Encontre matérias e conteúdos da Gazeta do Povo
Estado laico

Prefeitura do Rio revoga resolução que inclui benzedeiras no SUS

Resolução foi revogada pelo prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes, na última semana. (Foto: Tomaz Silva/Agência Brasil)

Ouça este conteúdo

A resolução que reconhecia práticas tradicionais de matriz africana como complemento ao SUS no Rio de Janeiro foi revogada pelo prefeito Eduardo Paes (PSD), na última terça-feira (25). A Prefeitura do Rio confirmou a informação à Gazeta do Povo nesta quarta (31).

VEJA TAMBÉM:

O motivo do cancelamento, segundo a prefeitura, é “o entendimento de que saúde pública é realizada baseada em ciência”. “A revogação parte do princípio de que o Estado é laico e não deve misturar crenças religiosas em políticas públicas de saúde”, acrescentou a prefeitura.

O documento que reconhecia oficialmente práticas como oferendas e a consulta com benzedeiras tinha sido publicado no Diário Oficial, no dia 19 de março, pelas secretarias de Saúde e Meio Ambiente.

A decisão não citava estudos científicos sobre a eficácia das práticas. Em vez disso, mencionava “a equidade, a integralidade e a transversalidade, e o dever de atendimento das necessidades e demandas em saúde dos povos tradicionais de matriz africana."

O documento também se respaldou em normativas do Conselho Nacional de Saúde e do Ministério da Saúde reconhecendo métodos alternativos de promoção da saúde.

Entre as práticas reconhecidas "como equipamentos promotores de saúde e cura complementares e integrativas ao SUS" estavam:

  • Banhos de ervas;
  • Defumação (incluindo o uso de incenso para a "purificação do ambiente");
  • Benzedeiras (“mulheres que utilizam água, óleos essenciais e ervas ancestrais com preces que conectam a espiritualidade e o humano”);
  • Chás;
  • Escalda pés, descrita como uma “solução com água, sal, ervas e óleos essenciais para os pés”;
  • Ebó/Sacudimento/Sakamene/Sukulu Mpemba, apresentadas como “limpezas realizadas no corpo e nos ambientes” com “velas água, defumação, ervas, alimentos, especiarias, favas pós”;
  • Bori/Amaci/Ngudia Mutue/Tá/Kudia kua Mutuê, que o documento descreve sucintamente como práticas de “oferenda de comidas/alimentos à cabeça”.

De acordo com a resolução, o programa tinha como objetivo o apoio a entidades religiosas ligadas ao candomblé e outras crenças de origem africana.

Entidades africanas criticam revogação

A Rede Nacional de Religiões Afro-Brasileiras e Saúde (Renafro) criticou a revogação da resolução e avaliou a decisão como um “ataque ao respeito”. Em nota, nas redes sociais, a entidade cobrou respeito aos “avanços nas políticas de saúde para os povos de terreiro”.

De acordo com a Renafro, a medida da prefeitura “ignora diretrizes nacionais importantes e representa uma desconsideração das práticas ancestrais, desrespeito à luta contra o racismo religioso e um retrocesso nas políticas de equidade”.

Já o fundador e coordenador do Instituto de Defesa dos Direitos das Religiões Afro-Brasileiras (Idafro), o advogado e doutor em Direito Hédio Silva Júnior declarou ao O Globo que pretende acionar a Justiça para reverter o caso, se a prefeitura não apresentar uma justificativa plausível.  Segundo ele, a entidade quer saber a base jurídica para a revogação e entender se a “motivação tem a ver com intolerância e racismo religioso”.

“Neste caso, o prefeito pode ser responsabilizado, inclusive por improbidade administrativa. Os indícios são robustos de discriminação religiosa, porque não faz sentido publicar uma resolução e, após seis dias, dizer que ela é ilegal. Isso deveria ter sido objeto de análise antes da publicação. Se, em 15 dias, o município não responder, vamos recorrer ao judiciário”, disse.

Silva classifica os argumentos apresentados pela prefeitura como inconsistentes e preconceituosos. “O prefeito não é obrigado a aprovar resolução. Mas aprovar e revogar com essas justificativas, isso já não pode”, acrescentou.

VEJA TAMBÉM:

Principais Manchetes

Receba nossas notícias NO CELULAR

WhatsappTelegram

WHATSAPP: As regras de privacidade dos grupos são definidas pelo WhatsApp. Ao entrar, seu número pode ser visto por outros integrantes do grupo.