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 | Felipe Lima
| Foto: Felipe Lima

Alguém ainda vai revolucionar o mercado das agências de casamento quando descobrir o potencial dos atendentes de telemarketing. Na sociedade do futuro, eles não representarão mais o terror da dona de casa ocupada, obrigada a parar tudo para atender aquela chata, lenta e inútil ligação. (Tem gente que, maquiavelicamente, se especializa em devolver a irritação causada, feitiço que se volta contra a feiticeira.)

Não, no futuro tudo será muito mais bonito. Basta observar o encantamento provocado por bons telefonistas sobre as pessoas solitárias. Uma ligação ao 156 da Prefeitura para reclamar de um enervante alarme disparado na vizinhança pode funcionar como um laxante emocional – se o solicitante der sorte de pegar a pessoa certa do outro lado da linha. A atenção dispensada, a calma tranquilizadora, tudo dentro do mais correto protocolo, rapidamente estabelecem uma ligação humana, sim, um relacionamento muito mais real do que qualquer site de encontros.

Outros namorados em potencial estão nos 0800 de suporte técnico. São ligações extremamente perigosas, que podem resultar num enervamento ainda maior do que o causado pelo eletrodoméstico estragado. Novamente, porém, se o consumidor der sorte de calhar com uma pessoa bem-treinada, daquelas finas, já começa a imaginá-la com uma camisa Dudalina, super zen, interessada em atender ao seu problema durante o tempo que for. Se o aparelho em questão for um computador, existe ainda a sensual permissão para o acesso remoto, e então é só alegria, a brincadeira surge muito espontaneamente, nossa, como você mexe rápido nesses botões.

O contato telefônico bem-sucedido pode ficar só na empatia, mas não duvido que alguém solteiro à procura já não tenha elevado a relação para algo mais.

Resta o probleminha do efeito locutor de rádio. Quem nunca se iludiu sobre a aparência de uma voz? O som nos leva automaticamente a ilustrar na mente o autor dos decibéis, e não raro melhoramos um pouco o visual da pessoa. Se você preza pela aparência acima de tudo, a sugestão é deixar o relacionamento nesse pé mesmo, sem procurar aprofundá-lo com o balde de água fria que é a realidade.

Uma indicação de que não sou só eu a pensar nessas coisas é o filme Ela, vencedor do Oscar deste ano pelo roteiro original. Num futuro próximo, as pessoas se encontram por telefone via internet, e conversam tal qual num disk-amizade dos anos 80. Nesse retorno às benesses do passado, o longa-metragem de Spike Jonze salienta a relevância do contato pessoal, da conversa que, ainda que não seja presencial, envolve mais do que algumas tecladas.

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