
Quando foi criado, no fim de 2000, o Ateliê de Criação Teatral (ACT) era um projeto comum de Nena Inoue, Luis Melo e Fernando Marés, que pretendiam instalar no terreno na Rua Paulo Graeser Sobrinho um centro de pesquisa em teatro aos moldes do que Melo havia experimentado em seu trabalho com Antunes Filho, no CPT.
Marés seguiu outro rumo ao mudar-se para Florianópolis. Os outros dois sócios levaram adiante a intenção inicial e, hoje, passados oito anos, avaliam positivamente a influência que tiveram sobre a cena curitibana, na qual o interesse pela pesquisa teatral germinou em muitos casos, pelas mãos de artistas cuja trajetória passou pelo ACT.
Este agora é um ciclo encerrado, que dá lugar a novos rumos para o ateliê, de acordo com os caminhos distintos seguidos por cada um dos seus sócios. Melo investe seu tempo e dinheiro em um novo sonho, a construção do Campo das Artes em São Luís do Purunã, que é para ele uma continuação transformada e ampliada do ACT. Enquanto isso, Nena se envolve com o teatro político na companhia Cambutadefedapata e batalha para obter recursos que permitam manter em funcionamento a sede no bairro São Francisco.
Portões fechados?
Há alguns meses a coordenadora alerta para as ameaças de fechamento que rondam os portões, como incontornável conseqüência de dois anos com as contas no vermelho. "No mês passado, eu estava entregando realmente", diz. A decisão foi adiada ao conquistar uma vaga no edital de pesquisa de linguagem teatral do Fundo Municipal da Fundação Cultural de Curitiba (FCC), que repassaria R$ 80 mil para custear as atividades de investigação de linguagem da casa. Os novos planos logo incluíram a realização de uma programação voltada à discussão da ditadura, batizada como Projeto 70, que chegou a ser agendada para o próximo fim de semana.
Sofreram, no entanto, um revés com a suspensão do edital, devido a um recurso interposto contra o resultado, que havia contemplado, além do ACT, o grupo Antropofocus e a Companhia do Abração. A origem e o conteúdo do recurso são mantidos em sigilo (garantido na legislação), mas a assessoria da FCC prevê que a solução sairá até início de dezembro.
Independentemente do edital, é certo que o espaço do ACT em Curitiba encolherá. Parte do imóvel alugado deve ser devolvida ao locatário, segundo Nena, como uma medida de redução de custos. A sala multiuso, instalada à direita de quem entra, servirá ainda uma derradeira vez, nos dias 12, 13 e 14 de dezembro, ao bazar de objetos artísticos organizado por Luis Melo, para então ser desativada.
Caso o resultado a favor do ateliê se confirme, fica garantida sua sobrevida por mais quatro meses. "Quando saiu o edital, teríamos fôlego até março. Agora, voltamos a não saber em que pé estão as coisas. Sem esse edital, o ACT fecha", diz Nena.
A coordenadora reconhece que há outras fontes possíveis de apoio financeiro para a manutenção de companhias ou pontos de cultura, como a Petrobras (que sustenta o Grupo Galpão, de Minas Gerais, e a curitibana Companhia Brasileira de Teatro, de Márcio Abreu e Giovana Soar), mas não estão ao seu alcance no momento. O ACT concorreu ao incentivo da estatal, mas não foi contemplado.
A Lei Rouanet seria uma alternativa, não fossem notórias as dificuldades que apresenta a produtores e artistas paranaenses, como, por exemplo, encontrar empresas dispostas a repassar seus impostos na etapa da captação de recursos. Resta a opção do edital dos Pontos de Cultura em Curitiba, que será lançado pela FCC, e no qual Nena pretende inscrever-se.
Mudança para o campo
Luis Melo vê as coisas de outro modo. Entende que o crescimento artístico é continuado e cíclico e, por isso, da mesma maneira que se encerrou seu ciclo sob as asas de Antunes, também chegou um novo momento para o Ateliê de Criação Teatral.
"O ACT não é uma estrutura, é o que gerou disso. As coisas foram se transformando nesses quase oito anos, e tanto o ACT Bazar quanto os projetos culturais foram precisando de mais espaço. Hoje em dia, com quase 15 companhias relacionadas, a estrutura física ficou pequena. O Bazar, no ano que vem, vai para o Campo das Artes", diz. "É uma incoerência dizer que o ACT está fechando, se eu estou abrindo".
A abertura do Campo das Artes, um amplo complexo com teatro, galpão, alojamentos, área de convivência e camping, em diálogo com a comunidade, ainda não tem data marcada, mas Melo adianta que a residência artística localizada a 40 quilômetros de Curitiba estará em atividade em 2009.
"É o teu movimento pessoal que faz com que essas coisas aconteçam. Sempre sonhei em ter um lugar para receber as pessoas, como foi o ACT. Essa é uma evolução natural. Por isso, não vejo essa passagem como um desligamento. Para mim, é uma conseqüência."
A construção é paga pelo salário que recebe como ator da Rede Globo. Melo foi atraído ao local pelas possibilidades do campo: o ar livre, o paisagismo e os encontros. Já planeja levar eventos do Beto Batata e o Bazar da Desmobília para lá. A programação deve incluir, ainda, a estréia curitibana do espetáculo O Que Você Quer Dizer, que esteve em cartaz no Rio de Janeiro e em São Paulo, e a concretização do projeto Orientações, sobre as relações entre a obra de Guimarães Rosa e a filosofia oriental. São duas parcerias de Melo com o diretor da Companhia Brasileira de Teatro, Marcio Abreu.
E esse deve ser só o começo de novas oportunidades de produção, convívio e discussão em São Luis do Purunã. "O projeto vai aumentando conforme as pessoas tomem posse", prevê Melo.




