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 | Hugo Harada / Gazeta do Povo
| Foto: Hugo Harada / Gazeta do Povo

Opinião

Por um espaço melhor

Roberta Storelli, presidente da Fundação Cultural de Curitiba

O projeto de concessão da Pedreira Paulo Leminski, que engloba também a Ópera de Arame e o Parque Náutico, tem um grande objetivo: dar a esses espaços a sustentabilidade financeira que lhes permita oferecer aos curitibanos um local confortável, bem-estruturado, com uma programação cultural e esportiva atraente.

Nos últimos anos, Pedreira e Ópera têm ficado de fora do calendário principal de eventos artísticos do país. A Pedreira, face à necessidade de um ajuste de regras e obras, e a Ópera pelas dificuldades técnicas do espaço e também necessidade de reformas. Somente em manutenção, a Pedreira e a Ópera custam R$ 600 mil por ano.

O município tem buscado a parceria com a iniciativa privada para resolver estas situações e economizar os recursos públicos, que podem ser investidos em outras áreas. Há oito anos, o Jardim Botânico tem a sua manutenção feita pela iniciativa privada. Isso representa uma economia de R$ 690 mil anuais para a prefeitura. A manutenção do parque é, desde 2008, responsabilidade de O Boticário. Antes disso, a parceria era com a Natura.

O Parque Barigui passa por uma grande renovação, com a construção de um novo e moderno Centro de Eventos. O modelo de concessão é muito similar ao da Pedreira. O concessionário constrói o novo Centro de Eventos e ainda executa obras importantes para os frequentadores do parque, como a galeria subterrânea para pedestres na avenida Cândido Hartmann e uma nova pista de corridas e caminhadas. O município ainda tem direito a uma participação financeira na receita dos eventos promovidos, exatamente como vai ocorrer na Pedreira, na Ópera e no Parque Náutico.

Com a concessão, a Pedreira receberá R$ 5 milhões em investimentos, para obras como reforma de instalações elétricas, sanitários, palco, pista e camarins. As obras também atendem ao acordo feito na justiça para a reabertura da Pedreira. Na Ópera de Arame, o concessionário terá de investir R$ 10 milhões em obras de reforma em praticamente todo o teatro.

A concessão vai resultar em recursos adicionais para serem investidos na cultura em Curitiba. Os R$ 150 mil que serão recebidos com a outorga mínima da concessão serão investidos pela Fundação Cultural em obras no Centro de Criatividade do Parque São Lourenço. O edital determina que do total da receita bruta arrecadada nos eventos de caráter privado nos espaços no mínimo 4% serão destinados ao município.

O mais importante de tudo é que a Pedreira e a Ópera continuarão pertencendo aos curitibanos: é uma concessão temporária, não é privatização. A visita aos espaços continuará sendo gratuita e o município poderá fazer eventos nos locais sem custo, mantendo assim a oportunidade às produções locais, ação que a Fundação Cultural sempre promoveu.

Assim como não é novidade em Curitiba, a gestão por concessão à iniciativa privada é amplamente usada em todo o Brasil. O maior e mais recente exemplo é a concessão feita pelo governo federal dos aeroportos de Guarulhos, Brasília e Viracopos, em Campinas.

São todos exemplos da participação positiva da sociedade nas questões públicas e de que não se pode excluir a sociedade das boas soluções para a cidade.

  • 1993 - O primeiro grande show em comemoração aos 300 anos de Curitiba aconteceu no dia 4 de abril, quando o tenor catalão José Carreras se apresentou na Pedreira Paulo Leminski com a Orquestra Sinfônica Brasileira.
  • 1993 - Em agosto do mesmo ano, 35 mil pessoas lotaram a Pedreira no Festival 30 em 300, que reuniu três bandas ícones do rock nacional: Titãs, Barão Vermelho e Os Paralamas do Sucesso
  • 1993 - O ano em que a capital paranaense completou 300 anos foi o mais fértil em grandes shows na cidade. No dia 5 de dezembro, o ex-Beatle Paul McCartney esteve pela primeira – e única – vez em Curitiba, e fez um show histórico na Pedreira
  • 1994 - Uma noite inesquecível para qualquer roqueiro marcou aquele mês de novembro: Ramones, Sepultura, Raimundos e Viper, 30 mil fãs alucinados e uma tempestade com direito a trovões e raios atrás do palco
  • 1996 - Em outubro de 1996, a Pedreira Paulo Leminski foi palco da superprodução do AC/DC. Trinta mil pessoas foram ver de perto Angus Young, Brian Johnson e os canhões fumegantes da banda australiana
  • 1997 - O festival Close Up Planet, em outubro daquele ano, trouxe outra lenda do rock a Curitiba: o camaleão David Bowie, que se apresentou depois de Rita Lee, Erasure e No Doubt
  • 2004 - O dia 8 de maio de 2004 também foi histórico: a Pedreira recebeu a única data latino-americana da turnê de reunião da cultuada banda norte-americana The Pixies, no Curitiba Pop Festival
  • 2007 - O último grande festival a passar pela Pedreira Paulo Leminski foi o Tim Festival, com artistas de primeira linha: Hot Chip, Arctic Monkeys, The Killers e Björk
  • 2008 - No dia 4 de março de 2008, o Iron Maiden finalmente se apresentou em Curitiba com Bruce Dickinson nos vocais. O show teve cenas incluídas em um documentário da banda

Desde que surgiram, a Pedreira Paulo Leminski e a Ópera de Arame serviram para ajudar a autoestima do curitibano. Transformaram-se em símbolo de criatividade da cidade que sabia se antecipar aos eventos e transformar o adverso em oportuno. O então prefeito Jaime Lerner – critique-se tudo, menos a sua criatividade – olhou para aquele enorme buraco no chão e viu nele uma casa de ópera, um local de eventos que Curitiba ainda não tinha e que viria a se tornar um exemplo para o Brasil.

Por 18 anos seguidos, por ali passaram tenores, roqueiros, pagodeiros, religiosos, encenadores, artistas de circo, muitos músicos bons e muitos músicos ruins. Fosse quem estivesse sobre o palco, o orgulho curitibano era um frequentador assíduo.

No entanto, nos 18 anos seguidos, a cidade mudou muito e o espaço teve pouca transformação. Os vizinhos se multiplicaram e os produtores e organizadores de eventos ficaram mais gananciosos. A prefeitura não mais se antecipou aos eventos e houve uma lenta degradação tanto física quanto espiritual – a política cultural esmoreceu, a fiscalização foi fraca, não houve comprometimento com regras de bom convívio, deixando tudo nas mãos dos produtores do momento.

A prefeitura passou a ser uma proprietária desleixada que alugava seus pontos com a preocupação principal de cobrar o aluguel. Ou seja, deixou de ser responsável, deixou de cuidar do local com o carinho que necessitaria esse espaço importante para uma política cultural – caso ela existisse.

Descaso

Houve tentativas de revitalização na gestão de Paulino Viapiana à frente da Fundação Cultural de Curitiba, com reformas na Ópera de Arame. Mas, no geral, o descaso dos prefeitos para com a cultura se refletia na pouca verba, que, por sua vez, se refletia no abandono e na ausência de projetos que englobassem a Pedreira e a Ópera como fundamentais para a cidade.

Então, em uma ação do Ministério Público, que alegou desrespeito ao direito ao descanso e ao sossego dos vizinhos, a Pedreira Paulo Leminski foi fechada, em 2008. Faltou uma negociação mais responsável e adulta, que certamente haveria se o local de eventos estivesse inserido em uma efetiva política cultural municipal. Aos poucos, o que era motivo de orgulho foi voltando quase ao que era antes, ou seja, um grande buraco no chão.

Depois de uma longa luta da sociedade civil, fez-se um acordo na Justiça que permite a reabertura, desde que se cumpram as exigências de adaptações e reformas. Quando se esperava que o prefeito de plantão poderia novamente olhar para a Pedreira e ter uma ideia criativa, o único pensamento que parece ter lhe ocorrido foi se livrar daquele "pepino", aquele buraco no chão.

É triste constatar que Curitiba não é mais criativa, que não sabe como cuidar e o que fazer com um espaço cultural da dimensão da Pedreira Paulo Leminski e da Ópera de Arame. Os nossos governantes olham para esses símbolos da cidade e veem apenas um imóvel parado, que pode render algum dinheiro.

Concessão

O edital de concessão fala apenas em reformas e dinheiro. O prefeito Luciano Ducci não se pronuncia. A presidente da Fundação Cultural de Curitiba, Roberta Storelli, quando fala sobre o assunto, fala apenas em reformas e dinheiro, em quanto será economizado com a manutenção desses espaços e quanto poderá ser ganho futuramente com a concessão. Nada foi falado sobre política cultural, sobre a importância dos espaços para a cidade. E 25 anos de concessão, cá para nós, é tempo demais sem garantias – e é claro que não falo de garantias monetárias.

A parceria com a iniciativa privada é mais do que aconselhável, é necessária e inevitável. Mas ela deve obedecer a algum tipo de orientação cultural, ter algum objetivo que seja mais do que apenas ganhar um dinheiro alugando um imóvel que estava parado.

Cadê a criatividade que orgulhava os curitibanos e que deveria ser uma das condições essenciais para os dirigentes de uma cidade como a nossa? Fomos derrotados pela burrocracia? Voltamos a ser apenas um enorme buraco no chão?

Melhores momentos da Pedreira Paulo Leminski

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