
Ternura, humor e inteligência são palavras que vão bem com o cinema de Laurent Tirard.
Em 2009, o diretor francês criou, sem exagero, uma joia moderna com o lançamento de O Pequeno Nicolau, filme que tem a capacidade de conquistar adultos sem apelar e crianças sem subestimá-las.
Neste Natal, Tirard retoma a história do garoto originalmente um personagem de HQs criado na década de 1950 por René Goscinny e Jean Jacques Sempé em As Férias do Pequeno Nicolau, que estreia amanhã nos cinemas do país.
Para quem acompanhou as peripécias do menino no primeiro filme, a principal mudança é a substituição do ator mirim. Sai Maxime Godart, entra Mathéo Boisselier.
A troca não causa maiores problemas. Boisselier, um pouco mais gordinho, mantém naturalmente a inocência e o carisma do antigo protagonista.
Valérie Lemercier (a mãe) e Kad Merad (o pai) continuam firmes, e agora contracenam com Dominique Lavanant, a avó materna de Nicolau. Todos vão à praia passar as férias. E lá as coisas acontecem.
O garoto faz novos amigos todos com peculiaridades incríveis que quase sugerem o cinema de seu conterrâneo Jean-Pierre Jeunet enquanto o pai reencontra um colega de infância (Bouli Lanners, de A Grande Volta) e sua família.
De brincadeira, os antigos compadres combinam o casamento de Nicolau com Isabelle (Erja Malatier), filha do casal de amigos que, à primeira vista, parece ter saído diretamente de O Iluminado (1980), de Stanley Kubrick.
Nicolau, que nunca entende os adultos, leva a coisa a sério demais e arma planos mirabolantes para sabotar a ideia.
Vale lembrar: em O Pequeno Nicolau, o garoto temia ser "descartado" porque seus pais teriam outro filho. Novamente, portanto, Tirard relê o mundo a partir de uma visão "pura" e inocente, em que a interpretação literal da maioria das coisas que se diz por aí algo normal para crianças promove tanto encantamento quanto decepção.
Além disso, há uma subnarrativa que percorre todo o filme e que pode ser traduzida em uma pergunta de resposta inatingível: quanto dura o amor?
Pois Nicolau não entende, por exemplo, por que o pai se enrabicha por uma moça mais jovem; ou por que a mãe se encanta por um diretor de cinema cafajeste; ou ainda por que diabos a avó, viúva e solitária, troca jujubas por beijinhos no rosto.
Entrevista
"Nosso grande desafio foi dialogar com crianças e adultos"
Laurent Tirard, diretor de As Férias do Pequeno Nicolau
Por que fazer outro filme sobre o Nicolau?
O Pequeno Nicolau é baseado em uma série de histórias em quadrinhos. Quando decidimos realizar o primeiro filme, estava implícito que, se ele fizesse sucesso, haveria outros. E o filme fez um sucesso enorme. Então nem pensamos em não fazer o segundo. Pessoalmente, estava feliz em realizar um segundo capítulo porque o primeiro foi uma grande experiência em nível pessoal e profissional. E também porque este é um mundo em que me sinto totalmente em casa.
A história é sobre a beleza e a inocência da infância, mas também sobre amizade, confiança e relacionamento entre adultos. Que público você acha que irá se interessar pelo filme?
Bem, os dois, adultos e crianças, seria o ideal. Este foi o nosso grande desafio. Quando vejo um filme da Pixar, sempre fico impressionado pela maneira com que os roteiristas trabalham os diferentes níveis da história, com elementos para crianças e para adultos. Nós tentamos fazer o mesmo com O Pequeno Nicolau. Mas admito que é uma dificuldade encontrar esse equilíbrio. Algumas pessoas me disseram que o filme ficou muito "adulto". Estranhamente, entretanto, são os próprios adultos que fazem esses comentários. Nunca as crianças.
As Férias do Pequeno Nicolau lembra a estética de Jacques Tatit, principalmente aquela presente em Le Vacances de M. Hulot (1953) não só por causa do cenário (a praia), mas também pela escolha das cores e a doçura do filme como um todo. Isso faz sentido? Tatit é uma inspiração ou influência?
Com certeza. Tati é a principal inspiração para ambos os filmes do Pequeno Nicolau. Acho que a principal razão é que, quando você pensa nas ilustrações de Sempé, e as enxerga por meio de um equivalente cinematográfico, em termos de poesia e humor surreal, a primeira referência que vem à nossa cabeça é Tati. Além disso, o mundo de Tati é feito de histórias sobre a infância e o gap entre crianças e adultos. O personagem M. Hulot é perfeito para exemplificar isso, já que ele é uma criança presa em um corpo de adulto.
Como foi trabalhar com Mathéo Boisselier? Parece que o garoto tem mesmo a "alma" do Nicolau.
Sim. Maxime Godart [garoto que interpretou Nicolau no primeiro filme] foi um grande Pequeno Nicolau no primeiro filme, mas Mathéo é menos melancólico. Ele tem uma energia maravilhosa e um sorriso maroto. Eu diria que ele é a versão final de Nicolau, mas se nós fizermos um terceiro filme, tenho certeza de que provarei que estou errado, já que uma outra criança o interpretará ainda melhor!



