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Tevê

Amor e traição em versos

Com a comédia Decamerão, Jorge Furtado vai às raízes da dramaturgia, com personagens arquetípicos e diálogos em verso

Lázaro Ramos e Edimilson Barros: as filmagens aconteceram no cenário montanhoso, com riachos e cachoeiras, da serra gaúcha |
Lázaro Ramos e Edimilson Barros: as filmagens aconteceram no cenário montanhoso, com riachos e cachoeiras, da serra gaúcha (Foto: )
Débora Secco: apaixonada pelo padre |

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Débora Secco: apaixonada pelo padre

Um tanto da boa acolhida dada ao especial Comer, Amar e Morrer, que a RPC TV exibiu no dia 2 de janeiro, vinha da identificação à primeira vista com os personagens, velhos conhecidos do espectador desde os tempos da commedia del’ arte, de Shakespeare, Molière ou Voltaire. Afinal, o roteirista Jorge Furtado (Meu Tio Matou um Cara) foi buscar nos primórdios da dramaturgia escrita – a que primeiro registrou a tradição oral anterior – seus personagens arquetípicos. Garantido o sucesso do programa piloto (com 29 pontos de audiência), a história retorna à telinha na próxima sexta-feira (31), após o Globo Repórter, como a microssérie Decamerão – A Comédia do Sexo.

O burguês traído ficou nas mãos de Matheus Nachtergaele. A mulher fogosa caiu no colo de Debora Secco. O falso padre que vira seu amante ficou com Lázaro Ramos. Tendo ainda Drica Mo­­raes, Leandra Leal e Daniel Oli­veira no elenco, estava completo o quadro de personagens empáticos entregues a atores igualmente carismáticos. Se faltava apenas um bom texto a ser dito, disso cuidou Furtado, um dos mais respeitados roteiristas do cinema brasileiro.

A série foi filmada na serra gaúcha – um cenário de montanhas, riachos e cachoeiras que foi melhor aproveitado desta vez em externas do que no piloto.

Quatro episódios

Furtado se inspirou nos contos populares do italiano Giovanni Bocaccio para as tramas de amor e traição; e escreveu quatro episódios em versos – uma radicalização pouco vista na tevê, em programas como Morte e Vida Severina.

Romper com a prosa significava, sobretudo, romper de imediato com o realismo – já que ninguém conversa em versos na vida real. Sua preocupação era que os diálogos soassem naturais. No episódio do início do ano, sentiu ainda algumas arestas a aparar na linguagem, para não parecer que uma palavra era dita só por rimar. "Agora está mais fluida na boca dos atores", diz o escritor gaúcho, que já havia traduzido alguns sonetos de Shakespeare e se de­­clara leitor de poesia.

A fala rimada e metrificada impunha também um novo desafio aos atores: contar uma história e cantá-la ao mesmo tempo. "É um texto imutável que não pode ter nenhum caco, nem um ‘ui’, senão vão ter de improvisar em verso e rimar com ‘fui’. No primeiro momento é meio assustador, depois dá uma liberdade total. O texto está resolvido, aos atores resta o como dizer, e eles inventam um milhão de coisas", diz.

O roteirista divide com Guel Arraes, Carlos Gerbase e Adriana Falcão a confecção dos episódios, assina o texto final e a direção. "Nunca trabalhei com preparador de elenco, sempre dirigi os atores", diz.

Como se sente mais roteirista do que diretor, prefere se cercar daqueles em quem deposita confiança. Lázaro Ramos, Débora Secco e Leandra Leal foram, antes, astros de seus filmes. Por serem também estrelas televisivas, fica difícil reunir um elenco como esse a qualquer hora – um entrave para que a série se estenda. Outro é a trabalheira que os roteiros dão.

Cinema

O diretor de Saneamento Básico diz que, se filmasse Decamerão para o cinema, provavelmente não mudaria nada. "A única diferença é que a imagem é menos im­­portante na tevê do que no cinema", diz, convencido de ser o público televisivo o mais desatento de todos. Na feitura do roteiro, contudo, sente uma mu­­dança maior. "Na tevê é importante começar muito forte dramaticamente. No cinema, você tende a guardar certas coisas para o final".

Atualmente, Furtado trabalha no segundo tratamento de Trabalhos de Amor Perdidos, roteiro adaptado de um romance seu que leva o mesmo nome, por sua vez, inspirado na obra homônima de Shakespeare. Fernando Meirelles deve dirigi-lo no próximo ano. Também aguarda para filmar um longa-metragem sobre um fotógrafo que vem ao Brasil em busca de modelos iniciantes – o projeto se chama Beleza.

Embora se diga por aí que o cinema brasileiro vive um bom momento, o gaúcho não concorda plenamente. "Tenho dúvidas", diz.

Se levar em conta o crescimento vertiginoso do público nos últimos 15 anos, sim. Mas ele identifica apenas dois tipos de comportamento para filmes nacionais nas bilheterias: aqueles que ultrapassam a barreira do 1 milhão de espectadores e os que não passam dos 20 mil.

"O que realmente falta é o cinema de 100 a 500 mil espectadores. Essa faixa é um deserto", observa. Menos desértica porque há os cineastas como ele. O Homem que Copiava levou 600 mil pessoas às salas de projeção. Saneamento Básico, 300 mil. Números que o deixam satisfeito. Mesmo que não se comparem com o público que uma série como Decamerão deve alcançar.

* * *

Serviço

Decamerão estreia dia 31, na RPC TV, após o Globo Repórter.

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