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O encarregado de negócios da embaixada dos Estados Unidos no Brasil, Gabriel Escobar, voltou a manifestar o interesse do governo norte-americano nos minerais críticos e estratégicos do Brasil. Segundo o presidente do Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram) e ex-ministro Raul Jungmann, Escobar reafirmou o interesse dos Estados Unidos na exploração de minerais em reunião com representantes do setor privado. De acordo com Jungmann, a mesma manifestação já teria ocorrido havia cerca de três meses.
A manifestação do interesse americano em explorar minerais brasileiros ocorre em meio a tensões diplomáticas com a decisão do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, de impor uma tarifa de 50% sobre os produtos brasileiros exportados. É um cenário em que sobressai a crescente importância dos minerais críticos e estratégicos brasileiros para a economia global e a geopolítica, pois são usados na tecnologia de ponta, em chips e na transição energética.
Brasil é potencial protagonista no mercado internacional de minerais
O Brasil emerge como um potencial protagonista no mercado global de minerais essenciais, impulsionado pela descoberta de novas reservas de terras raras. A professora e pesquisadora Denise Bevilaqua, diretora do Instituto de Química da Universidade Estadual Paulista (Unesp) em Araraquara (SP), afirma que "o mundo volta os olhos para o Brasil e é importante que o país explore e assuma o lugar de um grande produtor de terras raras".
O país detém a segunda maior reserva conhecida de terras raras no planeta, com 23% das áreas conhecidas para exploração, atrás apenas da China (49%). Essa reclassificação mundial de reservas fez o Brasil chamar a atenção das grandes potências globais da tecnologia. Hoje, o Brasil produz apenas 1% do panorama mundial de terras raras.
Minerais como nióbio, lítio, grafite, cobre, cobalto e urânio, além das terras raras, são cruciais para a transição energética. Praticamente todas as grandes inovações dependem de minerais críticos, como carros elétricos e telefones celulares. A demanda por terras raras cresce em alta velocidade, passando de 240 mil toneladas em 2020 para cerca de 390 mil toneladas em 2024. A Agência Internacional de Energia estima que a demanda por esses minerais aumente cerca de sete vezes até 2040.
O pesquisador Douglas Franco, do Instituto de Química da Unesp, explica que a metodologia para a extração e o conhecimento de aplicação industrial dos minerais são dominados pela China. A falta de estruturas regulatórias claras é outro fator que dificulta investimentos, atrasando licenciamentos de projetos por anos.
Brasil quer incorporar ilha submersa do tamanho da Espanha para exploração de minerais
Além das reservas terrestres, a Elevação do Rio Grande (ERG), uma área submersa de cerca de 500 mil quilômetros quadrados no Atlântico, que já foi uma ilha tropical, apresenta formações ricas em metais como cobalto, níquel, lítio e telúrio. Carina Ulsen, vice-coordenadora do projeto da Elevação do Rio Grande no Instituto Oceanográfico (IO) da USP, informa que há indicativos de minerais na região, portadores de elementos muito requeridos na transição energética.
O Brasil busca o aval da ONU para que a região seja incorporada ao território nacional para exploração econômica, justificando que a ERG é uma extensão de sua plataforma continental. Atualmente, o foco está na pesquisa científica da área pela USP, com expedições e coleta de amostras.
Apesar do vasto potencial, Ulsen aponta que a extração mineral na Elevação do Rio Grande seria "muito complexa", e que, em terra, o processo entre pesquisa e mineração leva cerca de dez anos, sendo ainda mais longo no terreno submarino.
Brasil detém a sexta maior reserva de urânio do mundo
No setor de energia nuclear, o Brasil possui a sexta maior reserva mundial de urânio, metal cobiçado para a geração de energia limpa e descarbonização da indústria. Celso Cunha, presidente da Associação Brasileira para o Desenvolvimento de Atividades Nucleares (Abdan), ressalta que o país tem a matéria prima, o conhecimento e a capacidade de produzir o combustível nuclear.
Cunha compara o mapa das jazidas de urânio ao pré-sal do petróleo brasileiro, dada a potencialidade dos projetos para o mercado interno e exportação. "A única térmica que é efetivamente limpa é a energia nuclear [...] O ideal não é vender o urânio in natura, já que nós sabemos produzir o combustível", defende.
Minas esquecidas em estados como Paraná, Goiás, Paraíba e Ceará, associadas a outros minérios como cobre e terras raras, são foco do programa Pró-Urânio da estatal Indústrias Nucleares do Brasil (INB) para exploração em parceria com a iniciativa privada. "Na nossa visão, não faz menor sentido o governo cavar buraco porque extrair qualquer minério do solo é apenas cavar buraco. Isso é papel da iniciativa privada", ressalta Cunha. A única mina de urânio em atividade está em Caetité, na Bahia.
Os desafios para transformar o potencial brasileiro em minerais em desenvolvimento tecnológico
De acordo com Celso Cunha, o Brasil tem mais de US$ 75 bilhões em empreendimentos do setor energético parados no Ibama à espera de licenças ambientais. Para superar esses obstáculos, há esforços para transformar o potencial mineral em desenvolvimento tecnológico e industrial, com investimentos em pesquisa e atração de parcerias estratégicas. Um dos exemplos, é o início da fabricação de ímãs de terras raras em Minas Gerais.
A reciclagem de terras raras a partir de eletrônicos descartados também surge como uma rota promissora. O professor Sidney José Lima Ribeiro, do IQ-Unesp, destaca o desenvolvimento de mecanismos para tratar rejeitos de equipamentos eletrônicos, que possuem terras raras em grandes quantidades.
A pesquisadora Denise Bevilaqua também defende a importância da economia circular, afirmando que a ocorrência natural tem até 20 vezes menor teor que os resíduos industriais, tornando inteligente o reaproveitamento do que já foi extraído para voltar à cadeia de produção.
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Conteúdo editado por: Ricardo Sabbag








