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 | Ricardo Humberto/Especial para a Gazeta do Povo
| Foto: Ricardo Humberto/Especial para a Gazeta do Povo

Eu tenho um amigo que costuma repetir o mantra “dane-se o panda!”.

Ok, não é esse o verbo que ele usa, mas dá pra entender o espírito.

Segundo ele, se o bicho não quer se reproduzir (já chegamos a produzir pornografia de pandas, pra ver se rola um incentivo), se o bicho só quer comer um alimento de baixo potencial calórico (bambu, apesar de ter dentição de carnívoro) que dificulta sua “manutenção”, está fazendo hora extra no mundo.

Dane-se.

Num registro mais sério, alguns ambientalistas, em tempos recentes, já andaram reclamando que os pandas atraem uma quantidade desproporcional de interesse, e de investimentos, o que acaba distorcendo as necessidades e prejudicando outros animais, outros projetos igualmente válidos.

Os pandas neste caso pesam como símbolo. De tudo quanto seja fofo.

É bem mais fácil, bem mais sedutor, pedir dinheiro pra salvar um ursinho ridiculamente mimoso, que parece um abraço felpudo, do que arrecadar verba pra salvar uma perereca do Vietnã.

E metade dos anfíbios do mundo corre risco de extinção. E seu impacto no meio-ambiente é simplesmente gigantesco. Muito, mas muito maior que o dos pandas.

Por outro lado, símbolos são importantes. Literalmente, a logo do WWF, uma das maiores e mais antigas organizações de conservação ambiental, é um panda.

*

Su-Lin, o primeiro panda a ser tirado vivo da China, ao ser levado para o Zoológico de Chicago em 1936, virou o primeiro “Knut” (lembra do ursinho polar do zoo de Berlin?). O primeiro animal popstar.

As pessoas fizeram fila para ver Su-Lin e acompanhar a história da socialite nova-iorquina que se embrenhou nas florestas de bambu e voltou com um filhote para quem deu leite de mamadeira… um filhote que dormia agarrado a ela, vestida agora com um casaco de pele, para parecer sua mãe.

Foi uma história de amor.

Entre Ruth Harkness e Su-Lin. Entre Su-Lin e os Estados Unidos.

E foi essa narrativa, foi esse “símbolo”, que levou o zoo de Chicago a gastar mais dinheiro com aquele panda do que com qualquer outro animal. A criar uma estrutura em sua jaula que lembrava muito pouco o padrão miserável e triste dos zoológicos da época, e parecia apontar para os zoológicos “modernos”.

Su-Lin, precisamente por ser um símbolo, foi um ponto chave da mudança de atitude da sociedade para com os zoológicos e, há quem diga, para com os animais. E muita coisa mudou por causa disso.

Houve comoção nacional quando ele morreu de uma pneumonia, dois anos depois de chegar. Talvez por incompetência, ou ignorância, de seus tratadores. Talvez porque eles tenham feito tudo errado, a começar pela ideia de tirar Su-Lin da China.

Mas talvez o único acerto, ali, tenha sido a criação de um símbolo. Uma mudança.

Ainda que com o custo da fofura.

Salve-se o panda.

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