
Em 1968, o lançamento do filme Lance Maior marcou três estreias: a de Sylvio Back (Guerra dos Pelados e Aleluia, Gretchen!) na direção de longa-metragem, a de Regina Duarte como atriz de cinema e a de Curitiba no mapa nacional da produção de ficção audiovisual.
A capital paranaense, que completa hoje 316 anos, é quase uma personagem da história, que gira em torno de um triângulo amoroso. Mário (Faria) é um estudante universitário e bancário que tenta ascender socialmente relacionando-se com Cristina, jovem rica, orgulhosa e emancipada (Regina Duarte). Mas ele se divide entre ela e a sensual balconista Neusa (Stefânia), inexperiente e revoltada com a sua condição social.
"Não consigo enxergar Lance Maior em outra cidade que não Curitiba. Aquele tom de vaziez urbana, aquele céu translúcido e um certo provincianismo no comportamento dos personagens iluminam a aura da mocidade da época sem perder o viço e a modernidade com a passar dos anos", diz o diretor, que também é autor do roteiro com Nelson Padrella e Oscar Milton Volpini.
Nos dois meses de filmagem em Curitiba, que tinha a fama do "filme não-feito ou inacabado", foi preciso que a polícia contivesse o rebuliço. Todos queriam ver de perto Regina Duarte, "a namoradinha do Brasil", em locações velhas conhecidas como as ruas XV de Novembro, Riachuelo e Marechal Deodoro, o Largo da Ordem, a Reitoria da Universidade Federal do Paraná, entre outras (leia quadro ao lado).
A escolha dos locais tinha a ver com a experiência de pedestre de Back, catarinense que viveu por 30 anos na cidade ele agora reside no Rio de Janeiro. "Quando, nos idos de 1967/68, escrevemos o roteiro, Padrella, Volpini e eu éramos uma espécie de irmãos siameses: além da profissão (de jornalistas) e o cotidiano de Curitiba na retina e na mente, frequentávamos o imaginário da cidade como contistas, poetas e cineastas", diz.
Chão fundador
Ao longo da escritura do roteiro, algumas locações foram lembradas, mas foi só durante a preparação das filmagens que "brotaram espontaneamente ambientes, cenários, cheiros e luzes típicos da cidade". "Eram meus espaços de travessia da cidade, dia e noite. Talvez, o fato de a maioria dos locais estar concentrada no perímetro central, seja uma resposta inconsciente à minha vocação cármica de ter praticamente a vida toda morado no miolo das cidades", reflete o diretor nascido no centro de Blumenau.
Quarenta anos depois, Back lamenta o abandono da região central, que o cineasta chama de "chão fundador", pelo curitibano. "É nele que você pode vivenciar melhor a aura de uma Curitiba já então moderna no início do século 20, um conjunto urbano-arquitetônico exemplar e que continua lhe emprestando essa qualidade de vida única e invejável em todo o Brasil", diz o diretor, que escalou Curitiba como personagem de outros filmes como seu documentário de estreia, As Moradas (1964), em que ela é vista "com todos os seus contrastes sociais, da periferia aos bairros nobres".
Back finaliza agora o longa-metragem O Contestado Restos Mortais, sobre a Guerra do Contestado (1912-1916), filmado em Santa Catarina, e prepara-se para dar início, em 2010, à realização de Angústia, baseado no romance homônimo de Graciliano Ramos. Lance Maior será lançado em DVD no segundo semestre deste ano, como parte da coleção Cinemateca Sylvio Back (Versátil).




