
Sob aplausos de amigos e fãs, o corpo de José Wilker foi levado do Teatro Ipanema, onde foi velado, para o Memorial do Carmo, no Cemitério do Caju, zona norte do Rio, local em que acontece a cerimônia de cremação, restrita a parentes e amigos.
Muitos fãs também gritaram "felomenal", em alusão ao bordão do personagem Giovanni Improtta, que viveu na novela "Senhora do Destino" (2005).
FOTOS: Veja imagens de José Wilker
Do início do velório, às 23h de ontem, até a remoção do corpo, por volta das 15h, um grande número de artistas, parentes e fãs se despediu de Wilker, morto ontem de infarto enquanto dormia, aos 67 anos.
O movimento já era intenso na rua do teatro quatro horas antes do velório. Por volta do meio dia de hoje, o acesso de fãs e jornalistas chegou a ser suspenso, por causa do excesso de pessoas que acompanhavam as últimas homenagens a Wilker.
A entrada voltou a ser liberada no início da tarde, mas em ritmo bem menos intenso.
As filhas do ator, Isabel e Mariana, suas mães, Mônica Torres e Renée de Vielmond, respectivamente, e a namorada de Wilker, Cláudia Montenegro, acompanharam a vigília todo o tempo.
O local escolhido para o velório foi o palco em que Wilker consolidou sua carreira no teatro, no Rio, onde estreou fazendo uma substituição em "O Assalto", de José Vicente, em 1969, a primeira peça ali encenada.
Ainda no mesmo endereço, atuou em "O Arquiteto e o Imperador da Assíria" (1970), que lhe rendeu o primeiro prêmio Molière, "Hoje é dia de Rock" (1971), "A China é Azul" (1972) e "Ensaio Selvagem" (1974).
A última vez em que Wilker foi visto em público foi na sexta-feira à noite, em um restaurante no Leblon, onde jantava com Cláudia. Em seguida, ele foi para a casa dela, onde dormiu.
No sábado pela manhã, ao perceber que ele não respirava, Cláudia chamou o socorro de médicos, que constataram sua morte.
"Perdemos um homem extraordinário, um ator de televisão, teatro e cinema. Um colega muito querido. Sentiremos muita falta", disse a atriz Malu Mader.
A também atriz Susana Vieira, disse ter vivido um "casamento de 42 anos" com Wilker, começado na novela "O Bofe", de 1972.
"Eu me considero hoje a mais viúva de todas as atrizes", disse, emocionada.
Zé, assiste a gente aí de cima com sua meia colorida, seu tênis rosa. Cuida da gente aí. Lembrando Giovanni Improtta: 'se precisar, eu estou aqui'. Ele era assim", completou Susana, fazendo referência a um dos famosos personagens de Wilker. Repercussão Leia abaixo outros depoimentos de amigos do ator durante o velório:
"Sobrou muita coisa boa dele. Nada indicava que fosse acontecer. Foi uma tremenda perda para a classe. A primeira novela na Globo que fiz foi "Cavalo de Aço", com ele. A segunda foi "Final Feliz". Perdi até a conta de quando personagens inesquecíveis ele fez", disse Stênio Garcia.
"Eu estava com um papel preparado para fazer um par romântico com ele em um projeto. Ele era muito bem humorado", afirmou Betty Faria.
"É uma perda irreparável para a cultura. O legado dele é de inspiração para os jovens. É só acreditar", lamentou Milton Gonçalves.
"Legado dos mais lindos da minha profissão... Fala da grande cidade e do interior mais longínquo do pais. Ele era muito generoso, uma pessoa que engrandece as nossas vidas", disse Antônio Pitanga.
"Todos estamos arrasados. Não se explica a dor. Trabalhamos o dia inteiro e recebemos essa notícia logo pela manhã. Foi muito difícil. Temos que lembrar desse grande homem, sofisticado, de uma fina ironia, quero lembrar dos nossos encontros. Dos aniversários, de todos os bons momentos", disse o ator Tony Ramos, que chegou a ser dirigido por Wilker.
"É uma grande perda para a classe artística e um profundo pesar para todos nós", comentou Marcelo Serrado, que disse ter conversado com Wilker na véspera de sua morte e garantiu que ele estava bem.
"Depois da primeira novela em que o dirigi, brigamos e ficamos sem nos falar: ele era muito agressivo quando jovem. Depois, nós fizemos as pazes e eu o dirigi em uma das minhas melhores obras, que foi 'Anos Rebeldes'", disse o autor Gilberto Braga.
"Ele abriu as portas da percepção da sociedade através da arte, através da atuação também política. Isso está em falta hoje em dia", disse o ator Eriberto Leão.
"Todo mundo acordou com o coração meio apertado. Foi tudo muito chocante. Vai ser difícil repor o Wilker, muito difícil. É simbólico que se faça o enterro no teatro onde ele começou a atuar aqui no Rio", disse a atriz Giulia Gam.
"Era um tremendo amigo que eu tinha, cheio de inteligência e irreverência. Vai ser difícil esquecer", disse o diretor e ator Denis Carvalho.
"Debochávamos muito da vida. Ele tinha uma linguagem popular muito direta que combinava com esse humor. Era um sujeito muito bacana", disse Ary Fontoura, um dos maiores parceiros de cena de Wilker, visivelmente emocionado.
"Ele foi o primeiro grande ator que eu vi em cena, aqui [no Teatro Ipanema], em 'O Arquiteto e o Imperador da Síria'. Eu nem fazia teatro ainda, e isso me influenciou enormemente. Eu acabei dirigindo ele na ultima novela, 'Amor À Vida'", contou o diretor Wolf Maya.
"A primeira peça que eu vi com ele foi 'Trágico Acidente'. Ele era um ator fantástico. Eu me apaixonei por ele em cena, e depois trabalhamos inúmeras vezes juntos. Ele influenciou uma geração inteira", disse a atriz Renata Sorrah.
Entrevista
Em maio de 2013, José Wilker concedeu entrevista à Gazeta do Povo durante período de lançamento do filme "Giovanni Improtta", em que trabalhou como protagonista e diretor.
Confira os principais momentos da entrevista:
Você é tido como um dos maiores especialistas em cinema da TV Globo tanto que é o comentarista oficial das transmissões da entrega do Oscar. Como é deixar de ser pedra para virar vidraça?
É muito bom, me sinto muito confortável. Não acredito naquela história do analista freudiano, que encontra o paciente no elevador e finge que não vê. A crítica é parte do processo de criação, eu só tenho a ganhar lendo críticas. Nós devemos à crítica a existência de um Van Gogh, de um Michelângelo... mas eu faço uma distinção entre crítica e desaforo. Se eu percebo uma crítica com a devida consistência, isso só me enriquece. Já o desaforo eu relevo, passo batido. Afinal, estou há 50 anos nesse negócio.
Saiu em algum lugar que o Cacá Diegues [produtor do filme] sonhava em ganhar um Oscar com Giovanni Improtta. Você acha que dá?
Não sei se o Cacá disse isso. Acho que o grande prêmio que o nosso cinema precisa ganhar é a adesão do público. Um Oscar não vai mudar o nosso cinema, mas uma adesão maior do público vai. E isso já está acontecendo: saímos de zero por cento de participação nas bilheterias há 20 anos para 10 a 12% hoje. Quando chegarmos aos 25%, podemos estourar o champanhe.
Foi difícil "ressuscitar" o Giovanni Improtta quase dez anos depois de Senhora do Destino (exibida em 2004)?
No filme eu não queria necessariamente o Giovanni da novela. A história é muito mais sobre o Rio de Janeiro de hoje. A geografia física, econômica, social e sexual da cidade mudou totalmente. O Rio é uma cidade nova, diferente, e o Giovanni poderia espelhar isso. O filme faz um comentário sobre a criminalidade, a corrupção e a ascensão social com ironia, sem ser carrancudo. Quis associar humor e pensamento.
Agora foi o Giovanni Improtta, em breve deve sair o filme do Crô [o mordomo afetado vivido por Marcelo Serrado em Fina Estampa]... o seu longa é o pioneiro a explorar este filão, de retomar um personagem de novela?
Beto Rockfeller [adaptação lançada em 1970 da novela homônima, exibida dois anos antes] foi o primeiro. Estamos retomando este filão, que não foi devidamente explorado desde então. O que está acontecendo agora é que a gente de fato começou a estabelecer uma relação do cinema com a televisão, e vice-versa. E, se formos ver, os países onde a tevê e o cinema deram certo, como os Estados Unidos, são aqueles em que os dois veículos trabalharam associados. Lá, há grandes atores e diretores de cinema atuando na tevê e vice-versa. No nosso caso, muitos personagens de novela podem ter uma sobrevida, porque a novela, pelo próprio formato, quase sempre só toca a superfície e no cinema você pode fazer algo mais vertical. É uma pena que só a TV Globo esteja fazendo isso. Acho que todos os canais abertos deveriam ter essa inteligência.
Como foi a sua estreia na direção cinematográfica? Pretende repetir a experiência?
Eu adorei, claro que quero repetir! Quero filmar um roteiro meu no segundo semestre do ano que vem... é uma história bem brasileira, de um time de futebol que viaja pelo país, e também envolve uma orquestra e um puteiro. Mas neste eu não vou atuar... aliás, vou demorar muito para atuar e dirigir, é muito cansativo. E não mentalmente, fisicamente mesmo.
Como foi dirigir e atuar ao lado de amigos seus que também são monstros sagrados da nossa dramaturgia, como Milton Gonçalves, Hugo Carvana, Othon Bastos, Andréa Beltrão, Paulo Goulart e Jô Soares?
O filme só foi possível porque esse pessoal fez uma coisa carinhosérrima comigo. É uma turma que só me proporcionou alegrias. Eu sou meio rigoroso como diretor, mas todo mundo chegava na hora, não tivemos nenhum problema. Também porque durante dois meses ensaiávamos todo dia, cinco a seis horas por dia, para que na hora de rodar pudéssemos nos divertir no set, improvisar, e era uma seleção tão boa, eu tinha que botar esses caras pra jogar!
O que mais você vai aprontar este ano?
Estou meio ameaçado de fazer uma novela agora... mas de confirmado mesmo, em junho eu começo a ensaiar como ator Quem Tem Medo de Virgínia Woolf?, que estreia no Rio em setembro.
A sua atuação como o coronel Jesuíno Mendonça, no remake de Gabriela, o transformou em ícone pop. Montagens com o bordão "se prepara que hoje eu vou lhe usar" invadiram as redes sociais. O que você achou desta repercussão?
Eu adorei! É um autoelogio, eu nem devia falar isso, mas o coronel Jesuíno foi um dos meus melhores trabalhos na televisão. Essa repercussão toda na internet é a prova disso. Todo dia mandavam uma montagem nova para mim.Relembre alguns momentos da carreira do ator













