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| Foto: Ricardo Humberto/

Eu passei a semana lendo três biografias de T. S. Eliot (nem pergunte por quê).

Eliot é possivelmente o maior poeta de língua inglesa do século XX e estamos discutindo até hoje a obra que ele deixou.

E não apenas a obra. Sua vida também nunca deixou de ser comentada.

Um dos dados mais polêmicos a respeito de Eliot, o homem, é seu suposto antissemitismo. Não vou entrar nos detalhes aqui (tem gente batendo cabeça há décadas pra entender a questão). Mas fiz alguma questão de tentar desembaraçar o argumento na minha cabeça.

E sabe qual a minha conclusão?

Eliot não era um antissemita no sentido de alguém que defende e propaga ideias de violência, exclusão ou diminuição dos judeus. Não era um antissemita “ativo”, pra usar a terminologia de um de seus biógrafos. E quase certamente não seria um antissemita “velado”, escondido.

Mas acho, sim, que durante boa parte de sua vida ele foi um antissemita “inconsciente”. Alguém que vinha de um meio em que noções negativas a respeito dos judeus eram tão “naturais” que viravam parte de sua formação.

E, olhando daqui, do Brasil de 2017, fica quase a vontade de gritar para alguns daqueles biógrafos: “sabe o motivo de ele ter essas raízes antissemitas? É porque no começo do século TODO MUNDO, menos os judeus, era antissemita em algum grau. Exatamente como TODO MUNDO, menos as mulheres, era misógino. Exatamente como TODO MUNDO era racista.”

Havia uma segurança da centralidade de uma “Europa” branca e macha. Uma certeza de que outros grupos eram “inferiores”, mesmo naquelas pessoas que, lúcida e conscientemente, se questionadas, iriam negar com veemência (e honestidade) esses preconceitos.

Era uma espécie de “caldo” cultural.

Hoje, claro, essa maré mudou.

Aqueles preconceitos todos (e outros mais) continuam vivinhos da silva, nem se engane. Mas o fato é que hoje o “caldo” cada vez mais tem gosto de tolerância. Ou no mínimo da tentativa de se afirmar um discurso de tolerância.

Quando pipocou a história da homofobia contra o casal gay que ia se mudar, o que me chamou mais atenção não foi o preconceito de um imbecil (ou alguns), mas a resposta pronta e coesa dos outros vizinhos.

Foi-se o tempo. Hoje você precisa se esconder melhor pra ser preconceituoso.

Hoje uma criança tem menos chance de crescer como Eliot, tem menos chance de precisar chegar aos quarenta, cinquenta anos pra rever certas noções.

E ainda tem quem chama isso de #mundochato…

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