser desapropriada e (analisar) quanto custa a obra (de alargamento) e a manutenção a médio prazo? No tempo imediato, pode ser mais cara (a desapropriação), mas a médio e longo prazo começa a valer a pena. É óbvio que  isso vai depender de cada município”, pondera.

Além do tamanho, a obra de alargamento da praia em Itapoá se diferencia por reaproveitar “o sedimento que seria dragado do canal de acesso aos portos da Baía de Babitonga”, explica o atual secretário de Meio Ambiente da cidade, Rafael Brito. Ou seja, o engordamento da praia será feito com a areia retirada do canal do porto de São Francisco do Sul, que passa por obra de aprofundamento, para receber navios maiores. Esse processo de reutilização de sedimentos tem aval do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), no entanto falta a Licença Ambiental de Instalação para dar o pontapé inicial nos trabalhos.

O grande desafio de Itapoá, no momento, é a execução da obra, avalia Haponiuk. O projeto está pronto há quase cinco anos, mas ainda não saiu do papel. O motivo é, principalmente, o alto custo da intervenção e, consequentemente, quem irá pagar por ela. “O que precisa é essa sinergia do poder público local e estadual junto a grandes parceiros da iniciativa privada para colocar a obra em prática”, pontua.

Processo de erosão em Itapoá foi intensificado pelo porto

A erosão, que resulta na redução da faixa de areia, é um processo natural. No entanto, em estudo realizado em Itapoá, foi identificado que o canal para acessar o porto foi o grande responsável por intensificar o processo erosivo. "O canal impede que a areia que vinha do sul, de São Francisco, chegasse aqui. Ela ficou retida, chamamos isso de armadilha”, explica Haponiuk.

A erosão está tão avançada que, em algumas áreas, não é possível caminhar pela beira da praia.

O atual secretário também cita que artigos científicos e o Estudo de Impacto Ambiental (EIA) da obra em licenciamento identificaram que as dragagens praticadas ao longo do tempo contribuíram para a erosão costeira em Itapoá.

Ele diz que é difícil quantificar a influência das dragagens no processo erosivo e ressalta: “Não foi a construção do porto que gerou impacto na erosão, mas sim as dragagens de aprofundamento e manutenção”. Por isso, o alargamento de Itapoá foi inserido no mesmo licenciamento ambiental das obras de aprofundamento do porto de São Francisco do Sul, que está em expansão e teve o melhor desempenho entre os catarinenses em 2023, movimentando 16,8 milhões de toneladas.

“Em vez de descartar o sedimento em alto mar sem dar uso, é melhor utilizá-lo na orla, mitigando os impactos ao longo dos anos e sendo um exemplo nacional. As jazidas de aproveitamento são práticas bem estabelecidas em países da Europa, Austrália e Estados Unidos da América; no Brasil, espera-se que essa prática seja mais recorrente”, diz Brito.

Porto de São Francisco do Sul passará por obra de aprofundamento do canal para receber navios maiores.
Porto de São Francisco do Sul passará por obra de aprofundamento do canal para receber navios maiores.| Gustavo Rotta/Divulgação Porto de SFS

Além da alimentação artificial da praia, o projeto prevê a recomposição das dunas e o plantio de vegetação de restinga, para restabelecer as condições para fauna e flora e prolongar a vida útil da obra. Como a erosão não para, pelo contrário, se intensifica em praias alteradas, novas intervenções precisam ser realizadas nos mesmos locais. “Os planos de aterros predizem que a obra em si duraria em torno de 10 anos, mas em cinco anos já deveria ser feita manutenção”, explica o professor Paulo Pagliosa, do Núcleo dos Estudos do Mar da UFSC.

“O custo é muito alto pensando no tempo que a obra dura”, pontua. O professor de Ecologia e Oceanografia da UFSC Paulo Horta explica, por sua vez, que “a elevação do nível do mar não vai parar, nem a intensificação das mudanças climáticas, e com isso diminui a vida útil dos projetos de engordamento”. Já Pereira pondera que “toda obra precisa de uma manutenção”.

Balneário Camboriú, por exemplo, se prepara para uma nova intervenção três anos após a finalização do engordamento da praia.

Por lá, a medida custou R$ 66,8 milhões, garantidos por meio de empréstimo do Banco do Brasil. Logo após a obra, a faixa de areia da Praia Central chegou a 180 metros, mas foi sendo reduzida com os processos de erosão, alcançando 110 metros em alguns pontos. Em média, a praia estabilizou em 70 metros.

Essa perda de sedimentos era prevista no projeto, e para evitar avanço do mar, um novo aterro será realizado, no valor de R$ 3,5 milhões. Segundo a prefeitura, a obra ainda depende do licenciamento ambiental para começar. A previsão é de que os trabalhos sejam realizados em três meses.

Santa Catarina já fez sete obras de alargamento de praia. A primeira foi realizada em 1998, em Balneário Piçarras. Desde então, a cidade passou por novas intervenções em 2008 e 2012 e se prepara para uma quarta em 2024. A nova obra custará em torno de R$ 16,5 milhões. Outras quatro obras de engordamento estão em fase inicial ou com projeto em análise e vão movimentar ao menos R$ 368,3 milhões.

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