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 | Ricardo Humberto/Especial para a Gazeta do Povo
| Foto: Ricardo Humberto/Especial para a Gazeta do Povo

Existem dois tipos de pessoas no mundo. As razoáveis… e as que dizem que existem dois tipos de pessoas no mundo.

Eu, que meio que faço o que posso pra ficar do lado das razoáveis, tendo mesmo a achar que em todo lugar em que os binários veem uma dicotomia, na verdade se esconde um longo contínuo, com as extremidades às vezes bem afastadas mesmo, mas com trocentas posições variáveis e mutantes no meio do caminho. As coisas, como a humanidade definida por Montaigne, tendem a ser coloridas e ondulantes.

Mas tudo isso aqui só porque eu ia começar esse texto falando em dois amores. E me censurei.

Viu?

O preço da não-manezice é a eterna vigilância!

Mas que que é esse negócio lá dos tais dois amores, Caetano?

Então, ressalva feita à continuitude de todas as opsições polares, era mais ou menos assim: tem um tipo de amor que é recompensa, que deriva e cresce e se alimenta de provas, dados e fatos. Eu amo a coisa (pessoa) X porque ela faz (contínua e confirmadamente) por merecer esse amor.

Mas tem outro tipo, lá no extremo oposto do contínuo, que é inexplicável, que eu acho que é mais de verdade, que simplesmente é.

É o tipo de amor que une os casais mais certos. Porque é o tipo de amor que, como não busca bases nem provas, acha fácil, acha quase inescapável perdoar ou desenxergar defeitos. É o tipo de amor que a gente tem pelos filhos. Aquele da citação do Montaigne sobre a amizade dele com o La Boétie que eu não paro de citar: porque era ele, porque era eu.

E por que mesmo esse conversê todo auto-ajúdico de altos amores aí, camarada?

Pior que por nada de metafísico não. Quem me dera.

Eu sou simplão.

Mas é que eu vi o maninho escrevendo sobre Woody Allen essa semana e lembrei desse negócio. Porque é assim que eu gosto do cinema de Woody Allen. Sem motivo. Porque sim. Porque pronto.

Detesto certas coisas “sérias”. Abomino algumas das mais recentes.

Mas nada disso muda nada.

Cliquei quando vi o primeiro filme e ficou pra vida.

Quase não é “objetivo”, sabe. Objetivo é o meu DESamor por Wes Anderson, que viu esse Hotel Budapeste e mudou de opinião. Objetivo é o meu ódio pustuloso por Coldplay. Objetivo é o meu amor por Kubrick, onde eu vejo ressalvas (umas duas ou três), aqui e ali.

Woody Allen é do tipo que deve estar cravado no meu ressequido DNA. Que deve ter vindo insta-lado na placa mãe do meu coraçãozinho. Que deve estar conectado à chama-piloto deste gélido intelecto.

Mas, claro, não é só ele.

E eu estava essa semana relendo pela zilhonésima vez os contos do grande P.G.Wodehouse, o maior antepassado do Woody.

Mais especificamente os contos que se referem à impagável dupla Bertie Wooster e seu valete (ele prefere se chamar de “cavalheiro pessoal de um cavalheiro”), o gênio, o mito, esse deus da razão e do espírito humanos, o grande Reginald Jeeves.

Os contos são uma bobajada sem fim.. Esparrelas idiotas em que Wooster, que sabe ter “mais ou menos metade do encéfalo de um camarada normal por aí”, precisa recorrer a seu genial lacaio para se salvar. Ou salvar um de seus amigos ricos, bobos e inúteis.

Em geral para eles conseguirem uma menina.

Ou fugir de uma menina.

Ou se salvar do ódio dos tios ricos que os sustentam. (O mundo de Wooster parece o do Pato Donald. Só tem sobrinhos).

E Jeeves, a não ser quando está magoado com o patrão (que insiste em usar meias roxas, por exemplo), sempre resolve tudo.

E tudo isso vem narrado num inglês anos 20 delicioso e inimitável. Pelo maior de todos os patetas.

Wodehouse escreveu quase cem livros. Há também vários romances da “saga” Jeeves.

Eu não canso. Pode ser tudo igual.

Mas basta uma menção ao nome “Jeeves” e você melhora o meu dia. Qualquer dia.

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