Quedas de barreiras voltaram a bloquear a BR-101, em Palhoça (SC), neste mês. O problema na região do Morro dos Cavalos é crônico: em época de chuva, é comum ocorrerem deslizamentos e interdição da pista - e foi o que aconteceu há duas semanas. A rodovia, que liga Santa Catarina ao Rio Grande do Sul e Paraná, ficou totalmente interditada por 50 horas, e seguiu com bloqueios parciais por quatro dias. Quase 16 mil veículos de carga foram afetados apenas no período de interdição total, e os prejuízos somam ao menos R$ 48,8 milhões, segundo a Federação das Empresas de Transporte de Carga e Logística de Santa Catarina. A solução definitiva, defendem o governo estadual e a Federação das Indústrias do Estado (Fiesc), é a construção de túneis transpassando o Morro dos Cavalos, mas há impasse na realização da obra.
O túnel-duplo para a BR-101 custaria entre R$ 700 milhões e R$ 1 bilhão, de acordo com a estimativa mais recente. O projeto, realizado em 2010, prevê a travessia com extensão de 1.360 metros, viaduto duplo com 280 metros de comprimento, e obras de contenção da encosta. Dessa forma, o presidente da Câmara de Transporte e Logística da Fiesc, Egídio Martorano, acredita que não se sofreria mais com queda de barreiras e a velocidade média na região poderia ser maior.
“É um corredor importante pela movimentação turística, portuária e logística de cargas. Só que ali, devido a questões geográficas, exige velocidade média mais baixa, de 40 km/h, o que atrasa o caminhão e gasta mais combustível”, aponta o especialista.
No entanto, além do impasse financeiro, devido ao alto custo, há a questão de quem executaria a construção do túnel na BR-101. A região é de concessão da Arteris Litoral Sul, cujo contrato termina em 2033. A empresa não prevê obras na região, nem mesmo o governo federal. Para Martorano, “não há tempo hábil para (a Arteris) absorver um impacto desse sem que ocorra aumento de pedágio”.
Em nota encaminhada à Gazeta do Povo, o Ministério dos Transportes confirmou. “Não há previsão, por ora, de construção de túnel ou quarta faixa no Morro dos Cavalos, localizado na BR-101/SC, em Palhoça (SC)”. Já a concessionária acrescentou que “realiza periodicamente serviços de manutenção e conservação em todo o trecho. A Arteris permanece dialogando com o Poder Concedente sobre as melhores soluções viárias para as rodovias que administra em cinco estados brasileiros, o que inclui a BR-101/SC”.
Uma opção seria a extensão da concessão em mais 15 anos, o que poderia permitir a execução da obra. A alternativa está em análise pela Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) e pelo Tribunal de Contas da União (TCU), diz Martorano. Em visita a Santa Catarina no último dia 18, o ministro dos Transportes, Renan Filho, cogitou outra opção: um novo leilão na Bolsa de Valores (B3) em que a empresa que oferecer menor preço de pedágio poderia assumir as obras.
Em Brasília, o Fórum Parlamentar Catarinense, coordenado pelo deputado federal Valdir Cobalchini (MDB), tem pressionado instâncias federais por soluções. Na última quarta-feira (24), o grupo se reuniu com o ministro dos Transportes, Renan Filho; o diretor-geral do Dnit, Fabrício Galvão; e o diretor-geral da ANTT, Rafael Vitale.
Renan Filho prometeu encaminhar, em 90 dias, levantamento de todas as obras a serem realizadas em Santa Catarina e o impacto orçamentário delas. Após esse levantamento, serão definidas as obras prioritárias da pasta. “Estamos reunindo especialistas para trabalhar em conjunto em prol do nosso estado. Estou otimista após essa definição de prazo e o compromisso do ministro de priorizar o Morro dos Cavalos, na BR-101”, diz Cobalchini.
Por que ocorrem tantos deslizamentos de terra?
A região que sofreu bloqueios, entre os km 232 e 239, é composta por áreas de encosta, que sofreram intervenção humana devido à construção da estrada e, por causa disso, perderam parte da sustentação. Com o excesso de chuva - em dois dias foram registrados 500 milímetros, volume quatro vezes maior do que o esperado para todo o mês de abril, de acordo com a Defesa Civil -, parte da água não foi absorvida pelo solo e provocou deslizamentos.
“A elevação que compõe o morro é composta de rocha e na sua parte superior tem o solo que absorve água. Mas esse solo tem capacidade limitada de absorver a água. Se ele fica saturado, uma parte da água é escoada na superfície e a outra, em excesso, acaba descendo abaixo das camadas de solo e forma uma película, como no asfalto que, quando chove muito, o carro aquaplana. A água, nesse caso, funciona como um lubrificante, além de aumentar o peso da camada do solo. Em paralelo, a base dele está lubrificada. Tudo isso facilita que aconteça o que aconteceu”, explica Edes Marcondes do Nascimento, geólogo e presidente da Associação Profissional de Geólogos de Santa Catarina.
Ele defende a realização de estudos prévios na região para mapear onde há riscos de deslizamento e, a partir disso, a adoção de medidas preventivas. Martorano também defende a realização desse levantamento porque “os eventos climáticos estão sendo cada vez mais severos”. Ele fala da necessidade de identificação de rotas alternativas aos trajetos com risco de deslizamento e que esses caminhos recebam melhorias, para que se tornem, de fato, opções de trânsito.
No caso do bloqueio no Morro dos Cavalos, foi realizado um desvio pela SC-435, em São Bonifácio, e SC-108, em Anitápolis. No entanto, muitos motoristas reclamaram da qualidade das vias. A prefeita de Anitápolis, Solange Back chegou a fazer um apelo ao governador Jorginho Mello (PL) pelo asfaltamento da via. “Pedimos encarecidamente, nossa SC-108 é prioridade sim, hoje mais do que nunca mostrou a necessidade e importância da SC-108 ser pavimentada”. O vídeo publicado pela chefe do Executivo municipal mostra engarrafamento nos dois sentidos da via.
A Arteris, por sua vez, afirma que, “como medida preventiva, a empresa mantém em operação um programa permanente de monitoramento de encostas dentro de sua faixa de domínio, que contempla 1.947 estruturas inspecionadas anualmente ao longo de suas rodovias por empresa certificada. Esse trabalho está previsto em contrato e é realizado desde o início da concessão, sendo que, somente nos últimos anos, a concessionária realizou 29 obras e serviços de manutenção de encostas”.
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