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Diamante lapidado

Pianista curitibano volta ao Brasil depois de um ano de estudos no Conservatório de Lausanne, na Suiça

Rômulo Ramos e suas mãos talentosas: curitibano de 18 anos vive na Suiça e estuda em um dos mais renomados conservatórios de música do país europeu | Fotos: Marcelo Elias/Gazeta do Povo
Rômulo Ramos e suas mãos talentosas: curitibano de 18 anos vive na Suiça e estuda em um dos mais renomados conservatórios de música do país europeu (Foto: Fotos: Marcelo Elias/Gazeta do Povo)

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Ele tem 18 anos e mãos grandes, que se exercitam até mesmo quando não estão sobre o piano. E, en­­quan­­to toca, a sala de estar em sua casa, no Parolin, é invadida pelo som que surge quando ataca rapidamente os graves do instrumento. Já seus olhos parecem procurar cada nota, em cada dedo. "Ouvimos música ao vivo o dia inteiro", comemora Ro­­mu­aldo Vicente Ramos, pai de um pianista curitibano que co­­meça a ganhar o mundo.

Rômulo Aoto Ramos está de volta da Suiça. Chegou no dia 31 de julho para passar férias em sua terra natal e rever a família, só contactada desde setembro de 2008 via internet ou telefone – poucos minutos "porque os planos do Brasil são caros." O curitibano estuda no respeitado Con­servatório de Lousanne, já recebeu elogios preciosos de pianistas como Ricardo Castro – leia mais ao lado – e Maria João Pires, e hoje traça sua vida em partituras. "Nunca tive dúvidas ou qualquer pretensão em mudar de carreira", crava o jovem. Para bancar o sonho – e o início na profissão – toda sua família "fez um esforço" por meio de um "investimento significativo". E o garoto parece dar profissionalismo à atmosfera cultural que sempre permeou o lar dos Ramos.

O irmão Rafaelo, de 17 anos, assina pelo menos dez quadros em três ambientes da casa; o pai, químico, sempre ouviu música erudita e é fã de Chopin; o avô materno fazia aulas de canto e usava um velho piano para praticar seus exercícios. E o menino, então com 10 anos, não perdia tempo.

"Nessa época já queria mexer no piano, mas barulhos não me interessavam. Eu queria fazer música. Meus pais ouviam Bee­thoven e Mozart, e então comecei a ‘tirar’ es­­sas músicas no piano", relembra Ramos. Moti­vado, o garoto adquiriu por conta própria um livro de teoria musical. Aprendeu a ler partituras sozinho e avisou o pai que estava decidido: queria ser músico.

"Quando ele me avisou, acreditei na hora, porque vi a alegria com que ele foi e voltou do primeiro dia de aula de piano. Não tinha dúvidas, era uma decisão e não uma mera opção", conta o pai Ro­­mualdo.

As primeiras aulas foram com a pianista russa Olga Kiun, ainda em Curitiba. Dos 11 aos 16 anos, Rômulo ia a casa de Olga e tomava aulas de uma hora de duração. Seu talento foi sendo reconhecido. Em uma master class com Ricardo Castro – único latino-americano a vencer o prestigioso Leeds In­­ternational Piano Competition, na Inglaterra, em 1993 – o primeiro de muitos contatos. "Ele me disse que queria que eu fosse seu aluno", conta Ramos.

Meses depois, aulas com a portuguesa radicada no Brasil Maria João Pires, vencedora do concurso internacional do bicentenário de nascimento de Beethoven, em 1970. "Ela me disse que existiam muitos tesouros dentro de mim e, que se eu fosse bem orientado, poderia me destacar internacionalmente." Estava certa.

Rotina

O setor de música do Con­ser­vatório de Lausanne fica na cidadezinha de Friburgo, também na Suiça. Rô­­mulo Ramos mora sozinho em um apartamento – em­­bora divida a cozinha com um hún­­garo violinista. O frio de até 15 graus negativos e o primeiro contato com uma cultura estrangeira não foram obstáculos perto da excelência no ensino da profissão.

"Não podemos chegar atrasado um segundo. É você que tem que se adaptar às regras. Acho a disciplina necessária. Quando não a temos, desperdiçamos energia com outras coisas. Acre­dito na teoria que diz que é ne­­cessário 1% de inspiração e 99% de transpiração", conta o pianista, que, em média, estuda cerca de oito horas por dia, todos os dias, sem exceção.

O jovem fala francês e já arranha o alemão. Está imerso em um mar de cultura e de música que, segundo ele, não encontra comparação.

"As coisas em relação à música erudita no Brasil ainda são muito distantes. Não existe valorização. Quando fazemos um concerto, poucas pessoas pensam que nos dedicamos a vida toda para estar no palco. Às vezes, dez minutos de música na Europa são mais valorizados do que um recital inteiro aqui no Brasil", explica o pianista, que ressalta a falta de recursos e incentivos como pontos cruciais.

Embora o descontentamento exista, a vontade é de voltar ao Brasil. E não só quando estiver de férias. "Quero continuar na linha do Castro [Ricardo]: incentivar a cultura, transferir conhecimento e buscar a transformação do ser humano por meio da da música. Porque o talento do brasileiro, pa­­ra tudo, é uma coisa única. Percebo isso todos os dias".

Para concluir seus estudos em Friburgo, Ramos tem mais quatro anos de Europa pela frente.

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