
Para um fã de Shakespeare, assistir a uma adaptação de “Macbeth” é perguntar-se como será resolvido o tripé sobrenatural da peça: o aparecimento das irmãs-bruxas, o espectros da adaga e a floresta que anda.
A trama fala de um capitão do exército escocês que recebe profecias de que um dia será rei. Então ele decide, induzido pela mulher, apressar o que acredita ser seu destino, lançando-se numa sequência de assassinatos e loucura.
A primeira cena do “Macbeth” de Justin Kurzel, porém, obriga a uma ressintonização da plateia.
Apesar de se passar numa Escócia medieval, tal como o original, e de conter poucos acréscimos ao texto de Shakespeare, o filme introduz cenas silenciosas que oferecem uma releitura para o crescendo de ambição e selvageria que acomete o casal protagonista, lorde e lady Macbeth, vividos pelas superestrelas Michael Fassbender (o Magneto jovem de “X-Men”) e Marion Cotillard (a “Piaf”).
Para não dar spoiler, é preciso calar sobre essas cenas inteligentes, apenas adiantando que elas têm relação com a prole dos personagens-alvo das profecias.
O problema é que elas não terão tanto peso para o quem não conhece o enredo e os meandros da peça.
O mais interessante é que uma adaptação funcione de forma autônoma, sem exigir estudo prévio.
Pode ser que este “Macbeth” se sustente como filme de aventura de época, mas o que sobressai é a introspecção e o lirismo.
Ela devia morrer um dia/ Haveria um tempo para essa palavra/ Amanhã... e amanhã... e amanhã.
Arrisca o espectador de primeira viagem fazer como meu vizinho de poltrona: ir embora após sete minutos de projeção, apenas finda a Coca-cola e após consultar várias vezes o celular.
Confesso que não o culpo: a estética plástica e sonora do filme exige imersão e admiração pelo material com que ele está lidando. O diretor Kurzel ainda é pouco conhecido, mas prepara a adaptação para o cinema do jogo “Assassin’s Creed” (e isso deve deixá-lo popular).
O primeiro terço de “Macbeth” causa um choque. Há uma cena de batalha, com direito a sangue e pintura de guerra, mas com movimentos em câmera lenta e um protagonista que volta e meia encara o espectador, lembrando um pouco a estética da publicidade. É lindo, mas estranho.
Quase todas as falas do filme são de uma contenção antinatural, revelando muito pouca emoção, uma escolha da direção.
O destaque nessa seara é Lady Macbeth, bastante humanizada nesta adaptação, o que não significa que se dê a arroubos melodramáticos.
Pelo contrário, a francesa Marion Cotillard choca nos monólogos daquela que é tida como a mentora dos crimes do marido pela frieza externa que passa.
Em tempo: a solução para que a floresta ande é bastante inovadora.
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Veja o trailer:



