
A Bahia, certamente, é um dos grandes berçários da vanguarda artística brasileira. Com escritores que vão de Castro Alves a Jorge Amado e João Ubaldo Ribeiro, cineastas da magnitude de Glauber Rocha e músicos revolucionários como João Gilberto, Caetano Veloso, Gilberto Gil, Raul Seixas e Tom Zé, não parece difícil que saia de Salvador uma banda de rock tão original e inusitada quanto a Vendo 147.
Uma possível definição para o quinteto seria "rock experimental e instrumental", mas qualquer definição, essencialmente limitadora, deixaria de fora o espetáculo que reside na formação da banda e na execução das músicas. O que chama mais atenção, de cara, é a presença de dois bateristas tocando em uma bateria só. O chamado clone drum tem sua origem, possivelmente, na banda suíça Monsters, e consiste basicamente em dois sets de bateria montados em lados opostos de um mesmo bumbo.
"Eu tinha visto um show do Monsters em Curitiba e fiquei impactado por aquilo, também queria ter uma banda assim", conta um dos bateristas, Demétrio da Silva, mais conhecido como Dimmy, o Demolidor. A partir daí, levou a ideia para o outro responsável pelas baquetas, Glauco Neves, que já havia montado, desde 2005, o projeto Vendo 147. Na época, a formação fazia pouco mais de um show por ano e limitava-se a composições simples do chamado stoner rock. A ideia para o nome da banda, aliás, não poderia ser mais simples. "Estava procurando um nome, e pedi uma sugestão para um amigo meu, que estava vendendo um Fiat 147. Ele sugeriu esse nome e é isso", diz Neves.
Godofredo
Carro vendido, banda devidamente batizada e com o formato de clone drum definido, a Vendo 147 começou os trabalhos em 2009, completando sua formação com os guitarristas Pedro Itan e Duardo Costa e o baixista Caio Parish. Com as influências de cada um engrossando a base da mistura fornecida por Neves, gravaram seu primeiro EP, que traz na capa uma arte intrigante assinada pelo guitarrista Duardo Costa e o misterioso título de Godofredo. "As músicas que a gente compôs têm uma força imagética muito grande, e eu elaborei a arte baseado nisso", conta Costa, que trabalha como designer. Ele explica que a progressão do álbum, que passa de uma sonoridade enérgica para uma calmaria a partir das últimas músicas com o marco divisor na música "Godofredo" é simbolizada pelas cores vermelho e azul, exploradas no interior do disco, que, embora seja gravado em CD, tem na embalagem um formato de vinil compacto.
O nome Godofredo já é um pouco mais difícil de ser decifrado. Como o nome da banda, é completamente casual: depois de uma noitada pós-show em que amanheceram em frente ao colégio Godofredo Furtado, em São Paulo, o título começou a ser aventado pelos integrantes. "Para cada um, o nome Godofredo tem um significado diferente", conta Neves, e explica que, para ele, pode ser visto como uma corruptela de "God of Freedom", o Deus da liberdade que zela pela métrica quebrada, falta de refrão e timbres ilimitados enfim, pela música que é livre de qualquer outro rótulo menos abrangente do que "rock".
Baianidade Nagô
Dimmy, o Demolidor conta que a musicalidade baiana ajudou a banda a desenvolver melhor o conceito de clone drum, importado da Europa e adaptado para o rock nacional. "No início a gente fazia muito espelho na bateria, repetia o que o outro faz. Mas a gente foi pesquisando mais, a música percussiva da Bahia é muito rica. A Timbalada tem 15 percussionistas e cada um faz uma coisa. Nós somos dois bateristas só, é mais fácil dividir o trabalho", brinca o baterista, e completa: "a bateria foi confeccionada para que os tons e as caixas tenham afinações diferentes, e hoje compomos as batidas como as guitarras dividem o trabalho: enquanto uma faz a base, outra faz um fraseado de solo. Mas tudo veio da pesquisa que a gente fez em cima da cultura baiana. Dizem que a Bahia ferve e eu, que sou carioca, assino embaixo".
Serviço:
Godofredo, Vendo 147. Fora do Eixo Discos e Big Bross Records. Preço Médio: R$ 15.




