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David Brent é uma das maiores criações cômicas das últimas décadas. Eu sei que as pessoas curtem a versão americana da série “The Office”. Mas o original, britânico, onde surge o nosso amigo David, é uma coisa épica: um dos raros momentos em que as regras mais básicas de um gênero todo se veem questionadas.

Pra mim,“The Office” é tão mítico quanto foi o “Monty Python Flying Circus”, mais de trinta anos antes

Mas, ao mesmo tempo, a série é dolorosamente constrangedora. Você nunca sabe de quem está rindo, e nunca sabe se devia estar rindo. Tudo ali é ridículo, sim, mas ao mesmo tempo profundamente triste. E a carreira posterior de Ricky Gervais (nas séries “Extras” e “Derek”, por exemplo), foi ainda mais longe nessa mistura de pena, riso, constrangimento e alegria.

Humor sempre foi um pouco assim. Sempre houve, claro, esse dado perturbador, incômodo e também potencialmente subversivo. Estamos rindo, quase sempre, de algo que pra alguém (normalmente bem na nossa frente) não foi nada engraçado.

O que Ricky Gervais percebeu, como todo grande cômico, foi que a gente não estava conferindo o devido grau de ridículo a toda uma parcela da nossa existência. Só que talvez a gente ainda nem tenha o afastamento suficiente pra rir de peito aberto dessa piada. Talvez a ferida ainda seja muito recente…?

Agora saiu um longa sobre ele: se chama “Life on the Road” (estreia na Netflix na próxima sexta-feira, 10). Não é um grande filme, mas tem bons momentos. Acima de tudo, me interessa aqui falar da trilha sonora, porque Brent, como sabem os fãs da série, tem planos de se tornar um astro do rock, e agora montou uma banda.

Eu, claro, baixei o disco.

As músicas são hilárias.

Sim.

Ok.

Mas o problema, de novo, é que nenhuma delas é intencionalmente uma canção cômica. Ao contrário, por exemplo, da obra de Tim Minchin (que, nunca vou cansar de repetir, é um gênio), não são músicas-piadas. Elas são sérias.

Elas são, como Gervais disse numa entrevista, sua melhor tentativa de imaginar o que uma pessoa ridícula (Brent) seria capaz de escrever.

As canções não QUEREM que você ria. E por isso mesmo você ri. “Vergonha alheia”?

Mas tem um detalhe… outro desses momentos de “ferida aberta”: as canções de Brent são muito “boas”! São fundamentalmente iguais a quase tudo que podia tocar no rádio por aí.

E, enquanto você ri daquilo, uma parte de você pensa…. “e essas outras coisas que você ouve, e que não são nada diferentes? É pra rir também?”

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