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Festival de Paulínia

A favela, agora por eles mesmos

Exibido pela primeira vez em Cannes, o longa-metragem 5x Favela, Agora por Nós Mesmos, é um dos destaques da mostra competitiva de longas do festival

“Acende a Luz”, de Luciana Bezerra, um dos cinco episódios de 5x Favela, Agora por Nós Mesmos: produção narra o cotidiano dos morros sob o ponto de vista dos moradores de comunidades do Rio de Janeiro | Divulgação
“Acende a Luz”, de Luciana Bezerra, um dos cinco episódios de 5x Favela, Agora por Nós Mesmos: produção narra o cotidiano dos morros sob o ponto de vista dos moradores de comunidades do Rio de Janeiro (Foto: Divulgação)
Idealizado por Cacá Diegues, o filme será lançado no circuito comercial no dia 27 de agosto |

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Idealizado por Cacá Diegues, o filme será lançado no circuito comercial no dia 27 de agosto

Paulínia, SP - "Cinema também é diversão. E pobre ri para caramba, não só chora", diz Manaíra Carneiro, uma dentre os sete diretores do longa-metragem 5x Favela, Agora por Nós Mesmos. O público que lotou o Theatro Municipal de Paulínia no último sábado (17) também riu para valer com (quase) todos os cinco episódios que compõem a nova versão do filme, que em 1961 lançou os cineastas Cacá Diegues, Leon Hirsz­man, Joaquim Pedro de Andrade, Miguel Borges e Marcos Farias e é um dos marcos inaugurais do Cinema Novo.

O sucesso da exibição em Paulínia repete o que se viu no 63.º Festival de Cannes, em maio, onde o filme foi apresentado em sessão especial e foi ovacionado em pé por vários minutos. "O festival nos deu a celebração internacional e o selo de qualidade que merecemos", conta a produtora Renata de Almeida Maga­lhães durante debate com os jornalistas, na manhã do último do­­min­­go, que teve a participação emocionada de todos os diretores e boa parte do elenco.

O idealizador da produção, o cineasta Cacá Diegues, um dos diretores do filme de 1961, apresentou o longa-metragem ao público de Paulínia, às vésperas de viajar para Nova York para ser homenageado com uma mostra no Museu de Arte Moderna (MoMA). "Posso dizer sem falsa modéstia que tenho orgulho desse projeto, já que nenhuma das imagens que vocês vão ver têm minha mão. Ele foi realizado por grandes cineastas moradores de comunidades do Rio de Janeiro e acredito que será uma grande contribuição ao cinema brasileiro nesse mo­­mento".

Os diretores – Manaíra Car­­neiro, Wagner Novais, Rodrigo Felha, Cacau Amaral, Luciano Vidigal, Cadu Barcelos e Luciana Bezerra – foram escolhidos por Diegues e Renata, produtores do filme, pelos filmes que já traziam na bagagem. "São pessoas muito talentosas. Nossa proposta foi lhes dar as condições ideais para criar com total liberdade", conta a produtora. E, assim, "tirá-los do gueto e fazê-los ganhar as plateias do Brasil e do mundo". O que certamente será facilitado pela distribuição do filme, previsto para estrear no circuito comercial em 27 de agosto, pela Sony e a Riofilme, em parceria com a Globofilmes.

Ao contrário do primeiro filme, em que universitários subiram o morro para filmar, desta vez, o olhar sobre o cotidiano da favela é o dos próprios moradores – além dos diretores, quase todos os integrantes da equipe vêm das comunidades pobres cariocas. Antes de dar início à produção, Diegues realizou uma oficina preparatória de oito semanas com 300 participantes e, dali, saíram 90 pessoas para formar a equipe e 40 para o elenco.

Cinco episódios, um só filme

Os diretores lançaram um olhar muito pessoal sobre a favela que se distancia, pelos finais esperançosos, daquele representado em filmes como Cidade de Deus e Tropa de Elite. Há muito humor na maior parte dos episódios – à exceção de "Concerto para Violino", de Luciano Vidigal, que choca a plateia pela carga de violência ao narrar a história de três amigos que seguem caminhos diferentes, mas voltam a se encontrar em um desfecho trágico, e que não deixa de apontar para a esperança.

"Todo mundo quer que a gente fale mal de Cidade de Deus. Eu gosto muito do filme, mas tratamos de outras temáticas em nossa produção como a solidariedade, a solidão, a esperança, a ética e co­­mo as pessoas lidam com as situações-limite dessa realidade da favela", diz Manaíra. Ela dirige com Wagner Novaes o episódio que abre o filme, "Fonte de Ren­­da", sobre um garoto que se en­­volve com o tráfico diante da dificuldade enfrentada para frequentar o curso de Direito.

Única dupla entre os diretores, Rodrigo Felha e Cacau Amaral retratam, em "Arroz com Feijão", as aventuras de um menino que, como um Pequeno Nicolau brasileiro, sai em busca de R$ 5 para comprar um frango para o pai, depois de ouvi-lo dizer que está cansado de comer só arroz e feijão. Ao roubar uma galinha do velho vendedor português, interpretado por um aterrorizante Ruy Guerra, ele vive um dilema ético que se resolve com graça. "Se, em filmes como Tropa de Elite, o protagonista que vive na favela é violento, levado pelo caos social, no nosso, ele toma as rédeas da própria realidade", diz Felha.

É assim também em "Deixa Voar", de Cadu Barcellos, em que um menino se arrisca para recuperar uma pipa na comunidade onde vive uma facção de tráfico rival. No final, o espectador imagina qual será o destino daquele personagem corajoso, mas obrigado a conviver diariamente com tantas ameaças. O filme se encerra com o tom hilário e celebrativo do episódio "Acende a Luz", de Luciana Bezerra, no qual um funcionário da companhia de energia (o ator Márcio Vito) não consegue reverter a falta de luz no morro e é retido ali, em pleno Dia de Natal, por alguns habitantes enfurecidos.

Curta

A noite de sábado passado em Paulínia teve a exibição de outro filme brasileiro presente no Festival de Cannes. Foi o curta Estação, da estreante paulista Márcia Faria. A atriz Caroline Abras "morou" três dias no Terminal Rodoviário Tietê, em São Paulo, antes de viver diante das câmeras esta história real de uma garota que, sonhando em ser atriz, vai trabalhar em São Paulo como figurante de uma novela e, sem nenhum dinheiro, dorme nos bancos da rodoviária. Ali, usa o armário como guarda-roupa, se higieniza com lencinhos umedecidos e convive com pessoas na mesma situação dela.

Destaca-se a ótima atuação de Caroline, que já atuou em novelas da Rede Globo como Paraíso e Tempos Modernos e chamou atenção no cinema como a andrógina Mar­­cin, que se envolve com os personagens de Cauã Rey­­mond e João Miguel, no filme Se Nada Mais Der Certo (2008), de José Eduardo Belmonte.

A repórter viajou a convite do Paulínia Festival de Cinema

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